O fardo da renúncia fiscal
Por Notas & Informações / O ESTADÃO DE SP
Os gastos tributários do governo federal e dos Estados, que em 2002 representavam 2,1% do Produto Interno Bruto (PIB), avançaram para 7,2% do PIB em 2023 e para este ano a estimativa é de que cheguem a 6,9%, apontou estudo da Fundação Getulio Vargas (FGV). Ou seja, no ano passado, em valores nominais, as renúncias do governo federal e dos Estados a receitas com tributos em programas econômicos e sociais corresponderam a R$ 784,8 bilhões. O que deixou de ser arrecadado é contabilizado como despesa indireta, o chamado gasto tributário.
Mais importante do que a cifra estratosférica, o levantamento da FGV sobre o aumento expressivo e contínuo desse tipo de gasto ao longo das últimas duas décadas mostra a pouca transparência e a falta de avaliação efetiva dos benefícios que cada gasto tributário traz para o desenvolvimento econômico e a redução da desigualdade. A ausência de um padrão de cálculo sobre o impacto financeiro dessas medidas faz também com que parte delas fuja ao crivo dos órgãos de controle. Somente os gastos tributários federais corresponderam a 4,8% do PIB no ano passado.
Buscando identificar os principais problemas que levam à falta de transparência e dificuldade de avaliação, os pesquisadores da FGV atestaram que os erros começam na base, com uma confusão conceitual sobre o gasto tributário, e seguem em descompasso, sem definição sobre a forma como esse gasto é medido e sobre as falhas de monitoramento e governança. Detalhes sobre esses gastos federais são publicados anualmente no Orçamento, mas várias renúncias fiscais não são incluídas na definição de gasto tributário, o que afeta a transparência e o resultado.
Manoel Pires, coordenador do estudo, destacou que mesmo a Receita Federal, que ele definiu como o órgão que trabalha com maior estabilidade conceitual, usa metodologia que deixa alguns gastos de fora, citando como exemplo o Repetro, regime aduaneiro especial para importação e exportação de equipamentos para exploração e produção de petróleo.
Os pesquisadores da FGV conseguiram catalogar o que, de forma geral, tem sido recorrente no País, com a proliferação de subsídios e incentivos tentando compensar a alta e complexa carga tributária em medidas seletivas e pouco eficientes. No caso dos Estados, os anos de guerra fiscal, numa disputa para ver quem dava os maiores benefícios para atrair indústrias de fora, deixaram um rastro de desequilíbrios.
As justificativas que embalam os pacotes de privilégios, em todas as esferas, são invariavelmente as mesmas – geração de empregos, redução da pobreza e desenvolvimento regional –, mas a aferição do alcance desses objetivos com frequência cai no esquecimento, sem que haja quaisquer cobranças.
Os dados do relatório evidenciam a falta de critérios objetivos e metas de desempenho e, ainda, a falta de um órgão gestor para monitorar a política pública que criou determinado gasto tributário. A aprovação, no ano passado, da primeira etapa da reforma tributária, centrada no consumo, foi sem dúvida um avanço, mas o grande número de benefícios fiscais e regimes diferenciados para alguns setores torna mais difícil a sua execução em razão da quantidade de bens com tratamento favorecido, que eleva a alíquota padrão. Inicialmente previsto em torno de 25%, o Imposto sobre Valor Agregado (IVA) já é estimado em 28%, um dos mais altos do mundo.
O volume de recursos que o governo deixa de arrecadar por causa do aumento das políticas de renúncia tributária extrapola, e muito, os ganhos eventuais, o que indica a necessidade de reduzir esse impacto nas contas públicas. O relatório da FGV chega à conclusão óbvia de que o melhor caminho para atingir esse objetivo é promover uma avaliação contínua dos efeitos desses programas para o desenvolvimento econômico do País e para a efetiva redução da desigualdade – e obviamente ter a coragem de cancelar os que não entregam o esperado.
O Brasil à mercê do PT
Por Notas & Informações / O ESTADÃO DE SP
Já sabemos que toda vez que o PT ganha, o Brasil perde. E o PT ganhou mais uma vez, impondo-se à equipe econômica do governo, que buscava exaustivamente uma fórmula que conciliasse a necessidade urgente de rever os gastos públicos com as demandas político-eleitorais do presidente Lula da Silva. Era mais fácil traçar a quadratura do círculo, claro, mas a expressão de capitulação do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, no patético pronunciamento na TV em que anunciou um pífio ajuste fiscal e uma mal-ajambrada reforma no Imposto de Renda disse tudo.
A reação negativa do mercado é, portanto, natural, ante a perspectiva de que Gleisi Hoffmann, Lindbergh Farias e Rui Costa vão mandar mais na economia do que Fernando Haddad e Simone Tebet. Recorde-se que o PT, sob a presidência de Gleisi, já chamou a política fiscal de “austericídio”; que o deputado Lindbergh, vice-líder do governo na Câmara, já defendeu déficit maior como meta fiscal; e que o ministro Rui Costa advoga por mais gastos públicos sempre que Haddad e Tebet, ministra do Planejamento, pelejam por contenção.
Fiel à estratégia lulopetista de inventar “inimigos do povo” para atribuir a culpa pelas lambanças no governo Lula, Rui Costa – que não fala sem o aval de Lula – reagiu ao mau humor do mercado elegendo o presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, como o responsável pela alta do dólar. Segundo Costa, Campos Neto, que foi nomeado pelo antecessor de Lula, Jair Bolsonaro, deliberadamente cria “uma sensação permanente de instabilidade”, além de repetidamente ficar “falando mal do Brasil”. Depois, vinculou a instabilidade a “aves agourentas” que “trabalham para derrotar o Brasil”. Por fim, declarou que está em “contagem regressiva” para que em breve o BC tenha um presidente que “não mora em Miami”, referindo-se a Gabriel Galípolo, nomeado por Lula para suceder a Campos Neto.
Num fôlego só, numa retórica típica de assembleia estudantil, o ministro Costa não só reafirmou a irresponsabilidade lulopetista, como alarmou ainda mais o mercado ao sugerir que Galípolo será, na condição de presidente do BC, mais um ministro a serviço de Lula e de seus projetos eleitorais. Segundo Costa, o governo espera que Galípolo adote as medidas “que precisam ser adotadas”. Sem disfarçar a ansiedade, tratou de sublinhar que Lula já havia escolhido seus indicados para assumir três diretorias do BC, o que, de fato, se confirmou na tarde de sexta-feira, quando os nomes vieram a público.
Até aqui, Galípolo vinha se equilibrando no papel de auxiliar demasiadamente próximo do lulopetismo e de futuro presidente do Banco Central. Em suas declarações depois do anúncio de Haddad, Galípolo continuou a exibir prudência e comedimento, reafirmando seu compromisso com o controle da inflação, mas seus esforços foram evidentemente sabotados pelos petistas. Galípolo, portanto, já assumirá sob desconfiança ainda maior de que não terá independência para conduzir o Banco Central na tarefa de fazer o que for necessário para proteger o poder de compra da moeda. Para o PT, o Banco Central só é autônomo no papel, e olhe lá. Na prática, o partido considera que o BC deve curvar-se à vontade de Lula da Silva, reduzindo os juros na marra para estimular a economia, mesmo que isso signifique uma explosão inflacionária.
Assim como Costa, Gleisi Hoffmann também espalhou brasas onde já havia muito fogo: em postagem nas suas redes sociais, disse que o “mercado passou semanas exigindo cortes”, elogiou o “esforço fiscal” e “uma reforma da renda socialmente justa e fiscalmente neutra” e creditou as reações negativas a uma “especulação contra o Brasil”. Depois de meses promovendo ataques a Haddad, a dupla Gleisi e Lindbergh passou a elogiá-lo publicamente, uma evidência de qual ala foi vitoriosa dentro do governo. Se gente como Lindbergh e Gleisi gostou do pacote fiscal do governo, então já sabemos que será ruim para o País.
‘Governo terá de voltar para a prancheta e anunciar outro programa em 2025′, diz Carlos Kawall
Por Gabriela Jucá (Broadcast) / O ESTADÃO DE SP
O ex-secretário do Tesouro e sócio-fundador da Oriz Partners, Carlos Kawall, classificou o pacote fiscal anunciado pelo Ministério da Fazenda como uma “decepção”. O economista considera que o anúncio do pacote, em conjunto com a divulgação da isenção de Imposto de Renda (IR) para quem ganha até R$ 5 mil, teve um viés populista e eleitoral, e revelou ainda mais fragilidade do governo com o compromisso com as contas públicas. Ele também enfatiza que esse não deve ser o último ajuste fiscal antes das eleições de 2026. “Não dá para parar por aqui”, disse.
A forte frustração do mercado com o pacote do governo coloca uma elevação de 0,75 ponto porcentual na taxa Selic na última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do ano como a opção mais suave no momento, segundo Kawall. “A hipótese de uma alta de 1 ponto não seria tão descabida neste momento”, afirma.
Confira abaixo os principais trechos da entrevista ao Broadcast:
Como o sr. recebeu o pacote fiscal?
Foi uma grande decepção. Nós temos um ambiente político muito polarizado, e que não vem de agora. E o comprometimento com as regras fiscais tem declinado. Tivemos Propostas de Emenda à Constituição (PECs) que foram excepcionalizando gastos, e culminou na PEC da Transição em 2022, já depois da eleição do Lula, em que acabaram com o teto de gastos, instituíram o novo arcabouço, que andou várias casas para trás. Então entramos num terreno em que a regra não vale muito, não há uma regra que realmente discipline a trajetória das contas fiscais. Hoje, vemos que no Brasil, o que vale mesmo é a regra do gasto obrigatório, o resto que é o arcabouço, na verdade, não vale muito. Elevar o gasto a 2,5% real ao ano não gera estabilidade da dívida pública. A calibragem do arcabouço parece ter sido feita para durar até 2027. Tudo que está sendo feito é reduzir a velocidade de crescimento do gasto obrigatório. E por quê? Se não fizerem isso, no ano que vem, a margem para o gasto discricionário seria baixa, e em 2026, ano eleitoral, mais baixa ainda. Então, o governo chegaria em 2026, no ano eleitoral, com a água ali no pescoço, se não for no nariz, do ponto de vista da compressão que o gasto obrigatório vai ditar sobre o gasto discricionário, que é aquele que você quer ter alguma margem de manobra, alguma flexibilidade, sempre, mas sobretudo no ano eleitoral.
E as eleições em 2026 seriam um risco adicional para a consolidação dessa agenda fiscal?
Sim, e esse pacote que anunciaram agora já é a expressão disso. Ou seja, você percebeu que em uma corrida mais longa, que dura quatro anos, chegou no segundo ano e você já está sem fôlego. Você sabe que o terceiro e o quarto ano são os mais importantes, então você precisa reajustar os parâmetros da equação para ter fôlego para o final de 2025, antes da eleição. O que ficou claro é que o compromisso do governo com um ajuste fiscal, o disciplinamento das despesas, que parecia já bastante frágil, mas que o mercado deu o benefício da dúvida, esse compromisso, na prática, é inexistente. O desenho do pacote visa muito mais a colocar um pouco de areia na engrenagem do crescimento do gasto obrigatório, reduzir a sua velocidade de expansão, que no longo prazo continuará insustentável, mas reduzir na medida daquilo que é necessário para gerar um fôlego fiscal adicional em 2025 e 2026, que são anos eleitorais. É simplesmente uma realocação de um pouco menos de gasto obrigatório para mais gasto discricionário.
E a decisão de fazer o anúncio do pacote com a isenção de IR?
Pelo desconforto da ala política, pela dinâmica da própria decisão, que revelou que a equipe econômica do ministro Haddad está em segundo plano, entendeu-se que esse tipo de anúncio deveria ser acompanhado por outra boa notícia, que foi a isenção de IR para quem ganha até R$ 5 mil, um ponto de campanha do presidente. Aí claramente indicou que o viés da obra como um todo é populista, é um viés político-eleitoral. E essa medida, ela ainda interfere na própria dinâmica da política monetária, porque há dúvidas de como será feita essa compensação. Mesmo que compense essa do IR por qualquer outra medida que eles adotem, é uma medida expansionista do ponto de vista do consumo, porque a baixa renda consome muito mais enquanto porcentual do que recebe do que qualquer outra alternativa que encontre para compensar. É uma medida populista, é expansionista do ponto de vista do consumo, e carrega nela o viés eleitoral, que ficou claro no pronunciamento do ministro Haddad. A expectativa com esse pacote que já era baixa foi superada do ponto de vista negativo.
Este ano a agência Moody’s colocou o Brasil a um passo do grau de investimento. Com esse pacote, qual a possibilidade de avanço ainda neste governo?
A Moody’s surpreendeu de uma maneira muito forte, e a explicação para isso é que o rating é muito relativo. Sim, olharam mais para o crescimento e entenderam que o Brasil não estava tão mal. Então, não posso responder que a probabilidade de eles darem o grau de investimento é super baixa, porque havia uma probabilidade de 5% para o último rating e, não obstante, isso ocorreu. Se a Moody’s der o grau de investimento, hoje eu já acho que a probabilidade é de uns 30%, não 5%. As outras agências, a S&P, a Fitch, já deixaram muito claro que estão distantes desse movimento. Então, para essas duas, eu acho que a chance diminuiu. A Moody’s eu não sei dizer, porque como eles se contentaram com tão pouco, pode ser que esse “muito pouco” seja o que eles entendem que falta para dar o grau de investimento.
E teremos mais ajustes depois desse?
A minha conclusão com relação a tudo isso é o seguinte: não vai dar para parar por aqui. Porque quando você precisa fazer esse tipo de ajuste, dois anos antes da eleição, por conta de uma política de irresponsabilidade fiscal, em um contexto de economia crescendo muito, desemprego muito baixo, onde a probabilidade da economia desacelerar é muito maior do que ela continuar crescendo aos níveis em que ela está, e você tem agora o ciclo eleitoral pela frente, as chances da situação se deteriorar adicionalmente são grandes. Então, qual é a probabilidade do que eles anunciaram agora ser o movimento final de ajuste das contas públicas até a eleição daqui a dois anos? Baixíssimo. É muito baixa. Eles vão ter que voltar a atacar esse tema mais para frente. Eles vão ter que, brevemente, em algum momento do ano que vem, voltar para a prancheta e anunciar um outro programa. Esse não é o suficiente.
As expectativas de inflação já estavam em uma deterioração persistente. Elas devem desancorar ainda mais? Qual o efeito disso na Selic? Estamos mais para uma alta de 0,75 ponto na reunião de dezembro?
Com certeza, até porque, como está sendo comentado no mercado, o 0,75 ponto virou até uma opção mais dove (suave) nesse momento. De início, você pode ver e pensar que é um aumento bem Hawk (duro), de ser uma postura muito dura do BC. Como a curva de juros já está precificando algo entre o 0,75 e o 1, no fundo, a hipótese de uma alta de 1 ponto não seria descabida neste momento. O 0,75 viria como uma opção até branda, dado o processo de desencorajamento que tem vindo desde o último Copom e no último Focus e que vai continuar até a próxima reunião do colegiado. Tendo em vista que, do ponto de vista da inflação corrente, a situação não é favorável, estamos vendo toda essa pressão no câmbio, e muito da precificação da Selic ainda está feita, se você for olhar o Focus com câmbio de R$ 5,50, e estamos falando de R$ 6 hoje, certamente vamos continuar vendo, até a reunião do Copom, uma desancoragem adicional. Então, o que achamos é que esse Copom com alta de 0,75 está praticamente garantido.
Com o dólar na casa dos R$ 6, como fica o cenário para a inflação de 2025? Vai ser pior em relação a esse ano, deve também superar o teto da meta?
Acho que a probabilidade é muito grande, porque até aqui vínhamos focando no núcleo de serviços, uma relação muito direta com a dinâmica da economia e do mercado de trabalho. Então, essa dinâmica do mercado de trabalho, dos salários, ainda vai demorar muito para gerar um benefício do ponto de vista da inflação de serviços. Enquanto a gente vai colher muito lentamente esse processo de desinflação, a gente já entrou com outro vetor, que é o dólar. O que não está tranquilo é a dinâmica dos IGPs. E isso, do ponto de vista dos bens industriais, do consumo de bens, tem uma transmissão que não é imediata, mas também não é tão rápida, não é tão lenta quanto a desinflação dos salários, dos serviços. Então, no ano que vem, a gente vai convergir para uma inflação de bens mais alta, por conta da pressão do dólar e dos IPAs, num momento em que a inflação de serviços vai continuar ainda muito elevada, porque os sinais de moderação são ainda muito tênues. E, nesse contexto, a gente falar em uma inflação de 5% no ano que vem, ou, a depender do patamar do dólar, até acima disso, parece bastante razoável. E dependendo, inclusive, de qual é a postura do Banco Central, claro.
Com essa frustração do pacote, como fica o crescimento da dívida/PIB no médio e no longo prazo?
Estamos trabalhando com um nível de 85% do PIB no final de 2026, no final do atual governo. Pode ser pior, até porque estamos vendo uma dinâmica muito negativa do juro real, que já bateu 7% nos vencimentos mais curtos, o câmbio também tem algum impacto negativo, no caso da dívida bruta, e vai depender muito do crescimento do PIB e da receita. O que está muito claro é que em 2027, seja oposição ou governo, a grande agenda vai ser a agenda da desindexação do gasto, a questão da vinculação dos benefícios sociais ao salário mínimo, saúde e educação indexados à receita, as regras de acesso aos benefícios sociais, o abono salarial, o seguro-desemprego. Essa bomba relógio vai ter de ser desmontada e, inclusive, muito provavelmente, com uma nova reforma da Previdência. Então, vamos entrar em 2027 tendo como a grande agenda pós-eleitoral a redefinição de toda essa indexação, de toda essa rigidez orçamentária que vem desde a Constituição de 88.
Governo Lula morde o próprio rabo com pacote desmilinguido e projeto que cria buraco na arrecadação
Por Carlos Andreazza / O ESTADÃO DE SP
Pacote de corte de gastos que não corta gastos. / Pacote de corte de gastos que corta receitas. / Que não corta gastos. Que corta receitas – que deixa descobertas. / O corpo que cresce. O cobertor que encolhe. / As razões do mau humor – do dólar que flanou aos R$ 6 – são. O poeminha explica.
Pacote de corte de gastos, “expressivo” por mais de mês, que se desmilinguiu em pente-fino requentado. Promessa desidratada – pela “convergência” dos ruis-costas – em desaceleração modesta do ritmo de crescimento das despesas. Poupança de R$ 70 bilhões – somados os dois próximos anos – que só a matemática de Haddad encontra. Pacote tenta-empurrar-a-imposição-do-mundo-real-para-2027. Pacote rola-engana-bomba-até-2026.
O arcabouço fiscal, natimorto muito louco que ora se fantasia reanimar, é casa que não poderia ter teto, nunca pôde, por inexistência original de paredes. Filho da esquecida PEC da Transição. A engenharia não fecha. Quem financia o cimento do governo percebe – e faz preço. Nada contra política pública – a isenção do imposto de renda para quem ganha até R$ 5 mil – que beneficie os que recebem menos. Tudo contra projeto apregoado sem previsão razoável de como suprir o volume da renúncia fiscal. Seriam cerca de R$ 40 bilhões por ano.
Taxados – o cronista apoia – os que ganham mais de R$ 50 mil por mês, pergunta-se: o valor levantado alcançaria cobrir o buraco na arrecadação?
Não é a iniciativa nem a quem se destina. É a conta que não fecha. Governo gastador acelerado que abriria mão de receitas para beneficiar os que ganham menos; os que seriam prejudicados já. O cidadão, que come dólar e é comido pela inflação imediatamente, não pagaria imposto de renda a partir de 26. A ver com que poder de compra chegará lá.
A ver como chegará lá a dívida pública – que cresce descontroladamente. Insustentabilidade que o governo ilumina. Iluminado também o diabo que será capaz de fazer em – por – 26. A embocadura se arma para expansionismo fiscal – uma nova PEC Kamikaze – em nome da reeleição de Lula. A ver com que poder de compra chegará lá.
O governo corre para morder o próprio rabo repetidamente.
O improviso para gerar esse pacote afinal murcho consistiu em resposta à reação do mercado malvadão ante a leitura – era começo de outubro – de que a Fazenda apresentaria o projeto de reforma do imposto de renda sem demonstrar de onde viriam os bilhões para preencher o rombo. O compromisso de austeridade veio, para fazer esquecer a intenção de mexer no IR, e depois o anúncio televisivo das medidas – junto com o plano de isenção e sem solução crível para lhe tapar a cova.
O governo Lula se empenha em abocanhar o próprio rabo – parece que desta vez contido, avalie-se o drama, por Lira e Pacheco.
‘Mercado de ações judiciais é assustador’, diz PF sobre ‘pacotes de corrupção’ no TJ do Tocantins
Por Pepita Ortega / O ESTADÃO DE SP
A Polícia Federal acredita ter identificado um mercado de ‘pacotes de corrupção’ no Tribunal de Justiça do Tocantins. Relatório da Operação Máximus, que levou ao afastamento sumário de cinco desembargadores e quatro juízes de primeiro grau sob suspeita de ligação com venda de sentenças, indica uma rotina de propinas que teriam sido pagas em processos distintos.
“O mercado de ações judiciais é tão assustador que os potenciais clientes buscam fazer pacotes para os supostos atos de corrupção”, afirma o delegado da PF Daniel César do Vale, da Delegacia de Combate à Corrupção, Desvio de Recursos Públicos e Crimes Financeiros.
A investigação mira a presidente da Corte estadual, desembargadora Etelvina Maria Sampaio Felipe, e a vice Ângela Maria Ribeiro Prudente. Também são investigados os desembargadores Helvécio de Brito Maia Neto, Angela Issa Haonat e João Rigo Guimarães, presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Tocantins.
Na ocasião da operação, a desembargadora Etelvina Maria Sampaio Felipe disse ter recebido com “indignação e repúdio o indevido envolvimento” de seu nome na Operação da PF e negou qualquer irregularidade. A desembargadora Angela Maria Ribeiro Prudente refutou “de maneira categórica, quaisquer ilações ou sugestões de favorecimento, assinalando que jamais recebeu qualquer vantagem indevida em razão do exercício de seu cargo, sendo absolutamente infundados os fatos apresentados, o que será comprovado brevemente”. Veja a íntegra dos posicionamentos das duas no fim desta reportagem.
Ao Estadão, a defesa de Thales Maia, filho do desembargador Hevécio, afirmou que “ainda não teve acesso à integra das investigações, sobretudo aos diálogos citados na decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça” e apontou que “no que diz respeito aos elementos já disponibilizados à defesa, já foi demonstrado que todos os diálogos foram tirados de contexto e não versam sobre qualquer ato ilícito”.
A defesa do advogado Thiago Sulino de Castro indicou que “se manifestará acerca das ilações e conjecturas apresentadas pela Polícia Federal nos autos, dado que o procedimento se encontra sob sigilo”. Segundo os advogados, os fatos narrados pela PF “distorcem a realidade, revelando – ao fim e ao cabo – tentativa de criminalização do exercício da advocacia, atrelando ao investigado condutas atípicas, que não encerram qualquer traço de ilegalidade”.
Os demais ainda não se manifestaram. O espaço está aberto para manifestações.
Áudios ‘estarrecedores’
As suspeitas ganharam força a partir da análise de áudios dos investigados, que foram classificados pelos federais como ‘estarrecedores’ porque indicam magistrados reclamando de pagamentos parcelados de propinas. Uma gravação que levou os investigadores a um suposto caso de venda de sentença foi achada no celular do advogado Thales Maia, apontado como lobista na Corte do Tocantins. Ele é filho do desembargador Helcévio Maia.
A conversa que passou pela perícia da PF foi entre o advogado Thiago Sulino de Castro, a quem os investigadores atribuem papel de suposto articulador de venda de decisões judiciais, e Thales Maia. Os dois são apontados como personagens-chave do inquérito da Operação Máximus. Procurados, eles não se manifestaram.
O áudio é de agosto de 2023. Thales fala sobre um ofício assinado pelo juiz Ricardo Gagliardi, da 1º Vara Cível de Miracema do Tocantins. Nesse documento, o magistrado citou um conjunto de ações de improbidade administrativa. Ele indicou no despacho que outros magistrados da comarca se declararam suspeitos, por foro íntimo, para analisarem o caso.
Gagliardi pediu, na ocasião, à presidente do TJ Etelvina Maria Sampaio Felipe a ajuda de um outro juiz para conduzir o caso.
Os analistas de áudio da PF transcreveram assim a frase atribuída a Thales. “O Thia...[grunhido de garganta] Thiago, essas duas ACP aí, elas estão atrelada uma na outra. E aí eu não entendi como é que você falou que tava na mão da outra pessoa, sabe. E ooo.. Gagliardi lá já tinha mandado oficiar o Nacon pa, pra atuar nesses processo. Lá será que não consegue não? o menino lá? E aí a gente juntava as duas aí e fazia um pacote.”
Para a PF, a expressão “o menino lá” seria uma referência a Thales Maia. A corporação anota que Thiago encaminhou o áudio a Thales, para que este tivesse “conhecimento do pedido formulado pelo interlocutor de voz desconhecida”.
A PF citou a gravação ao pedir as diligências da Operação Máximus, no dia 23 de agosto. Os investigadores querem aprofundar as investigações para “comprovar quem é o interlocutor de voz desconhecida, podendo tratar-se de advogados ou parte na referida ação de improbidade administrativa, bem como se houve trato econômico para a mercância, notadamente em razão da expressão ‘fazia um pacote’.”
A defesa de Thiago Sulino questiona a alegação da PF, afirmando que a corporação “se vale de áudio descontextualizado de uma conversa para, partindo da mera capacidade intuitiva, mencionar alegada “mercância de decisões”; logo em seguida, porém, indica sequer ser possível confirmar tal hipótese com um mínimo de segurança”.
A ação de improbidade citada na gravação foi apresentada em 2016 pelo Ministério Público do Tocantins contra a ex-prefeita de Lajeado, Márcia da Costa Reis Carvalho, a ‘Márcia Enfermeira’. O valor da causa é R$ 5 milhões.
Em 2017, o processo foi aberto e a Justiça decretou o bloqueio de bens de ‘Márcia Enfermeira’ em até R$ 6 milhões. Desde então, pelo menos três juízes se declararam suspeitos para julgarem o caso, que ainda está em tramitação. Em outubro passado, a emedebista ‘Márcia enfermeira’ foi eleita prefeita de Lajeado, município com 3,5 mil habitantes situado a 62 quilômetros da capital Palmas.
O despacho que abriu a ação descreve as acusações à prefeita eleita: supostas irregularidades em gastos com combustíveis (R$ 141 mil em 2010); movimentação irregular de valores em caixas (R$ 100 mil em 2010); contratação sem licitação (R$ 1,7 milhão em 2010); irregularidades no recolhimento de contribuições previdenciárias (2013); irregularidades no repasse de duodécimos (2014), entre outros.
A PF destaca que, entre as imputações da ação de improbidade administrativa, está a contratação sem licitação de escritórios de advocacia investigados na Operação Máximus: o Melo e Bezerra Advogados, com dois contratos na mira do Ministério Público em valores de R$ 4 milhões, e o Brom & Brom Advogados Associados, com um contrato de R$ 25,4 mil. Ambas as bancas são investigadas pela Polícia Federal como “prováveis compradoras de decisão judicial no caso do precatório de Lajeado” - outro caso sob investigação da Polícia Federal. Nenhuma delas se manifestou.
O caso do precatório de Lajeado envolve, segundo a PF, “complexa relação processual de diversos agravos de instrumentos, bem como atos jurisdicionais em cumprimento de sentença contra a Fazenda Pública, os quais passam por cima de outras decisões judiciais em ações de improbidade administrativa, sendo um dos mais intrincados casos de mercancia investigado no inquérito” da Operação Máximus.
Os investigadores veem uma ‘conduta orquestrada’ entre o juiz José Maria Lima e o advogado Thiago Sulino – os dois alvos do inquérito da PF - “com finalidade de superar a suspensão de pagamento de honorários que, em tese, decorre de contrato praticado com atos de improbidade administrativa, para permitir a satisfação de dinheiro indevido ao escritório Brom & Brom Advogados Associados, e, ao fim e ao cabo, ao escritório Melo & Bezerra”.
A hipótese da PF é que, neste caso, o desembargador Helvécio de Brito Maia Neto – pai de Thales – teria aceitado promessa de pagamento de propina, proferindo uma decisão suspeita em 2022, em ação entre o município de Lajeado e o Estado do Tocantins, em razão de uma outra decisão suspeita, do juiz José Maria Lima, no bojo de uma ação de improbidade. As propinas teriam sido prometidas, segundo suspeitam os investigadores, por integrantes do escritório Brom e Brom, e por Fábio Bezerra de Melo Pereira, do Bezerra & Melo.
COM A PALAVRA, A DEFESA DE THALES MAIA
A defesa técnica do Sr. Thales Maia ainda não teve acesso à integra das investigações, sobretudo aos diálogos citados na decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça e que permanecem sob sigilo. Contudo, informa que, no que diz respeito aos elementos já disponibilizados à defesa, já foi demonstrado que todos os diálogos foram tirados de contexto e não versam sobre qualquer ato ilícito.
COM A PALAVRA, A DEFESA DE THIAGO SULINO
A defesa do advogado Thiago Sulino de Castro informa que, como já tem feito, se manifestará acerca das ilações e conjecturas apresentadas pela Polícia Federal nos autos, dado que o procedimento se encontra sob sigilo. De toda sorte, porém, esclarece que os fatos narrados pela autoridade policial distorcem a realidade, revelando – ao fim e ao cabo – tentativa de criminalização do exercício da advocacia, atrelando ao investigado condutas atípicas, que não encerram qualquer traço de ilegalidade.
Apenas a título exemplificativo, a propósito da ação civil pública mencionada, vale destacar que a própria autoridade policial se vale de áudio descontextualizado de uma conversa para, partindo da mera capacidade intuitiva, mencionar alegada “mercância de decisões”; logo em seguida, porém, indica sequer ser possível confirmar tal hipótese com um mínimo de segurança.
Por fim, a defesa ressalta que, com o desenrolar das investigações, a verdade será plenamente reestabelecida pelos meios judiciais próprios.
COM A PALAVRA, O TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO TOCANTINS
Quando a operação foi aberta, o Tribunal informou que repassou todas as informações necessárias à PF.
COM A PALAVRA, A DESEMBARGADORA ETELVINA
A desembargadora Etelvina Maria Sampaio Felipe, informa que recebeu com “enorme surpresa, indignação e repúdio o indevido envolvimento de seu nome na denominada “Operação Máximus”, uma vez que, ao longo de seus 35 (trinta e cinco) anos de magistratura, sempre pautou sua conduta pessoal e profissional na ética, honestidade, honradez e retidão de caráter.
Especificamente quanto aos questionamentos feitos pela reportagem, cumpre informar o seguinte: Diferentemente do alegado pela Polícia Federal, a Desembargadora Etelvina Maria Sampaio Felipe NUNCA atuou em qualquer processo administrativo ou judicial envolvendo as empresas Ore MN Mineração Ltda.
- A Desembargadora Etelvina Maria Sampaio Felipe NUNCA proferiu qualquer despacho, decisão, sentença, voto ou acórdão no processo n. 0000389-32.2021.8.27.2714, tendo em vista que em 15/05/2023 (já como Presidente do TJTO) declarou-se impedida, na forma autorizada pelo art. 144, inciso III, do CPC, o que levou à remessa do processo à Vice-Presidente do TJTO; A Desembargadora Etelvina Maria Sampaio Felipe NUNCA proferiu qualquer despacho, decisão, sentença, voto ou acórdão no processo n. 0001460-77.2022.8.27.2700, vez que este tramitou exclusivamente no Gabinete de outro Desembargador;
- Ao contrário do alegado pela Polícia Federal, a Desembargadora Etelvina Maria Sampaio Felipe NUNCA proferiu qualquer despacho, decisão, sentença, voto ou acórdão no processo denominado tutela cautelar antecedente n. 0015754- 37.2022.8.27.2700. A decisão que consta em referido processo, na verdade, foi proferida pelo então Presidente do Tribunal Justiça do Estado do Tocantins (TJTO) em 15/12/2022, enquanto a Desembargadora Etelvina Felipe somente veio a assumir a Presidência do TJTO dois meses depois, precisamente em 01/02/2023;
- Provavelmente, a Polícia Federal não se preocupou em investigar a veracidade da alegada denúncia anônima, não consultou o processo n. 0015754-37.2022.8.27.2700 e, de forma manifestamente temerária, limitou-se a verificá-lo somente pela capa, na qual consta o nome da Desembargadora Etelvina pelo simples fato de ser ela a atual Presidente do TJTO, fato este que ocorre com todo e qualquer processo judicial no qual tenham sido interpostos Recurso Especial (REsp), para o STJ; e/ou Recurso Extraordinário (RE) para o STF;
- A Desembargadora Etelvina Maria Sampaio Felipe não conhece e, portanto, NUNCA manteve qualquer contato de qualquer natureza, pessoalmente ou por interpostas pessoas, com os investigados Thales André Pereira Maia, Thiago Sulino de Castro, Hanoara Martins de Souza Vaz e/ou Daniel de Almeida Vaz;
- A própria PF informa que a suposta vantagem foi paga à TAPM Publicidade, e em um enredo criativo baseado em suposições pessoais da PF aponta, sem qualquer lastro, que essa vantagem seria destinada à Desembargadora Etelvina Maria Sampaio Felipe, o que NUNCA aconteceu.
A desembargadora Etelvina Maria Sampaio Felipe repudia de forma veemente todas as ilações, narrativas e suposições indevidas e fantasiosas envolvendo o seu nome, apenas com a intenção malévola de agredir sua honra e apagar sua história, mas mesmo, com sua honra abalada, reafirma o seu compromisso inabalável com os ideais de justiça, e confia que no momento adequado comprovará de forma cabal, a sua inocência, mantendo-se firme na Presidência do Tribunal de Justiça do Estado do Tocantins.
COM A PALAVRA, A DESEMBARGADORA ANGELA MARIA RIBEIRO PRUDENTE
A desembargadora Ângela Maria Ribeiro Prudente vem apresentar resposta ao questionamento levantado por esse veículo de comunicação em relação à chamada “Operação Máximus” da Polícia Federal, sendo relevante registrar que o processo judicial envolvendo a empresa ORE MN MINERAÇÃO LTDA. (autos n. 0000389-32.2021.8.27.2714) foi julgado pela 1° Câmara Civil do Tribunal de Justiça do Estado do Tocantins, onde esta Magistrada não participa como julgadora e, portanto, sequer atuou no julgamento de mérito do processo.
Cumpre esclarecer que, no referido processo, a atuação desta Desembargadora ocorreu apenas na condição de Vice-presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Tocantins, em substituição à Presidente, a qual se declarou impedida, momento em que exerceu o juízo de admissibilidade do Recurso Especial, na data de 19/05/2023.
Importante ressaltar que, antes disso, já havia sido concedido efeito suspensivo ao aludido Recurso Especial pelo então Presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Tocantins, em 15/12/2022, nos autos de Tutela Cautelar Antecedente no 0015754-37.2022.8.27.2700. Frise-se, ainda, que o aludido efeito suspensivo foi mantido pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, através de decisão proferida em 27/01/2023 no âmbito do Pedido de Tutela Provisória n. 4322/TO (2023/0004173-8).
Acrescento que não tenho relação de amizade ou mesmo proximidade com as pessoas de José Alexandre Silva, Thales André Pereira Maia, Honoara Martins de Souza Vaz, Daniel de Almeida Vaz e Thiago Sulino, que nunca trataram com esta Magistrada sobre qualquer processo. Esta Desembargadora, portanto, refuta de maneira categórica, quaisquer ilações ou sugestões de favorecimento, assinalando que jamais recebeu qualquer vantagem indevida em razão do exercício de seu cargo, sendo absolutamente infundados os fatos apresentados, o que será comprovado brevemente.
Por fim, destaco que exerço a honrosa função de Magistrada há 35 anos, sempre pautada na ética, respeito e honestidade, sem qualquer mácula na minha carreira. Externo minha confiança na atuação imparcial dos integrantes do Sistema de Justiça Brasileira, razão pela qual aguardo com firmeza e serenidade o esclarecimento dos fatos em relação a esta Magistrada.
COM A PALAVRA OS DEMAIS DESEMBARGADORES E JUÍZES CITADOS
A reportagem buscou contato por meio da assessoria do TJ-TO e aguarda posicionamento. O espaço está aberto para manifestações.
COM A PALAVRA, OS ESCRITÓRIOS DE ADVOCACIA BROM & BROM E MELO & BEZERRA A reportagem buscou contato por e-mail e WhatsApp com os escritórios. O espaço está aberto para manifestações.
COM A PALAVRA, A PREFEITA ‘MÁRCIA ENFERMEIRA’
A reportagem buscou contato por WhatsApp com um dos advogados que representam Márcia no processo de improbidade. O espaço está aberto para manifestações.
Por que não conseguimos fazer ajuste fiscal decente?
Marcos Mendes / FOLHA DE SP
A dívida pública está crescendo rapidamente, sem perspectiva de se estabilizar como proporção do PIB. É por isso que os juros sobem e o dólar dispara a qualquer notícia preocupante. O governo reagiu prometendo um plano para fazer a despesa crescer mais devagar. Mas apresentou uma proposta fraca, incapaz de mudar a trajetória da dívida, após mais de um mês de debates internos.
Uma causa da timidez da proposta é a descrença do PT quanto à gravidade do problema. Seus economistas e políticos creem que o déficit público sempre gera crescimento econômico suficiente e perene para resolver qualquer problema de solvência pública. Por isso, não há, dentro do governo, realismo e senso de urgência para lidar com a situação.
Há dois outros fatores que emperram a correção de rota fiscal: a fragilização do presidencialismo de coalizão e o esgotamento do pacto social da Constituição de 1988.
Como já argumentei em coluna anterior, o chamado presidencialismo de coalizão é um arranjo delicado, para tornar funcional um sistema político cujas regras sistematicamente geram presidentes minoritários no Congresso, grande número de partidos, parlamentares com agendas e incentivos individualizados, focados em emendas e benefícios regulatórios a seus patrocinadores. Com zero preocupação com equilíbrio macroeconômico.
O presidencialismo de coalizão, nos primeiros anos da nova Carta, dava ao Presidente da República instrumentos para induzir a formação de maioria no Congresso, capaz de aprovar suas pautas. Ocorre que esses instrumentos (as Medidas Provisórias, os vetos, as emendas parlamentares não obrigatórias) têm sido enfraquecidos. Além disso, houve fragmentação partidária: os três grandes (PFL, PMDB e PSDB) se dividiram em diversas siglas de tamanho médio, dificultando a negociação para a formação de maiorias.
Mesmo um Poder Executivo ciente da necessidade de fazer reformas fiscais teria dificuldade neste novo cenário. Imagine um que seja inapetente.
Adicionalmente, vemos o pacto social de 1988 se esgotar. A nova Carta distribuiu benefícios e privilégios à vontade, desde ampliação de políticas sociais (muitas delas necessárias e bem-sucedidas) até subsídios a grandes empresas. Em uma sociedade desigual, estabilizou-se a democracia trazendo a solução do conflito distributivo para dentro do Estado. Isso garantiu, até agora, o mais longo período democrático desde a Proclamação da República.
O problema é que o dinheiro acabou: a carga tributária e a dívida pública estão no teto. O efeito colateral desse modelo é o baixo crescimento. Mas a sociedade se acostumou a fazer política assim, e há sempre incentivo a pedir e conceder mais.
A crise fiscal precisa ser resolvida de imediato, os desarranjos institucionais não serão superados facilmente. A menos que a ficha caia para as principais lideranças políticas, e que haja um esforço conjunto dos Poderes para fazer um ajuste fiscal que limite o ritmo de crescimento da despesa, rumaremos para inflação persistente de dois dígitos, sepultando o Plano Real e, mais adiante, para outra recessão grave. Permaneceremos um país de renda média, com muitos pobres.