Sistema de pagamentos do governo é invadido, e há suspeita de desvio de recursos
O sistema de administração financeira do governo federal, o Siafi, usado na execução de pagamentos, foi alvo de uma invasão no mês de abril. Há suspeita de que os autores do ataque conseguiram emitir ordens bancárias e desviar recursos da União.
A Polícia Federal investiga o caso e atua no rastreio dos suspeitos com apoio da Abin (Agência Brasileira de Inteligência).
O Tesouro Nacional, órgão gestor do Siafi, implementou medidas adicionais de segurança para autenticar os usuários habilitados a operar o sistema e autorizar pagamentos.
Segundo interlocutores que auxiliam nas investigações, o sistema de autenticação dos usuários por meio do portal gov.br sofreu um ataque. Com a falha de segurança, gestores habilitados para fazer movimentações financeiras tiveram seus acessos utilizados por terceiros sem autorização.
As apurações indicam que os invasores conseguiram acessar o Siafi utilizando o CPF e a senha do gov.br dos gestores e ordenadores de despesas para operar a plataforma de pagamentos.
A suspeita é que os invasores coletaram os dados sem autorização via sistema de pesca de senhas (com uso de links maliciosos, por exemplo). Uma das hipóteses é que essa coleta se estendeu por meses até os suspeitos reunirem um volume considerável de senhas para levar a cabo o ataque.
Outros artifícios também podem ter sido empregados pelos invasores. A plataforma tem um mecanismo que permite desabilitar e recriar o acesso a partir do CPF do usuário, o que pode ter viabilizado o uso indevido do sistema.
Na prática, os invasores conseguiram alterar a senha de outros servidores, ampliando a escala da ação.
De acordo com as apurações preliminares, uma das tentativas de invasão se deu no início de abril por meio do uso não autorizado de acessos pertencentes a gestores da Câmara dos Deputados.
A fraude foi detectada porque o CPF do gestor utilizado para tentar emitir uma ordem bancária por meio do Pix (OB Pix) era o mesmo de quem fez a liquidação da despesa. Nas regras de administração financeira federal, a liquidação e o pagamento precisam ser autorizados por gestores distintos.
Além disso, apesar da possibilidade, a Câmara não adota como procedimento a execução de pagamentos via Pix.
Na ocasião, outro fator que dificultou a ação dos invasores foi o fato de que a OB Pix já estava desabilitada. Segundo os relatos, outra unidade gestora já havia sido alvo do mesmo tipo de ataque.
As suspeitas indicam que houve uso indevido dos acessos do gov.br para operar o Siafi em outros órgãos do Executivo. O governo ainda apura os impactos nos ministérios.
Segundo interlocutores que auxiliam nas investigações, há suspeita de pagamentos com substituição do destinatário original da dotação orçamentária, caracterizando o desvio. Não há confirmação oficial sobre os montantes envolvidos, nem quais órgãos foram alvo da ação.
A Abin informou que "acompanha o caso em colaboração com as autoridades competentes".
Técnicos ouvidos pela Folha observam que o Siafi é um sistema complexo, pouco intuitivo, e operá-lo requer conhecimento especializado sobre a plataforma.
Após os episódios do início do mês, o Tesouro Nacional comunicou aos gestores e ordenadores de despesa que o acesso ao Siafi passaria a ser feito apenas por meio do certificado digital.
Mesmo assim, o governo detectou novas tentativas de invasão com a utilização de certificados digitais emitidos por empresas privadas. As apurações preliminares indicam que os invasores conseguiram emitir os certificados em nome dos servidores públicos habilitados no sistema de pagamentos.
Nesta segunda-feira (22), o gestor do Siafi passou a exigir acesso com certificado digital emitido pelo Serpro, empresa pública federal do ramo de tecnologia.
O alerta sobre essa última mudança foi emitido na noite de sexta-feira (19), às 19h52 —o sistema fecha às 20h e não opera nos finais de semana. A nova regra passou a ser implementada nesta segunda.
O comunicado foi emitido pelo Centro de Prevenção, Tratamento e Resposta a Incidentes Cibernéticos do Governo (CTIR Gov), em colaboração com o Centro Integrado de Segurança Cibernética do Governo Digital.
O ministro Fernando Haddad (Fazenda) disse nesta segunda disse que o problema não é do Siafi em si, mas sim de autenticação de acesso.
"É isso que está sendo apurado. Como é que alguém teve acesso tendo sido autenticado. Ou seja, não foi uma ação de um hacker que quebrou segurança, não foi isso. Foi um problema de autenticação. É isso que a Polícia Federal está apurando e obviamente que está rastreando para chegar nos responsáveis", afirmou.
O ministro da Fazenda, pasta à qual o Tesouro Nacional é ligado, afirmou ainda que não tem informação dos valores envolvidos.
"Isso estava sendo mantido em sigilo inclusive dos ministros. Estava entre o Tesouro e acho que a Polícia Federal, e eu soube no mesmo momento que vocês. Agora eu vou inclusive informar o presidente [Lula] das informações que eu tenho. Mas repito, não foi uma ação hacker contra o sistema. O sistema está preservado, foi uma questão de autenticação", acrescentou.
O Siafi já havia sido alvo de uma tentativa de invasão em 2021. Na época, o então Ministério da Economia informou que medidas de contenção foram imediatamente aplicadas pela Polícia Federal e que não houve danos ao sistema.
A invasão na ocasião foi do tipo "ransomware". Nessa modalidade de ação, dados da instituição atacada são coletados e pode haver bloqueio do sistema. Em seguida, os criminosos fazem cobrança de uma espécie de resgate, com pedido de pagamento que pode ser em moedas digitais.
Colaborou Nathalia Garcia
Lula cobra Alckmin mais ágil e diz que Haddad tem que falar com Congresso 'em vez de ler um livro'
O presidente Lula (PT) cobrou nesta segunda-feira (22) que seus ministros entrem mais em campo para ajudar na articulação com o Congresso Nacional, em um momento em que o governo vive crise com o Parlamento e sofre o risco de derrotas.
Lula pediu que o vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin (PSB), seja "mais ágil". Também pediu que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, deixe de ler livro e passe mais tempo discutindo com parlamentares.
"Isso significa que o Alckmin tem que ser mais ágil, tem que conversar mais. O Haddad, ao invés de ler um livro, tem que perder algumas horas conversando no Senado e na Câmara. O Wellington [Dias, ministro do Desenvolvimento e Assistência Social], o Rui Costa [ministro da Casa Civil], passar maior parte do tempo conversando com bancada A, com bancada B", afirmou o presidente
As declarações foram dadas durante cerimônia no Palácio do Planalto para o lançamento de programa de concessão de crédito a empresários e pessoas inscritas no CadÚnico, base de dados do governo federal para o pagamento de programas sociais.
A articulação política do governo vem sendo alvo de críticas no Congresso Nacional, embora conte com o respaldo do presidente Lula. O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), chegou a afirmar que o ministro Alexandre Padilha (Relações Institucionais) era um "desafeto pessoal" e "incompetente".
Padilha não chegou a ser citado pelo presidente em seu discurso, embora estivesse também presente. O ministro está na mira de Lira e do bloco centrão, pois é acusado de não honrar as promessas e compromissos feitos com os parlamentares.
Por isso, desde o início do ano, o chefe da Casa Civil, Rui Costa, também passou a ser o principal interlocutor de Lira dentro do Planalto e assumiu também a função de articulação política.
Também nesta segunda-feira, Padilha negou em entrevista que haja uma crise entre o Executivo e o Legislativo.
"Qualquer dificuldade de relação, diálogo, está absolutamente superada", afirmou à GloboNews durante visita a espaço em São Paulo que receberá instalações do programa Minha Casa, Minha Vida Entidades.
Na sexta (19), Lula realizou uma reunião de emergência com ministros palacianos e com líderes do governo no Congresso Nacional para melhorar a coordenação política. O encontro durou quase três horas. A expectativa é que o presidente se encontre nesta semana com Lira e também com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
Participaram da reunião com Lula no Planalto Padilha, Rui Costa, Paulo Pimenta (Secretaria de Comunicação Social da Presidência) e os líderes do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE); no Senado, Jaques Wagner (PT-BA); e no Congresso Nacional, Randolfe Rodrigues (sem partido-AP).
Ao deixar o encontro, Guimarães afirmou a jornalistas que era necessário "ter sempre sintonia com o Lira". No entanto, o líder do governo na Câmara negou que haja uma crise insuperável com o presidente da Casa legislativa.
"Isso é só fazer um consertinho ali, um consertinho lá, mas nada que atrapalhe a nossa vontade e o presidente Lira tem tido essa vontade de votar os projetos de interesse do país", afirmou na ocasião.
Além da briga com Lira, o governo vive um momento delicado com o risco de avanço da pauta-bomba, que pode ter impacto bilionário para as contas públicas. O principal item é a PEC (proposta de emenda à Constituição) que turbina o salário de juízes e promotores, com custo anual de cerca de R$ 40 bilhões.
A proposta é patrocinada por Pacheco.
Na quarta-feira (17), a proposta foi aprovada na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado e deve entrar na pauta de votações do plenário para as cinco sessões de discussão previstas em regimento.
A proposta altera a Constituição para garantir aumento de 5% do salário para as carreiras contempladas a cada cinco anos, até o limite de 35%. A atuação jurídica anterior dos servidores públicos —na advocacia, por exemplo— poderá ser usada na contagem de tempo.
A PEC original tratava apenas de juízes e membros do Ministério Público, mas o relator, senador Eduardo Gomes (PL-TO), incluiu defensores públicos; membros da advocacia da União, dos estados e do Distrito Federal; e delegados da Polícia Federal.
O governo ainda pretende em breve enviar ao Congresso os projetos de lei para regulamentar a reforma tributária, que foi promulgada no fim do ano passado.
Além disso, o Planalto ainda pode sair derrotado com a derrubada de vetos presidenciais, em sessão inicialmente marcada para esta quarta (24). Um dos vetos que pode ser derrubado é referente ao corte de R$ 5,5 bilhões em emendas parlamentares de comissão.
Pacote de crédito é raro aceno da gestão Lula a quem tem aversão à mão pesada do Estado nos negócios
Por Mariana Carneiro / o estadão de sp
O ato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva nesta segunda-feira, 22, de criar uma linha de crédito para microempreedendores individuais (MEIs) e microempresários é caso raro em que a agenda presidencial coincide com a do Congresso. De perfil mais liberal e atento à agenda empresarial, o Parlamento tem respondido de maneira assertiva a temas que têm a bênção do setor privado.
Um exemplo foi a reforma tributária. Em seu discurso no Palácio do Planalto nesta segunda, Lula lembrou da medida, ao provocar os que viam com ceticismo a meta de aprovar uma emenda constitucional sobre o tema.
Se é verdade que houve empenho da equipe do ministro Fernando Haddad, também é verdade que o assunto só ganhou tração com o apoio de políticos que estão no centro e que penderam para Lula na eleição de 2022. E também do Centrão, personalizado na figura do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que escolheu um político de seu partido para a concertação, o deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB).
Já a segunda fase da reforma, a da regulamentação, divide o setor privado. Não à toa teve o envio atrasado e tem um horizonte mais turbulento de negociações no Congresso.
Como antecipou o Estadão em reportagem em 27 de março, o governo baixou nesta segunda-feira uma medida provisória criando as novas linhas de crédito, que começarão a rodar em 60 dias. O tema tem outro ingrediente que não poderia deixar Lula mais satisfeito: mira em nada menos do que 15 milhões de pessoas que se declaram MEIs e em 7,5 milhões de CNPJs que estão no Simples. Juntos, os dois grupos representam mais de 90% dos CNPJs do País, segundo o Ministério do Empreendedorismo.
Traduzindo: trata-se de uma política que terá o condão de aproximar Lula de um contingente numeroso em momento de baixa popularidade. E mais, de um contingente que tem aversão à mão pesada do Estado sobre os negócios.
Não se sabe de pesquisa eleitoral que demonstre como esse contingente enxerga o governo Lula neste momento, mas é possível supor que não se sente atendido quando a pauta do governo é aumentar a arrecadação de impostos.
Ao tentar se aproximar deste grupo com a oferta de crédito, Lula deseja colocar na vitrine um feito pró-setor privado, e nisso deverá ter apoio do Congresso. O Parlamento vem demonstrando simpatia a políticas voltadas ao pequeno negócio e discute até uma ampliação do Simples, mesmo que a iniciativa seja alvo de críticas de especialistas em tributação.
Há dúvidas, porém, sobre a potência da medida. Há expectativa do governo de que os bancos privados passem a ter apetite para emprestar a essa clientela, uma vez que o governo vai oferecer garantia do Tesouro Nacional, por meio do FGO (Fundo Garantidor de Operações). Isso também deverá turbinar, na visão do governo, a versão para empresas do Desenrola, de renegociação de dívidas bancárias. Serão R$ 7,5 bilhões do FGO reservados para as linhas de crédito apresentadas hoje.
A MP prevê que cada operação seja garantida pelo Tesouro, desde que a perda total da carteira não passe de 60% no caso do Procred360 (para MEIs e microempresas). Essas condições são piores do que as oferecidas aos bancos para operar o Pronampe (para pequenas empresas), cujo limite de perda da carteira pode chegar a 80%.
Outra linha, focada em beneficiários do Cadastro Único dos programas sociais do governo, prevê que a perda total da carteira não passe de 20%.
O governo fala em injetar R$ 7,5 bilhões na economia e o ministro Wellington Dias (Desenvolvimento Social) disse imaginar que isso poderá alavancar até R$ 12 bilhões em empréstimos. Vai depender do apetite a risco dos bancos em emprestar para um público que tem inadimplência tradicionalmente mais alta em um momento de incerteza sobre o futuro da taxa de juros. A menos que o governo conte apenas com os bancos públicos, notadamente a Caixa.
No anúncio, Lula falou em usar o crédito ao pequeno empresário como alavanca de desenvolvimento. “Não queremos um País que seja eternamente dependente de Bolsa Família e de vale-gás. Enquanto tivermos isso, não será sociedade de classe média”, disse o presidente.
Parece acreditar que isso também poderá alavancar sua aprovação em grupos que hoje o veem com desconfiança.
Evandro Leitão é escolhido pelo PT como pré-candidato à Prefeitura de Fortaleza
Escrito por , / DIARIONORDESTE
O Diretório Municipal do Partido dos Trabalhadores (PT) definiu, neste domingo (21), o nome que irá representar a legenda na eleição para a Prefeitura de Fortaleza, que acontecerá em outubro. Com 141 votos dos delegados e 58 abstenções, o escolhido foi o deputado estadual e presidente da Assembleia Legislativa do Ceará (Alece), Evandro Leitão.
Filiado ao PT em dezembro do ano passado, após protagonizar um conflito interno na sua antiga casa, o Partido Democrático Trabalhista (PDT), Leitão venceu a chapa da ex-prefeita e deputada federal Luizianne Lins, a única que oficializou sua participação no pleito deste domingo. Minutos antes da votação, o nome da ex-prefeita foi retirado da disputa a pedido da chapa que a defendia.
Outras três chapas chegaram a ser anunciadas: a do deputado estadual Guilherme Sampaio, a da deputada estadual Larissa Gaspar e a do ex-deputado federal e assessor do Governo do Estado, Artur Bruno. Bruno e Sampaio optaram por retirar seus nomes. Gaspar, por não reunir o número mínimo de delegados, que é de 10% do quantitativo total, disse não ter conseguido oficializar sua chapa.
O evento partidário que legitimou Evandro como pré-candidato do PT aconteceu no Hotel Oasis Atlântico, na Avenida Beira-Mar, no bairro Meireles. Ele iniciou às 8h e cerca de 200 filiados participaram diretamente da eleição. Para que pudessem votar, eles tiveram que se credenciar. O processo de confirmação, que estava previsto para encerrar às 9h, acabou sendo prolongado até depois das 11h.
ACENOS E SURPRESA
Quando utilizou seu tempo de defesa perante os colegas de partido, Evandro agradeceu o apoio de lideranças do Partido dos Trabalhadores e suas respectivas chapas. Em suas palavras, elas e as demais “exerceram um papel importante” ao fortalecerem “a democracia do partido”.
“Agora estou aqui, oficialmente, após a minha filiação, me apresentando a vocês, mas quero dizer que vamos construir um projeto coletivo”, declarou. “Vou precisar do esforço, da dedicação e da experiência de cada um de vocês, por isso pedi a confiança de cada um e cada uma de vocês”, completou.
Minutos depois da escolha, ele voltou a falar sobre as chapas, desta vez para fazer um aceno a sua principal oponente, Luizianne Lins: “Quero me dirigir a você e dizer do meu carinho, do reconhecimento, do meu respeito, da sua importância não só para o estado do Ceará, mas em especial para Fortaleza”.
Leitão aproveitou a oportunidade para pedir união das correntes. “Nossos adversários não estão aqui, os outros adversários estão lá fora”, argumentou.
À reportagem, o agora oficializado pré-candidato disse que não encontrou a deputada e não sabe como houve esse entendimento para que ela desistisse da disputa. “Fui surpreendido, porque não esperava”, contou.
POLARIZAÇÃO NO DIRETÓRIO
A eleição do chefe do Legislativo estadual para o posto de pré-candidato foi precedida de uma disputa interna, protagonizada pelo seu grupo e o de Luizianne, considerados rivais no processo. O formato que o selecionou, baseado na realização de encontros e nos votos de delegados, foi uma opção para sanar a falta de consenso das correntes em torno de um nome.
A polarização entre os dois postulantes provocou declarações públicas de desagrado da ex-prefeita, que demonstrou seu incômodo com a ideia do ex-pedetista chegar nas fileiras da legenda como um eventual candidato e criticou correligionários. A parlamentar tentava retornar ao Paço Municipal pela terceira vez, após ser derrotada em 2016 e 2020.
Foram dois os encontros que definiram o nome de Evandro. O primeiro, realizado em 7 de abril, selecionou os filiados que iriam participar diretamente do processo como delegados. Depois da primeira etapa, eles se reuniram neste domingo (21), para formalizarem seus votos.
Após o primeiro momento, o cenário de predileção por Evandro Leitão já havia se formado, pois a maioria do quadro de representantes pertencia a chapas que apoiavam seu nome. Eram 118 delegados pró-Evandro contra 58 que defendiam abertamente a escolha de Luizianne.
Ambos os petistas chegaram ao evento acompanhados de apoiadores, que se manifestaram com palavras de ordem e músicas de apoio. Eles permaneceram pouco tempo no salão onde estavam reunidos os delegados e outras lideranças. Lins não concedeu entrevista.
LIDERANÇAS NO EVENTO
O evento deste domingo contou com a presença de todos os postulantes e de lideranças petistas, a exemplo dos deputados federais José Guimarães e José Airton, além dos deputados estaduais Moisés Brás, De Assis Diniz e Júlio César Filho.
A líder da oposição na Câmara Municipal de Fortaleza (CMFor), a Professora Adriana Almeida, e a secretária de Articulação Política do Governo Elmano, Augusta Brito, também estiveram no local.
Ao Diário do Nordeste, logo pela manhã, o líder do Governo Lula na Câmara dos Deputados, Guimarães, já dava certa a vitória de Evandro. Para ele, o presidente da Alece se destacava entre os demais e reunia o maior número de apoios, dentro e fora do partido.
Ele disse ainda que, superado o momento de disputa, esperava contar com apoio da ex-prefeita de Fortaleza, mas que não haveria nenhuma questão a mais se ela não aceitasse. “Se não trouxer ela, não tem problema. Eu vou lutar para trazer, mas isso faz parte. Tem a decantação, o PT é assim. Portanto, eu não me preocupo”, pontou.
Apoiadora de Luizianne, Almeida falou com os veículos de imprensa antes da votação e levantou a pauta de que sua tendência queria um “PT à esquerda”. Perguntada acerca de um caminho, caso a deputada federal não fosse a candidata escolhida, ela salientou que isso será dialogado entre os pares.
“A gente vai dialogar, mas com certeza a ideia é que a gente possa sair unido no PT. Mas, internamente, a gente vai estar colocando, até para que a gente possa defender nossas teses, que o próximo candidato venha a defender as propostas que a gente coloca”, comentou sobre a incorporação de ideias pela candidatura viabilizada.
A politização vista durante o encontro já era algo esperado por alguns dos presentes. O deputado De Assis, que fez uma leitura sobre o tema, foi um deles. “A nossa avaliação é que será um encontro bastante politizado. Haverá nesta discussão a apresentação das teses do que é a centralidade do nosso partido”, explanou.
Ele reforçou o discurso de que deve haver uma união dos grupos, a defesa dos governos petistas no Executivo federal e estadual, assim como a reunião de aliados. “O Evandro sairá daqui com o nome consolidado para fazer na sua pré-campanha a construção de um grande programa de governo”, complementou.
Guilherme Sampaio, que é presidente do Diretório Municipal do PT em Fortaleza, fez um balanço e considerou como "extremamente positivo" o resultado. "É natural que houvesse disputa, natural que houvesse divergência", refletiu, destacando a condução.
"Diante do percurso que nós fizemos até aqui, essa realização do encontro municipal e esse resultado constroem um ponto de partida muito forte para a candidautra do Evandro para a Prefeitura de Fortaleza", continuou.
Findado o momento de escolha, o dirigente partidário projetou que o próximo passo é o início da disputa com os adversários. Um trabalho de reunião das correntes será realizado. O objetivo, ele contou, é formar o "palanque mais forte" das eleições para o Executivo alencarino.
A adesão de Luizianne foi um tema posto em pauta pelo presidente municipal, que atribuiu o esforço ao pré-candidato escolhido: "Cabe agora ao Evandro a responsabilidade política de procurar a Luizianne e todas as lideranças que estiveram na campanha dela e convidá-los a se integrarem a campanha dele"
Sampaio disse ainda que a escolha da pré-candidatura está isenta de qualquer crítica que possa colocar em questão a sua legitimidade. "É importante registrar que esse processo não sofreu nenhum questionamento, de nenhuma das chapas, até o presente momento. Nenhum questionamento formal", garantiu.
DESISTÊNCIAS
O primeiro a declinar da disputa interna foi Artur Bruno, que, antes mesmo do evento começar, revelou a sua decisão. Segundo ele, o último encontro foi “decisivo”. “Os filiados do PT Fortaleza, mais de 5 mil, definiram, com a maioria expressiva, que o Evandro Leitão é o pré-candidato que tem mais apoio nas correntes internas e entre os filiados de uma maneira geral”, ressaltou.
Logo em seguida foi a vez de Sampaio, que seguiu tal caminho em prol de Leitão, seu colega de Plenário na Alece. Ele não chegou a falar com a imprensa, mas a retirada da chapa foi confirmada pela assessoria do parlamentar pouco antes do meio-dia, após discurso no evento, que acontece a portas fechadas.
Gaspar, por sua vez, que já havia dito que buscava uma unidade partidária e não descartava a ideia de retirar seu nome, não conseguiu registrar sua participação. “Não inscrevemos. Não temos os 10% do número de delegados para inscrever a chapa”, alegou a petista ao ser entrevistada.
Mais cedo, quando chegou ao evento, ela declarou que não teve a oportunidade de dialogar com Luizianne, que também encampava uma participação feminina nas urnas, mas que, para além de nomes, defendia a união do agrupamento político para haver êxito na corrida eleitoral.
A ex-prefeita sustentou seu nome até pouco antes da contagem dos votos. Entretanto, seguiu o mesmo direcionamento dos companheiros. Ao que afirmou a chapa que a representava, a decisão foi tomada por força “de algo que vai ser construído em nome da liderança do Elmano (de Freitas, governador) e do Evandro”.
QUEM É EVANDRO LEITÃO
Presidente da Alece, Evandro Sá Barreto Leitão se filiou ao PT em dezembro do ano passado, após aval do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-CE) para deixar o PDT sem perder o mandato parlamentar. Ele conseguiu se desvincular da legenda após mais de um ano de crise com a direção da agremiação.
A briga do político com a sigla se deu por defender a manutenção da aliança PDT-PT na disputa pelo comando do Governo do Ceará na eleição de 2022. Aos 57 anos, ele nasceu em Fortaleza e está no terceiro mandato consecutivo como deputado estadual (2014 até o momento).
Governo vai usar qualquer buraco que achar para gastar mais, diz José Márcio Camargo
Por Daniel Weterman / O ESTADÃO DE SP
BRASÍLIA – O arcabouço fiscal não vai se sustentar com o aumento de gastos projetado pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, afirma o economista-chefe da Genial Investimentos, José Márcio Camargo.
O analista diz que despesas como as de saúde e educação, que possuem porcentuais mínimos exigidos pela Constituição, precisam ser revistas. “É um equívoco completo corrigir saúde e educação pela receita. É impossível gerar equilíbrio fiscal com esse arcabouço”, afirma Camargo em entrevista ao Estadão.
Além disso, ele avalia que a dinâmica atual das contas públicas, sobretudo após a revisão para baixo das metas fiscais de 2025 e 2026, deve limitar a queda dos juros no Brasil. “Dado o que está acontecendo, o tamanho da desvalorização cambial e o diferencial de juros entre o Brasil e os Estados Unidos, está ficando cada vez mais provável que a queda da Selic pare antes.”
Qual sua visão sobre o Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2025?
Mudar a meta fiscal agora, menos de um ano depois de anunciado o arcabouço, mostra que o governo não tem tanto compromisso com as metas que ele próprio determinou. A reação dos mercados foi muito ruim e isso pode afetar a trajetória da Selic (taxa básica de juros). Você não precisa atingir a meta; você precisa deixar claro que está perseguindo a meta. Se na hora que você tem a primeira dificuldade você muda a meta, os agentes olham e falam: o compromisso que esse governo tem não é muito forte.
Qual seria o efeito para os juros?
Nosso cenário atual é o fim do ciclo de queda da Selic em 9,5% (ao ano), mas eu acho que está começando a ficar menos provável. Dado o que está acontecendo, o tamanho da desvalorização cambial que já aconteceu e o diferencial de juros entre o Brasil e os Estados Unidos, está ficando cada vez mais provável que a queda da Selic pare antes (em uma taxa maior).
A agenda focada em aumento de arrecadação se exauriu?
É uma agenda errada; mas, independentemente disso, acho que ela está no limite. Pode ter uma coisa ou outra a mais, mas a sociedade começa a reagir a essa ansiedade de aumentar impostos. Não importa se o Fernando Haddad (ministro da Fazenda) diz que é sobre os mais ricos; a sociedade não percebe dessa forma. Aumento de imposto é aumento de imposto. Uma das razões para a queda de popularidade do governo é exatamente esse programa de aumentar impostos para financiar aumento de gastos.
A eleição municipal e a eleição de 2026 tendem a piorar esse quadro?
O diagnóstico do governo sobre a queda de popularidade é que ele está fazendo os programas, mas a comunicação está mal feita. Eu acho esse diagnóstico equivocado. Esse governo tem uma característica curiosa que é o fato de que ele está ficando precocemente velho. Todos os programas são de governos anteriores do PT, o único novo é o arcabouço fiscal, que é exatamente esse programa de aumentar impostos para aumentar gastos. Se eles persistirem nessa trajetória, vai continuar afetando negativamente. O risco é piorar cada vez mais o cenário e a solução ser mais aumento de gastos, piorando a situação ali na frente.
O governo espera que o PIB ajude a estabilização da dívida. Isso pode acontecer?
As estatísticas e as suposições feitas no projeto da LDO são muito otimistas. Há pressupostos extremamente otimistas sobre Selic, taxa de câmbio, crescimento do PIB nominal (sem contar a inflação) e taxa de inflação. São hipóteses que, muito provavelmente, não vão se concretizar – e a dívida/PIB só vai se estabilizar lá em 2033. É muito pouco provável que você consiga estabilizar a relação dívida/PIB com esse arcabouço fiscal.
Os furos no antigo teto de gastos ensinaram o caminho para furar o novo arcabouço?
O teto durou quatro anos (antes de sofrer alterações), foi muito mais permanente. Tinha problemas, era difícil, mas conseguiu fazer uma coisa que nenhum governo pós-democratização conseguiu. O presidente Bolsonaro foi o primeiro a conseguir conter o crescimento do gasto público abaixo do crescimento do PIB. Por isso que todo mundo era contra o teto: ele era efetivo. O teto forçou o governo a fazer reformas, não dar aumento real para o salário mínimo e mudar a regra de reajuste de saúde e educação. O arcabouço destruiu uma parte desses ganhos que tivemos com o teto.
A equipe econômica está propondo uma discussão sobre os pisos de saúde e educação. É factível?
Todo mundo no governo é contra. Eu não sei por que eles mudaram isso quando aprovaram a PEC da Transição. É um equívoco completo corrigir saúde e educação pela receita. Isso significa que esses gastos vão estar sempre crescendo em termos reais (acima da inflação) mais do que a receita. É impossível gerar equilíbrio fiscal com esse arcabouço.
A Câmara aprovou uma antecipação de gasto extra este ano. Tudo indica que o governo vai usar também em 2025, mas tem uma trava na LDO condicionando à receita. Isso ajuda?
O problema foi antecipar os R$ 15,7 bilhões. A antecipação já mostra que não existe nenhum compromisso em evitar aumento de gasto. O grande problema desse governo é este: é um governo que tem por objetivo aumentar gastos e aumentar impostos para financiar o aumento de gastos. Se esse é o objetivo, qualquer buraco que o governo conseguir encontrar na legislação vai ser usado, como essa antecipação. Mesmo que seja condicionando à receita, eles vão tentar. Se chegar lá e precisar, eles mudam.
Como o sr. avalia a revisão de gastos apresentada no projeto da LDO?
É muito tímida. Eu acho que não existe muito apoio no governo para fazer revisão de gasto. É difícil fazer. Tem que diminuir gasto com determinada coisa e aumentar com outra. Quando você faz isso, afeta as pessoas que ganhavam aquele dinheiro e vão parar de ganhar. Em geral, são lobbies fortes e pesados. Não é uma tarefa fácil e está engatinhando. Eu posso estar enganado, mas não me parece que vai ter um grande sucesso.
O que precisa ser feito?
Precisa ter um programa de redução de gastos. O arcabouço criou um mecanismo de aumento de carga tributária para pagar o aumento de gastos que já estavam aprovados na PEC da Transição. Não existe nenhuma tentativa de reduzir gastos públicos. Sem reduzir, não vai conseguir gerar estabilidade na relação dívida/PIB. Tem que começar a trabalhar no lado do gasto.
A equipe econômica precisa evidenciar de forma mais efetiva a necessidade de reduzir gasto?
Eu acho que eles acreditam nisso (no programa de aumentar gastos). O Lula já falou que não quer reduzir gastos. Quando foi apresentado o arcabouço fiscal, ele disse que não vai reduzir gastos porque não quer reduzir investimentos, ponto final. Ele não quer mexer no Minha Casa, Minha Vida, não quer mexer no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
Planalto e Congresso devem prestar atenção a Haddad
O GLOBO
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, seus ministros e os parlamentares deveriam ouvir com atenção o que tem a dizer o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, para trazer um mínimo de racionalidade às medidas com impacto nas contas públicas. A mudança nas metas fiscais de 2025 e 2026, aparentemente uma concessão de Haddad, já deteriorou a credibilidade do governo. O pior que Planalto e Congresso poderiam fazer agora é acreditar que está aberta uma nova temporada de gastos sem limite.
Deputados e senadores são antenas da sociedade. É natural que verbalizem demandas dos grupos que representam. Também são legítimas as tentativas do Executivo de pôr em marcha seu programa de governo. O que não pode acontecer é um e outro adotarem medidas em favor de grupos de interesse sem lastro algum. A responsabilidade fiscal é obrigação não somente do Executivo, como Haddad costuma lembrar. A História ensina que “pautas- bombas” teimam em explodir no colo do povo. Aqueles que ainda insistem em causar dano às contas públicas precisam ser informados da realidade.
Desde o início do ano, apesar dos recordes de arrecadação e do quadro róseo pintado em gabinetes de Brasília, o dólar já subiu 8%. Embora o efeito ainda não seja sentido na inflação, o Banco Central emitiu sinais de que haverá redução no ritmo de queda dos juros. A guerra no Oriente Médio pressiona o petróleo e a inflação, levando o Fed, banco central americano, a movimento parecido. Os juros demorarão mais a cair nos Estados Unidos do que se acreditava antes. Tudo isso significa que o dinheiro ficou mais caro — e não haverá o alívio que tornaria o Brasil atraente para os investidores.
Com a aprovação do novo arcabouço fiscal, o governo Lula havia transmitido um recado de compromisso com o controle da dívida pública. Apesar dos mecanismos de contenção embutidos no arcabouço, ele deixou aberta uma brecha para mais gastos: mudar as metas. A alteração anunciada neste mês alonga o prazo para equilíbrio do endividamento. O acúmulo de despesas já leva o mercado a prever déficit de 0,8% do PIB neste ano — a meta é zero. A especulação de que o governo alterará também a meta de 2024 transmite ainda mais insegurança.
O certo teria sido um cronograma de ajuste mais curto, respeitando as regras do arcabouço que o próprio governo elaborou. Tudo aquilo de que o país não precisa são mais mudanças ou descumprimento das metas. Para evitar isso, é crucial o Congresso parar de fingir que conta com orçamento infinito. Se apostarem no aumento das despesas para prejudicar o Executivo, os congressistas acertarão os cidadãos.
Duas ideias em tramitação exigem atenção. A primeira é a absurda proposta de restaurar reajustes salariais automáticos para juízes e procuradores, a custo estimado em até R$ 42 bilhões anuais. A outra é derrubar o veto de Lula a R$ 5,6 bilhões em emendas parlamentares (as emendas subiram de R$ 7 bilhões em 2016 para mais de R$ 50 bilhões neste ano; os parlamentares não precisam de mais). Haddad tentará convencer os congressistas a abandonar essas e outras medidas que contribuem para degradar ainda mais o quadro fiscal. Diante do ambiente desafiador, o Congresso e o próprio Planalto precisam se conscientizar da importância de conter gastos e recobrar a confiança na responsabilidade do governo com as contas públicas.