Indiciamento de Bolsonaro traga eleição de 2026, muda discurso e gera temor de delação de generais
Por Guilherme Caetano / O ESTADÃO DE SP
BRASÍLIA - O indiciamento de Jair Bolsonaro (PL) e outras 36 pessoas pela Polícia Federal (PF) por tentativa de golpe de Estado tem antecipado cálculos eleitorais para a próxima eleição presidencial e gerado temor de que generais delatem aliados.
A tensão cresceu no círculo íntimo de Bolsonaro. Uma pessoa próxima a ele afirma “não duvidar” que os militares de alta patente possam fechar acordos de colaboração com o Ministério Público Federal (MPF) para prejudicar o ex-presidente, e que os “generais são inconsequentes”. A preocupação tem lastro no caso do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro e um de seus homens mais leais, cuja delação abasteceu as investigações.
Após o relatório de 884 páginas da PF ser tornado público pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, na última terça-feira, 26, pessoas no entorno de Bolsonaro passaram a colocar a disputa presidencial de 2026 como suposta motivação oculta por trás das investigações contra o ex-presidente.
Na quarta-feira, bolsonaristas mudaram o foco da defesa dos aliados, usando como subsídio uma pesquisa eleitoral indicando vantagem numérica de Bolsonaro contra o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) num eventual duelo pelo Palácio do Planalto. O discurso aposta num eventual cenário em que o cerco sobre Bolsonaro poderia turbinar sua imagem de perseguido pelo sistema, e fortalecer seu capital eleitoral.
“A trama midiática contra @jairbolsonaro tem um único objetivo: tirar da corrida eleitoral o único nome capaz de derrotar Lula”, diz o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) em suas redes sociais, sendo endossado por outros parlamentares. “A nova estratégia da esquerda é deixar seus oponentes inelegíveis. Sem prender ou assassinar seus rivais políticos, eles visam manter ares de democracia no país dominado”, escreve seu irmão, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP).
O reposicionamento do discurso, que antes focava na questão processual — o deputado federal Paulo Bilysnkyj (PL-SP) vinha dizendo que “no relatório da PF não existe prova da participação de Bolsonaro em nenhum fato”, e o comunicador Leandro Ruschel, que “não há evidências concretas de uma tentativa de golpe” —, se dá junto da torcida de que a eleição brasileira espelhe mais uma vez a americana.
Nos Estados Unidos, Donald Trump manteve sua popularidade e se elegeu numa vitória avassaladora no último mês, retornando à Casa Branca a despeito de estar condenado criminalmente e responder como réu em três processos, um deles por tentar interferir no resultado da eleição de 2020, quando perdeu para Joe Biden.
O vereador eleito Gilson Machado Filho (PL-PE), filho do ex-ministro do Turismo de Bolsonaro que acompanhou Eduardo e o pai à mansão de Trump na Flórida na noite em que ele foi confirmado presidente eleito, aposta nisso. Na semana passada, Bolsonaro passou uma semana de férias na companhia da família Machado em São Miguel dos Milagres.
“Eu acredito que (essa perseguição) só fortalece. Para a direita até vai ser bom prender Bolsonaro injustamente, porque o povo se comove com isso. Vai acontecer igual houve com Donald Trump”, ele diz.
O senador Rogério Marinho (PL-RN), secretário-geral do PL e principal interlocutor entre Bolsonaro e o presidente do partido, Valdemar Costa Neto, que estão impedidos pela Justiça de se comunicar, mantém o mesmo discurso: “Isso só fortalece o presidente (Bolsonaro), porque quado você exagera e persegue um grupo político desta forma, isso se reflete na população”, afirma.
Se o líder do Partido Republicano é inspiração para Bolsonaro, Lula pode igualmente ser. Isso porque há conversas no entorno do ex-presidente para ele repetir a estratégia petista em 2018, quando Lula estava preso e foi inscrito como cabeça de chapa presidencial mesmo assim. Com o ex-presidente petista impedido de concorrer, o então vice Fernando Haddad assumiu o seu lugar, beneficiando-se da transferência de votos do aliado e chegando ao segundo turno.
No caso do PL, os nomes de Flávio e Eduardo são cogitados para a empreitada similar, se Bolsonaro continuar impedido de concorrer. Em 2023, ele foi condenado à inelegibilidade por oito anos pela Justiça Eleitoral por ataques à democracia. A direita, no entanto, se vê numa situação desconfortável: dois dos três nomes melhor posicionados para enfrentar o PT daqui a dois anos estão enroscados em ações que resultam em inelegibilidade. Além de Bolsonaro, Pablo Marçal (PRTB) responde a processos que podem tirar seu direito de disputar eleições, principalmente no caso de um documento inverídico divulgado por suas redes sociais contra Guilherme Boulos (PSOL) na reta final da campanha à Prefeitura de São Paulo.
O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), por sua vez, também sob uma ameaça, ainda que considerada leve. Nesta semana, o ministro Kassio Nunes Marques arquivou uma notícia-crime aberta por Boulos contra Tarcísio que poderia deixá-lo inelegível.
Pacote inepto de Lula eleva patamar dos juros
Para qualquer pessoa com alguma noção da realidade, era totalmente previsível que resultaria em desastre financeiro a atitude do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) de divulgar um pacote pífio de controle de gastos associado a uma promessa vistosa de redução do Imposto de Renda.
Em apenas dois dias, os juros de mercado saltaram mais de 1 ponto percentual, e as expectativas já incorporam que a taxa Selic, do Banco Central, poderá superar 14,5% ao ano nos próximos meses. A irresponsabilidade de Lula alimentou a ameaça de disparada da dívida pública, em vez de contê-la, o que afetará todos os brasileiros.
Diante da descarada recusa do governo em realizar um ajuste sério, a cotação do dólar chegou a atingir R$ 6,10 na sexta (29), novo recorde de desprestígio da moeda nacional. O resultado é óbvio: mais lenha na fogueira da inflação, cujas chamas já vinham crescendo pela pressão de gastos públicos excessivos.
Já não se dúvida que o IPCA supere 5% em 2025, 2 pontos percentuais acima da meta do BC. Assim se encarecem matérias-primas, alimentos e bens intermediários essenciais para a produção e o transporte de artigos de primeira necessidade.
O cenário de descontrole fiscal dificulta a tarefa do Banco Central de estabilizar os preços, a ponto de torná-la impossível sem elevação de juros já exorbitantes. Longe de conjecturas apenas teóricas, trata-se de um golpe direto nos mais pobres, que são os grandes prejudicados.
O aperto das condições financeiras reverbera imediatamente no custo de financiamento de famílias e empresas. O torniquete do endividamento sufoca o setor produtivo e destrói intenções de investimentos e possibilidades de consumo das famílias.
É verdade que a economia do país ainda crescerá 3% ou mais neste ano, e o desemprego está baixo. Esse quadro é frágil, porém, pois se ancora em gastos federais insustentáveis, quando o necessário seria criar condições duradouras para juros baixos.
Está sendo contratada uma desaceleração da atividade que cedo ou tarde atingirá o emprego e piorará os indicadores sociais. A esta altura já não há dúvida de que o presidente da República e seu partido não têm uma compreensão clara da emergência em que colocaram o país.
Resta ao ministro Fernando Haddad, da Fazenda, fazer o discurso da sensatez, que tem cada vez menos credibilidade. Culpar o governo passado, ademais, pode açular a militância petista, mas em nada aumenta a confiança numa gestão que desdenha da solvência das contas públicas.
Não há mais motivos para esperar algum lampejo de lucidez de Lula —que nem se preocupa em fingir alguma responsabilidade orçamentária. Resta esperar que lideranças do Congresso, em nome do pragmatismo, examinem as propostas a serem apresentadas com a responsabilidade ausente no Palácio do Planalto.
PGR prepara modelo controverso de denúncia conjunta em investigações contra Bolsonaro
Arthur Guimarães / FOLHA DE SP
O procurador-geral da República, Paulo Gonet, prepara uma denúncia conjunta ao STF (Supremo Tribunal Federal) contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) de modo a reunir os casos da trama golpista, das joias sauditas e do cartão de vacina. Advogados ouvidos pela Folha divergem sobre a viabilidade da estratégia.
A Polícia Federal indiciou Bolsonaro por suspeita de envolvimento em plano para impedir a posse de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 2022. A imputação criminal se soma a outras contra o capitão da reserva.
Além de suspeito na investigação da trama golpista, o ex-presidente também já foi indiciado pela PF em apuração sobre a venda de joias sauditas recebidas de presente pelo governo brasileiro e de falsificação de certificados de vacinas contra a Covid-19.
Bolsonaro não é réu em nenhum dos casos nem formalmente acusado. A PGR (Procuradoria-Geral da República) vai analisá-los e definir os próximos passos conforme os elementos colhidos nas investigações. O órgão pode oferecer a denúncia, pedir o arquivamento do inquérito ou solicitar mais diligências.
A Procuradoria confirma já ter recebido o relatório da PF sobre a trama golpista. A lei estabelece um prazo de 15 dias para ela se manifestar, mas, na prática, o prazo pode ser flexibilizado se for necessário mais tempo. A instituição não perde o direito de oferecer a denúncia caso ele seja descumprido.
O procurador-geral cogita apresentar uma acusação conjunta contra o ex-presidente, agregando os casos. A estratégia fica a critério do Ministério Público, dizem especialistas ouvidos pela reportagem.
Ao oferecer a acusação, a PGR deve observar se há prova da materialidade do crime e indícios de autoria, ou seja, elementos concretos que comprovem a existência de um delito e evidências de que ele está relacionado a um autor.
O conteúdo do relatório será analisado pelo Grupo Estratégico de Combate aos Atos Antidemocráticos do MPF (Ministério Público Federal).
Segundo a coluna da Mônica Bergamo, Gonet só deve apresentar uma denúncia contra Bolsonaro em 2025. Ministros do STF, por sua vez, avaliam que o julgamento deve ocorrer no primeiro semestre do ano que vem, para evitar o calendário eleitoral de 2026.
A advogada criminalista Carolina Amorim, doutora em processo penal, avalia que o correto seria o PGR oferecer três denúncias, por serem investigações distintas. "A investigação sobre as vacinas e sobre as joias não detêm conexão com as acusações da suposta trama golpista", afirma, dizendo que seriam necessárias circunstâncias similares e de tempo e lugar comuns para uma peça única.
O argumento tem origem nas hipóteses do artigo 76 do Código de Processo de Penal, que estabelece as situações que motivam a junção das acusações, como quando as provas de uma infração interferem nas de outras ou quando as condutas forem praticadas pelas mesmas pessoas de forma conjunta, ao mesmo tempo e no mesmo lugar.
De acordo com Jacinto Coutinho, professor titular de direito processual penal da UFPR (Universidade Federal do Paraná), não há um impedimento legal para a união dos casos em uma mesma denúncia, embora seja "um tanto arriscado, pela complexidade do processo e por eventual dificuldade para a defesa".
Coutinho sustenta que, apesar de haver "remotamente uma conexão" entre os casos, são situações diferentes e estruturas diferentes, de modo que o ideal seria fazer uma denúncia para cada fato e delas resultarem os respectivos processos.
"O risco que se tem de embaralhar muito e dar complexidade para o processo é se cometer algum vício. Em face de um vício, aconteceu o que aconteceu na Lava Jato", diz o professor.
Maurício Zanoide de Moraes, professor de processo penal da USP (Universidade de São Paulo), por outro lado, considera haver mais lógica em se construir uma narrativa com começo, meio e fim, mesmo que se divida por grupos, do que fazer de maneira isolada.
Segundo ele, a Procuraria poderia oferecer uma denúncia conjunta se julgasse que faz sentido do ponto de vista da eficiência, da utilidade e da melhor apuração global das condutas.
Mas o advogado cita obstáculos, como, por exemplo, o fato de a acusação e a defesa poderem arrolar cada uma até oito testemunhas para cada conduta imputada. Se forem quatro imputações, já seriam 64 testemunhas no limite fixado em lei.
"Imagine a complexidade que isso não leva", diz ele. "Não adianta para a Procuradoria oferecer uma denúncia que demore anos a fio para ser posta ao fim."
Outra questão é a diferença nas etapas de cada investigação. A necessidade de novas diligências em uma delas pode atrasar o oferecimento da denúncia única. Uma vantagem de apresentar três seria permitir que cada caso amadurecesse no seu tempo.
Raquel Scalcon, consultora e professora de direito penal da FGV-SP, afirma que, se a PGR identificar com clareza conexões entre as investigações, apresentar uma denúncia conjunta faz sentido. Para isso, seria necessário haver uma narrativa que costure um ato único com várias etapas, afirma a advogada.
"Essa denúncia precisa ser muito bem construída para que se sustente e para que efetivamente tenha uma viabilidade, porque ela envolve um ex-presidente, envolve uma discussão sobre tentativa de golpe. É um caso muito, muito sensível. Espero e imagino que a PGR vai ser muito cautelosa. Não vai ser uma denúncia feita às pressas", afirma Scalcon.
Plano de controle de gastos é tímido e insuficiente
Por Editorial / O GLOBO
Apresentado em detalhe nesta quinta-feira, o plano de controle de gastos do governo é paradoxal. Num destaque intitulado “Cuidar da nossa casa”, afirma que o ritmo de crescimento das despesas gera incerteza sobre a regra fiscal. Cita o cenário externo desafiador e reconhece que o real desvalorizado, a pressão inflacionária e os juros altos “impactam a renda, o emprego, o investimento e desaquecem a economia”. Diante de diagnóstico tão realista de conjuntura tão delicada, esperavam-se medidas de impacto. Mas a proposta é tímida demais, insuficiente para deter o crescimento da dívida pública. Contrariando a lógica exposta pelo próprio Ministério da Fazenda, não conterá significativamente as despesas, apenas mudará sua composição. Depois de tanto mistério e expectativa, foi uma decepção.
Como se temia, boa parte do anunciado são medidas requentadas. É conhecido o esforço do governo para aperfeiçoar a gestão de programas sociais. Para evitar fraudes no Bolsa Família, as inscrições ou atualizações de famílias com apenas um integrante passarão a ser feitas em domicílio. A concessão do Benefício de Prestação Continuada (BPC), voltado a deficientes ou idosos em situação de vulnerabilidade, também será mais rigorosa. Tudo isso é bem-vindo, mas insuficiente.
Instado a tomar medidas estruturais, o governo bem que tentou. A linha de corte para receber o abono salarial, hoje em 2 salários mínimos, mudará de forma paulatina. Só chegará em 1,5 salário no distante ano de 2035. Nem a decisão de colocar um teto de 2,5% no aumento real do salário mínimo dá margem a otimismo. Pela regra atual, o reajuste leva em conta a inflação do ano anterior e a expansão do PIB de dois anos antes. Como a economia cresceu ao redor de 3% em 2023 e 2024, o novo teto terá impacto positivo nas contas do governo em 2025 e 2026. Com a tendência a voltar a crescer perto de 2,5%, os efeitos benéficos serão passageiros. A nova regra de reajuste do mínimo tampouco significa que os gastos com a Previdência subirão dentro do limite de 2,5% ao ano. O aumento do número de beneficiários, hoje em torno de 5%, fará a conta crescer em ritmo mais elevado.
A timidez da proposta, diz o economista Marcos Mendes, do Insper, fará com que o governo continue buscando receitas adicionais para cobrir despesas crescentes. Tal arranjo fará com que mais dinheiro continue indo para Saúde e Educação, cujo orçamento é vinculado à receita. Boa notícia? Não necessariamente. O aumento do gasto obrigatório continuará a comprimir a reduzidíssima parcela de despesas livres do governo, como investimentos. De mudança estrutural para desengessar o Orçamento, não se ouviu nada.
O governo preferiu adotar postura populista e anunciar a isenção de Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil, uma promessa de campanha. É uma decisão contraditória para quem afirma querer estabilizar as contas públicas. A cobrança de alíquota mínima efetiva maior para quem ganha mais de R$ 50 mil, diz a equipe econômica, deverá zerar a conta. O governo parece esquecer que o Congresso pode muito bem aprovar a isenção e barrar a alíquota mínima. O plano de atacar os supersalários no Parlamento também peca pelo otimismo. Com todas as medidas explicadas, é difícil não concluir que o governo perdeu uma ótima chance para, nas suas próprias palavras, “cuidar da nossa casa”.
Educação é a área mais afetada por novo bloqueio de gastos do governo; veja os números
Por Thaís Barcellos— Brasília / O GLOBO
O governo Lula detalhou nesta sexta-feira o bloqueio de gastos anunciado na semana passada para cumprir as regras fiscais. O Executivo também anunciou que o bloqueio total será R$ 1,7 bilhão menor porque o governo cortou gastos de repasse a ações culturais via Lei Aldir Blanc. No total, o novo bloqueio é de R$ 5,5 bilhões. Ao todo,os recursos congelados no ano chegam a R$ R$ 17,5 bilhões.
As áreas mais afetadas pelo novo bloqueio foram:
- Ministério da Educação: R$ 1,6 bilhão
- Ministério das Cidades: R$ 1 bilhão
- Ministério dos Transportes: R$ 956 milhões
- Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional: R$ 367 milhões
Bloqueio total
Considerando o bloqueio total de gastos, de R$ 17,5 bilhões, as áreas mais atingidas são:
- Ministério da Saúde: R$ 4,3 bilhões
- Ministério da Educação: R$ 3 bilhões
- Ministério das Cidades: R$ 2,4 bilhões
- Ministério dos Transportes: R$ 1,9 bilhão
- Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome: R$ 1 bilhão
Déficit
A projeção para o déficit primário este ano é de R$ 28,7 bilhões, contra R$ 28,3 bilhões até setembro. A meta é de resultado zero, com intervalo de tolerância de até 0,25% do Produto Interno Bruto (PIB), ou R$ 28,8 bilhões. Assim, governo prevê fechar o ano com déficit próximo ao limite previsto no arcabouço fiscal. A diferença é de apenas R$ 18,9 milhões.
Mais uma vez, bloqueio foi necessário para não estourar o limite de gastos devido ao crescimento maior do que o esperado de despesas obrigatórias, como os benefícios previdenciários e assistenciais.
Segundo nota divulgada à imprensa pelo Ministério do Planejamento, houve aumento de R$ 7,7 bilhões na estimativa de gasto com benefícios previdenciários, devido ao comportamento da despesa no bimestre de setembro e outubro.
O relatório destaca ainda que o efeito do pente-fino nos gastos do INSS ficou aquém do esperado. Para este ano, a previsão era de economia de R$ 6,8 bilhões, R$ 3,7 bilhões com o uso do Atestmed - concessão de benefícios de curta duração por análise documental - e o restante, principalmente, com a reavaliação dos benefícios por incapacidade.
A previsão para o Benefício de Prestação Continuada (BPC) subiu bem menos, R$ 612 milhões. O Planejamento destacou que a expansão foi parcialmente compensada pela redução na projeção para despesas com pessoal, de R$ 1,9 bilhão.
O zelador de cemitérios
Por Notas & Informações / O ESTADÃO DE SP
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Flávio Dino deferiu uma medida cautelar requerida pelo PCdoB para que, na prática, fosse revertido o contrato de concessão da administração dos cemitérios da cidade de São Paulo à iniciativa privada. No dia 24 passado, Dino determinou que a Prefeitura da capital paulista “restabeleça a comercialização e cobrança de serviços funerários, cemiteriais e de cremação tendo como teto (grifo dele) os valores praticados imediatamente antes da concessão (‘privatização’)”, aprovada pela Câmara Municipal e sancionada pelo então prefeito Bruno Covas (PSDB) em 2019.
Em primeiro lugar, deve-se sublinhar o descaso do sr. Dino com a reputação do STF, pela qual ele deveria zelar com muito mais denodo do que esse seu suposto cuidado com a prestação de serviços funerários em São Paulo. Ao deferir o pedido do PCdoB, partido ao qual foi filiado por 15 anos, o ministro abastardou a Corte Suprema, imiscuindo-se em uma política pública local que, em que pesem seus eventuais erros, passaria longe do crivo da mais alta instância do Poder Judiciário não fosse a banalização do princípio da dignidade da pessoa humana, consagrado no art. 1.º, inciso III, da Constituição, base da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) interposta pela legenda.
Em um país no qual a qualidade dos serviços públicos prestados aos cidadãos não raro é sofrível, para onde quer que se olhe haveria, em tese, violações daquele princípio constitucional, ao gosto do freguês. Tudo estaria resumido à criatividade hermenêutica dos reclamantes e/ou de seus interesses políticos de ocasião. Agora imagine o leitor se acaso o STF passasse a se ocupar de cada uma delas.
Com sua decisão monocrática, Dino também contribuiu sobremaneira para ampliar ainda mais a insegurança jurídica no País. Deveria ser ocioso lembrar que, na condição de membro do STF, o ministro deveria se ocupar justamente do contrário. É certo que não faltam reclamações sobre a qualidade do serviço prestado e os valores praticados pelas empresas concessionárias para realizar funerais na capital paulista. Igualmente, é fato que o prefeito Ricardo Nunes é tíbio na fiscalização desses contratos, problemáticos há mais tempo do que seria suportável pelos munícipes, em particular os mais carentes. Mas o processo de concessão da gestão dos cemitérios à iniciativa privada percorreu rigorosamente o devido rito legislativo, desde sua proposição, passando pelos debates políticos no Poder Legislativo municipal até a sanção do alcaide.
Dino, contudo, não perde o sono preocupado com isso. Afinal, ele foi indicado ao STF pelo presidente Lula da Silva, textualmente, não para ser um juiz, mas antes para continuar sendo o político verboso que sempre foi. E é de política que se trata aqui, não de justiça. Tanto do PCdoB, um partido que não sabe operar na democracia, pois perde no voto e recorre às barras do STF, como do ministro, que pôs a força de sua caneta a serviço de sua aversão à iniciativa privada.