STF já tem maioria para derrubar decisão de Barroso que autoriza enfermeiro a fazer aborto legal
O STF (Supremo Tribunal Federal) já tem cinco votos para rejeitar a decisão liminar do ministro Luís Roberto Barroso que autorizou nesta sexta-feira (17) que enfermeiros possam auxiliar o procedimento de aborto nos casos permitidos pela legislação.
Até o momento, votaram nesse sentido Gilmar Mendes, Cristiano Zanin, Flávio Dino, Kassio Nunes Marques, André Mendonça e Alexandre de Moraes. O julgamento ocorre em plenário virtual até a próxima sexta (24).
Na mesma decisão, Barroso suspendeu procedimentos administrativos e penais assim como processos e decisões judiciais baseados contra essas categorias.
O artigo 128 do Código Penal, que trata das exceções legais, fala em não punir médicos que fizerem aborto nos casos previstos. Assim, Barroso amplia a ressalva aos enfermeiros e técnicos.
Poucas horas depois, os ministros divergiram do relator. Apenas o decano incluiu documento de sua manifestação.
Gilmar entendeu não haver necessidade de uma liminar. Uma das razões para uma decisão do tipo éo receio de que a demora da decisão cause um dano grave, o que não seria o caso.
"Sem adentrar em quaisquer dos aspectos pertinentes à matéria de fundo, entendo que não se faz presente o periculum in mora. [...] Nesse sentido, entendo que a ausência de qualquer fato novo que justifique a atuação monocrática do Ministro Relator", disse o ministro.
Sexta-feira foi o último dia de Barroso como ministro do Supremo, já que ele antecipou sua aposentadoria.
"Em razão do déficit assistencial que torna insuficiente a proteção de mulheres e, sobretudo, de meninas vítimas de estupro, fica facultado a profissionais de enfermagem prestar auxílio ao procedimento necessário à interrupção da gestação, nos casos em que ela seja lícita", disse.
Em outro ponto da decisão, Barroso afirma que outra exigência não prevista em lei que cria barreiras à interrupção lícita da gravidez é a limitação da idade gestacional. Aqui, ele determina que o poder público não crie óbices ao aborto legal e nem exija boletim de ocorrência para atendimento de saúde.
"O Brasil ignora parâmetros científicos internacionalmente reconhecidos, mantendo uma rede pública insuficiente, desarticulada e desigual. De acordo com orientações internacionais da OMS, de 2022, o aborto é uma intervenção segura e não complexa que pode ser gerida de maneira eficaz pelo uso de medicamentos, em especial nos estágios iniciais da gestação."
"A ausência de políticas públicas que assegurem o acesso efetivo ao aborto legal obriga meninas e mulheres a suportar uma gestação forçada, configurando revitimização e sofrimento contínuo", disse.
Segundo o relator, a dificuldade de acesso ao aborto legal é uma violação à vedação da tortura e de tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes. "A mulher que, após sofrer estupro, é compelida a manter uma gravidez indesejada, experimenta uma forma de tortura psicológica."
Barroso também ressaltou a proteção às crianças, considerando que o Brasil registra, de acordo com dados citados por ele, em média, mais de 16 mil partos por ano de meninas menores de 14 anos, número que chega a 49.325 partos entre 2020 e 2022.
"O cenário brasileiro evidencia uma grave omissão estrutural do Estado na garantia do aborto lícito no Brasil, em especial a meninas, mulheres e homens transsexuais vítimas de estupro. Embora o direito esteja assegurado em lei, o acesso efetivo é limitado e desigual", afirmou.
Barroso citou dados do Cadastro Nacional de Atenção à Saúde do Ministério da Saúde, que registra 166 hospitais habilitados a realizar o aborto lícito em todo o país. Essas unidades de saúde estão em apenas 3,6% dos municípios brasileiros, mais de 40% delas no Sudeste.
Ao mesmo tempo, a manifestação do Ministério da Saúde na ação aponta que "entre 2008 e 2015 ocorreram em média 200 mil internações por ano por procedimentos relacionados ao aborto. De 2006 a 2015, foram encontrados 770 óbitos maternos como causa básica aborto". O documento registra, ainda, que a maioria das mortes maternas são evitáveis.
Também nesta sexta, ele decidiu votar na ação que descriminaliza o aborto até a 12ª semana de gestação como um de seus últimos atos na corte antes da aposentadoria. Ele acompanhou a relatora original, Rosa Weber, e se posicionou de forma favorável à legalidade do procedimento.
Na ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental) 442, que pede a descriminalização da interrupção da gestação, o ministro entendeu importante registrar os elementos principais do seu entendimento, mas de forma sintética, acompanhando o voto de Rosa Weber, mais longo e fundamentado. Como nas outras duas ações se tornou relator, precisaria organizar a decisão de forma mais detalhada.
A ADPF 1207 pede pela possibilidade de que outros profissionais de saúde, como enfermeiros, realizem o aborto legal. Já a ADPF 989 pede que o Supremo crie mecanismos para assegurar o direito à interrupção da gestação nas hipóteses já permitidas pelo Código Penal (risco à vida da gestante e gravidez por estupro) e em casos de fetos anencéfalos.
A ação ainda pedia a declaração de um estado de coisas inconstitucional pela corte, o que resultaria em um acompanhamento do tribunal no tema e definição de diretrizes. Neste ponto, o ministro não acolheu o pedido.
Lula sobe no salto e rebaixa a Presidência
Por Notas & Informações / O ESTADÃO DE SP
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva voltou a confundir sua posição de chefe de Estado e de governo com a de líder de facção política. Ao afirmar, diante do presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), que o Congresso “nunca teve o baixo nível como tem agora” e que a “extrema direita que se elegeu em 2022 é o que existe de pior”, Lula não só cometeu uma descortesia institucional, como afrontou o princípio basilar da democracia representativa: o respeito à legitimidade das urnas.
O discurso foi proferido em ambiente confortável, um evento pelo Dia dos Professores no Rio de Janeiro, diante de uma plateia simpática ao presidente da República e ao PT. Lá, à vontade entre apoiadores históricos, Lula fez o que sabe fazer melhor: transformar um ato oficial em palanque eleitoral. O antagonismo com o Congresso certamente será uma das linhas de sua campanha pela reeleição em 2026. O discurso maniqueísta está pronto: de um lado, o “povo”, que Lula diz representar; de outro, as “elites”, encarnadas nas instituições que impõem limites ao seu voluntarismo ou simplesmente não seguem a cartilha petista.
Com seus erros e acertos, o Congresso é a expressão da pluralidade social e política do País. Seus 513 deputados e 81 senadores foram eleitos pelo voto popular e gozam da mesmíssima legitimidade da qual está investido o sr. presidente da República. Nesse sentido, o Congresso não é “bom” nem “ruim” por natureza; apenas é o que é, reflexo das escolhas dos eleitores. Portanto, ao desqualificá-lo em bloco, Lula desrespeita não apenas os parlamentares que não comungam de sua ideologia, mas também os milhões de brasileiros que os elegeram.
É natural que Lula discorde de posições assumidas por parte do Congresso, sobretudo da Câmara, que, sob nova direção, tem imposto derrotas ao governo e aprovado medidas de autoproteção que soam escandalosas à opinião pública. A aprovação da chamada PEC da Blindagem, que levou milhares de cidadãos às ruas em protesto no dia 21 de setembro, é exemplo disso. Mas discordar é uma coisa, desqualificar é outra. Cabe ao chefe do Executivo se portar com a serenidade e o senso de responsabilidade que seu cargo exige, e não fomentar o descrédito em uma instituição quando esta contraria seus desejos ou não se alinha às suas visões de mundo.
A descortesia de Lula com Hugo Motta, a quem atribuiu erroneamente a presidência do Congresso – cargo que pertence ao senador Davi Alcolumbre (União-AP) –, é mais do que uma “gafe”. É um sintoma da soberba de quem parece ter se deixado inebriar pela retomada da popularidade e pela conveniência política de ter os bolsonaristas, que sofrem alta rejeição, como adversários preferenciais. A imposição de sanções políticas e econômicas ao Brasil pelos EUA tem sido explorada por Lula como a oportunidade perfeita para voltar à retórica do confronto: ele, o líder do “Brasil soberano”, contra as forças do atraso que conspiram contra o País – as quais o presidente, genericamente, empacota como “extrema direita”.
Ocupadíssimo com a campanha eleitoral, o presidente parece ter esquecido que tem um país para governar. E, para isso, não pode prescindir do Congresso. Lula governa em um regime presidencialista multipartidário, que ele conhece bem como poucos. Não é possível aprovar reformas, avançar em políticas públicas nem ao menos fingir buscar a estabilidade fiscal sem construir pontes com as forças políticas presentes no Legislativo – de todos os matizes.
O discurso do confronto institucional, além de irresponsável, isola o governo em um momento em que a economia clama por cooperação entre os Três Poderes. A agenda de equilíbrio fiscal, a reforma administrativa e a segurança pública, entre outras pautas prioritárias para o País, exigem pactos que, por óbvio, não virão dos insultos. Ao subir no salto e atacar genericamente o Congresso, Lula não enfraquece seus adversários políticos – rebaixa a própria Presidência da República.
É sintomático que Lula tenha escolhido um palanque cercado por apoiadores para expressar seu desrespeito por um Poder. Surdo pelos aplausos fáceis, deu vazão à empáfia de quem já se vê reeleito e, portanto, pode prescindir de alianças. Azar do País.
É urgente retomar território crescente em poder do crime
Por Editorial / O GLOBO
O domínio de vastas extensões do território brasileiro por facções criminosas e milícias tem se agravado. Praticamente um em cinco brasileiros (19%) diz conviver com o crime em sua vizinhança, segundo pesquisa Datafolha encomendada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP). São ao menos 28,5 milhões de cidadãos expostos ao crime organizado. No levantamento anterior, do ano passado, eram 23 milhões, ou 14% da população. Os dados refletem, no entender de Renato Sérgio de Lima, diretor-presidente do FBSP, a ampliação e o controle de territórios e mercados pelas facções.
A presença dos grupos criminosos é mais sentida em cidades com mais de 500 mil habitantes, capitais e municípios do Nordeste. O crime, diz a pesquisa, cerca tanto os moradores de baixa renda (19%) quanto os de renda mais alta (18%). Mais de um quarto (27%) da população dessas áreas afirma conhecer cemitérios clandestinos, onde são sepultados mortos que não aparecem nas estatísticas oficiais.
A pesquisa traduz a maior angústia que aflige os brasileiros. O cenário se revela em saraivadas de tiros nas guerras entre quadrilhas, na interdição de vias importantes em decorrência da violência, no fechamento constante de escolas e unidades de saúde, na cobrança de taxas ilegais, no medo que impõe mudanças de comportamento, restringindo o direito de ir e vir.
Os métodos usados até agora não têm dado resultado contra o crime organizado, a despeito dos altos investimentos em segurança. Não dão conta de facções cuja atuação ultrapassa a divisa dos estados e as fronteiras do país. Só serão combatidas com engajamento do governo federal e ação conjunta e coordenada de todas as forças da lei.
A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Segurança, que tramita no Congresso, é um primeiro passo no rumo certo. Ela amplia a participação do governo federal no combate a facções e milícias, aumenta as atribuições das polícias Federal e Rodoviária Federal, reforça o financiamento, unifica bases de dados e propõe ações integradas sob coordenação federal. A oportunidade não pode ser desperdiçada. Divergências com os estados, que temem interferência de Brasília, não podem travar projeto tão relevante. Parlamentares podem até aperfeiçoar o texto, como quer o relator, deputado Mendonça Filho (União-PE), ao vetar a progressão de regime para líderes de facções. Mas sua essência precisa ser mantida.
É fundamental também que o governo acelere o pacote antimáfia, que ganhou relevância após a operação que expôs a infiltração do crime no mercado formal, usando postos de gasolina e instituições financeiras para lavar dinheiro. As ações previstas incluem aumento de penas e atualização da legislação para tornar mais célere a investigação de organizações criminosas.
É urgente que essas propostas avancem. A situação é crítica — e se agrava a cada dia. Um levantamento do GLOBO mostrou que o Brasil tem pelo menos 64 facções criminosas espalhadas pelas 27 unidades da Federação. Cada vez mais, elas se infiltram em atividades formais. A população está assustada. A preocupação do brasileiro com segurança pública tem crescido e se consolidou como a maior de todas, bem à frente de economia e saúde, revela a última pesquisa Quaest. Quanto mais tempo governo e Congresso levarem para agir, mais difícil será retomar os territórios do crime.
Educação precisa de gestão e realismo orçamentário
O relatório do Plano Nacional de Educação para o período de 2026 a 2035, apresentado na Câmara dos Deputados na terça-feira (14), contém objetivos meritórios, mas, assim como o PNE que findou em 2024, trata a questão orçamentária de modo irrealista.
Dados a estagnação dos indicadores nacionais de aprendizagem em níveis precários na última década, algumas experiências regionais exitosas e o montante não desprezível de dinheiro público destinado ao setor, resta claro que, mais do que aumento de verbas, a melhora da qualidade exige principalmente alocação racional do que já está disponível.
O projeto do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) enviado ao Congresso Nacional previa elevar a despesa de União, Estados e municípios no ensino, hoje em torno dos 5% do PIB, para 7% até o sexto ano de vigência do plano e fantasiosos 10% até ao final. Era a mesma meta estipulada no PNE de 2014 —por óbvio não atingida, porque leis não fazem brotar dinheiro.
Na Câmara, a cifra foi reduzida para 7,5% ao final do período, com um acréscimo imaginado de 3,5% em aportes privados, totalizando 11% do PIB. Mas os 7,5% tampouco são realistas, considerando as severas restrições orçamentárias do país.
A verba pública direcionada à educação no Brasil é compatível com os padrões internacionais, o que evidencia correta prioridade atribuída a um setor essencial. Os aportes correspondem a 11% dos serviços totais do Estado, pouco acima da média da OCDE (10%), que reúne países desenvolvidos.
Ademais, deve-se considerar a transformação demográfica. A diminuição progressiva da natalidade faz e continuará fazendo com que o gasto por aluno aumente, mesmo que não haja expansão do gasto total.
O papel da modernização da gestão, com foco no aprendizado, se verifica em comparações regionais. Dados do Ministério da Educação (MEC) mostram que a taxa de alunos alfabetizados no 2º ano do ensino fundamental de São Paulo em 2024 foi de 58%, próximo da média nacional (59%), mas muito abaixo da medida no Ceará (85%), estado bem mais pobre.
O novo PNE estipula objetivo de 80% de crianças alfabetizadas nessa série até 2030 e de 100% até 2035; o anterior previa 100% no 3º ano da etapa em 2024. Das 10 metas do PNE de 2014, só 4 foram ao menos parcialmente cumpridas.
Planos de longo prazo exigem monitoramento regular para a obtenção de resultados, e a educação brasileira apresenta problemas crônicos nessa seara.
Assim, é bem-vindo o artigo que prevê que as metas do PNE sejam monitoradas pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), ligado ao MEC, com a publicação bienal dos índices de alcance por unidades da Federação.
De todo modo, as boas intenção de uma lei formulada em Brasília dependerão de boas práticas de gestão do dinheiro do contribuinte por estados e municípios.
STF julga desoneração da folha a partir desta sexta (17) depois de derrota do governo em MP de arrecadação
Ana Pompeu / FOLHA DE SP
O STF (Supremo Tribunal Federal) discute a partir desta sexta-feira (17) a prorrogação da desoneração da folha de pagamento para 17 setores da economia e municípios. O julgamento foi agendado pouco após a derrota do governo Lula (PT) com a derrubada da MP (medida provisória) que aumenta impostos.
O tema entrou na pauta do Supremo na última quarta-feira (8), quando o ministro Cristiano Zanin, relator do caso, liberou a ação para julgamento de mérito. O tema teria sido incluído no sistema da corte ainda no dia anterior, mas registrado posteriormente.
A análise está agendada para ocorrer até a próxima sexta (24), em plenário virtual, sistema eletrônico em que os ministros votam por escrito.
No início deste ano, em manifestação ao STF enviada pela AGU (Advocacia-Geral da União), o governo Lula afirmou que a prorrogação do benefício pode provocar prejuízo de R$ 20,2 bilhões aos cofres públicos em 2025 por considerar insuficientes medidas de compensação.
Assessores, advogados de setores impactados ou que frequentam a corte ouvidos pela Folha consideram difícil prever o encaminhamento do julgamento.
Dada a coincidência temporal da pauta do julgamento e do momento do Supremo em relação ao Executivo, visto como mais pró-governo, no entanto, há uma expectativa de um ambiente mais favorável ao pedido da União.
A questão em torno da desoneração pode ser considerada delicada do ponto de vista político e jurídico.
A análise poderia ser interrompida antes da conclusão por algum pedido de vista —mais tempo para análise do caso— ou de destaque, quando o caso é levado ao plenário físico. Temas de maior sensibilidade jurídica ou política costumam ser suspensos uma ou mais vezes para novas avaliações e articulações.
A discussão jurídica poderá lidar com o fato de que, no fim de 2024, após embates com o Legislativo em torno do tema, o presidente Lula (PT) sancionou a lei que mantém a desoneração da folha de pagamento.
A ação em discussão no Supremo, no entanto, é anterior a esse texto. Isso poderia resultar na chamada perda de objeto, ou seja, a lei questionada já foi superada, como apontam representantes de setores afetados.
Para a perda de objeto, a lei nova tem que ter revogado ou regulado inteiramente a matéria anterior.
O governo já havia judicializado a controvérsia ao buscar do STF aval para que se exigisse do Congresso a indicação de medidas compensatórias à desoneração.
A ação é uma iniciativa do próprio governo Lula e é assinada pelo advogado-geral da União, ministro Jorge Messias, hoje favorito para ocupar a vaga deixada por Luís Roberto Barroso na corte.
Na época, em abril de 2024, o relator, Cristiano Zanin, suspendeu trechos da lei que prorrogou a desoneração. O principal argumento da decisão foi de que a desoneração foi aprovada pelo Congresso "sem a adequada demonstração do impacto financeiro". O governo diz haver violação da LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal) e da Constituição.
Zanin considerou que, sem indicação do impacto orçamentário, poderia ocorrer "um desajuste significativo nas contas públicas e um esvaziamento do regime fiscal constitucionalizado".
O relator afirmou ainda que cabe ao Supremo ter "um controle ainda mais rígido para que as leis editadas respeitem o novo regime fiscal". Hoje, no país vigora o chamado arcabouço fiscal.
A liminar levou a reações de congressistas e de setores produtivos. Para o então presidente do Senado e também do Congresso, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), tratava-se de um "terceiro turno".
Um dos grupos beneficiados com a desoneração é o de comunicação, no qual se insere o Grupo Folha, empresa que edita a Folha. Também são contemplados os segmentos de calçados, call center, confecção e vestuário, construção civil, entre outros.
Na prática, uma decisão contrária aos contribuintes e favorável ao governo poderia fazer com que esses setores sejam reonerados de forma imediata, e não mais progressivamente conforme o acordo alcançado em 2024 —mas os ministros também podem modular a decisão, quando estipulam o marco a partir do qual ela tem validade.
Pela regra em vigor, a previsão é que o processo de reoneração gradual da folha de pagamento ocorra entre 2025 e 2027. A partir de 2028, as empresas de 17 setores da economia voltarão a pagar a contribuição sobre a folha de salários de 20% –valor cobrado atualmente das demais empresas não beneficiadas pela desoneração.
A lei questionada prorrogava o benefício até o fim de 2027 e foi aprovada pelo Congresso ainda em 2023, quando o benefício foi estendido às prefeituras. O texto foi integralmente vetado por Lula. Em dezembro, o Legislativo derrubou o veto.
Em reação, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, enviou uma MP ao Congresso, propondo a reoneração gradual da folha de pagamentos e a consequente revogação da lei promulgada após a derrubada do veto.
A medida, anunciada em 28 de dezembro de 2023, valeria a partir de 1º de abril.
O novo texto sofreu resistências do Congresso, e o governo precisou revogar o trecho da reoneração das empresas na tentativa de buscar um acordo político. Ao mesmo tempo, o Executivo enviou um projeto de lei tratando da redução gradual do benefício.
No início de abril, Pacheco desidratou ainda mais a MP e decidiu derrubar do texto o trecho que reonerava as prefeituras.
A decisão do governo de judicializar o tema ocorreu depois da constatação de que não foi possível chegar a um acordo político com os congressistas.
No início do ano, o secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Guilherme Mello, contava que o fim de parte das desonerações tributárias e a redução das compensações usadas por empresas para abater tributos poderão impulsionar a arrecadação federal em cerca de 1,5% do PIB (Produto Interno Bruto) nos próximos anos.
Para o secretário de Política Econômica, o fim desses efeitos colaboraria com o esforço de recuperação do resultado fiscal estrutural do país.
Em matéria tributária, a corte tem rejeitado pedidos com mais impacto ao caixa da União ou dos estados feito por contribuintes.
Ao mesmo tempo, o Congresso tem rejeitado as medidas fiscais apresentadas pelo governo, dentre as mais rumorosas estão as de mudanças do IOF e a MP dos impostos —que tinha expectativa de R$ 50 bilhões.
Moraes manda investigar até críticas a Dino no X e inclui funcionário da EBC que fez post elogioso
Por Weslley Galzo e Vinícius Valfré / O ESTADÃO DE SP
BRASÍLIA - O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes determinou no dia 1º de outubro que o X (antigo Twitter), Youtube, Instagram e TikTok fornecessem os dados cadastrais de 69 perfis hospedados nestas redes sociais para investigar “ameaças” ao ministro Flávio Dino. Os alvos incluem postagens críticas ao ministro e até mesmo um servidor da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) cujas publicações são, em sua maioria, de conteúdos governistas e inclui publicações favoráveis aos membros do STF.
O motivo dele ter sido incluído na investigação foi um post em tom elogioso a Dino, mas com alguns comentários de terceiros críticos ao ministro. A postagem do jornalista da EBC apresentava um recorte do voto de Dino na ação penal da trama golpista acompanhado de uma citação ao discurso do ministro: “Me espanto com alguém imaginar que alguém chega ao Supremo e vai se intimidar com um tweet”.
Em respostas à publicação, outros dois usuários comentaram “se o Bolsonaro for condenado, a situação vai ficar ainda pior” e “o ministro do Nepal pensava assim” — este último em referência ao levante popular no Nepal que destituiu o primeiro-ministro do país.
Foram as reações à publicação que colocaram o funcionário da EBC como alvo da decisão de Moraes no âmbito do inquérito das milícias digitais. Procurado, o jornalista não quis comentar. O gabinete de Moraes também não quis se manifestar.
O caso chegou ao STF a partir de um pedido do ministro Flávio Dino à Polícia Federal para investigação dos ataques a sua pessoa em rede social. No ofício enviado à PF, Dino listou cerca de 50 postagens. Entre elas estavam comentários feitos por terceiros no perfil do jornalista, mas que não eram de sua autoria.
A PF repassou o caso a Moraes. A corporação informou ao ministro que Dino “passou a ser destinatário de graves ameaças contra a sua vida e integridade física veiculadas pela internet”. A comunicação se desdobrou na investigação autorizada por Moraes como parte do inquérito das milicas digitais.
Quando decidiu pedir informações para identificar os responsáveis pelo que o próprio Dino e a PF consideram ataques, Moraes também incluiu o jornalista que se limitara a elogiar Dino.
A condução de processos sensíveis, como a ação penal da trama golpista e o inquérito das milicas digitais, vem sendo criticada por uma sucessão de erros. Como mostrou a Coluna do Estadão, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, e a defesa do réu Divanio Natal apontaram erro do ministro ao determinar a sua prisão preventiva.
O ministro decretou a prisão de Natal por romper a tornozeleira eletrônica e ficar foragido, mas o réu foi detido usando o aparelho dentro da própria casa. Gonet afirmou que a certidão enviada pela Vara de Precatórios Criminais da Comarca de Uberlândia, onde o réu se apresentava regularmente, demonstrou o cumprimento das medidas cautelares fixadas pelo STF. O gabinete de Moraes, porém, considerou que o réu cumpria as medidas na Vara de Execuções Penais de Uberlândia.
O documento também confirma as alegações da defesa, no sentido de que o réu vinha cumprindo regularmente as cautelares antes de ser preso”, afirmou Gonet, acrescentando: “Diante desse novo cenário, a prisão preventiva deve ser revogada”. Após a comunicação da PGR, Moraes retificou da decisão.
Os inquéritos e ações penais sob a alçada de Moraes envolvem dezenas de investigados e réus. Esses processos, além de ampliarem o poder do ministro, aumentam o escopo de atribuições do seu gabinete. Diferentemente de outros ações, esses casos têm movimentações frequentes e diversos pedidos da polícia, das defesas e da PGR.