Busque abaixo o que você precisa!

Arcabouço fiscal é um risco eleitoral para o governo Lula, diz André Singer

Fábio Zanini / FOLHA DE SP

 

Um dos principais estudiosos do lulismo, termo que ele cunhou, o cientista político André Singer, 65, diz que o primeiro ano do terceiro mandato do petista foi marcado por um "reformismo fraco em câmera lenta".

Na visão dele, nos dois mandatos anteriores do atual presidente (2003-10), houve um processo gradual de distribuição de renda sem provocar perdas radicais para o capital. Agora, diz, esse fenômeno está sofrendo os efeitos do arcabouço fiscal.

ANDRÉ SINGER DO PT

"O arcabouço é muito restritivo. Ele impõe uma contenção grande de gastos", diz Singer, que é filiado ao PT e exerceu os cargos de porta-voz e secretário de Imprensa no primeiro governo Lula.

Em entrevista à Folha, ele diz que o cenário de redução no crescimento pode inverter a sensação de bem-estar da população em 2024, gerando prejuízos para o governo nas eleições municipais de outubro, que podem se estender até 2026. O risco, aponta, é revitalizar a oposição de direita.

"Em anos eleitorais, os governos têm que pôr a balança para cima, no sentido de que as coisas estejam melhorando", afirma.

A ideia de um "reformismo fraco", que o sr. usou para definir os governos anteriores de Lula, se aplica ao atual?
O reformismo fraco são mudanças muito graduais, praticamente homeopáticas, que você tem dificuldade às vezes para perceber. Porém, à medida que elas se acumulam, resultam numa mudança mais expressiva. Por exemplo, [nos governos anteriores de Lula] foi ocorrendo um aumento paulatino do salário mínimo real. Cada um era pequeno, às vezes 2%, 3%, mas, no total, acabou dando 70%, o que é bastante coisa.

Essa ideia de lulismo em câmera lenta é minha com o professor Fernando Rugistky [da Universidade of the West of England]. Entendemos que o principal item da política econômica do primeiro ano foi o arcabouço fiscal, que é, na nossa análise, muito restritivo. Ele impõe uma contenção grande de gastos. Segundo cálculos do Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades da USP, se houvesse arcabouço fiscal entre 2003 e 2010, não teria sido possível fazer o que foi feito.

O arcabouço pode matar esse reformismo, ainda que fraco?
O presidente Lula, assim como fez nos dois primeiros mandatos, continua procurando brechas. O arcabouço pode anular as tentativas de reformismo? A rigor, pode. Nós não estamos dizendo que isso vai acontecer. Antes mesmo de tomar posse, o presidente negociou com o presidente da Câmara a chamada PEC da Transição. Ela assegurou os R$ 600 de Bolsa Família e acrescentou R$ 150 a mais por criança. Além disso, conseguiu recursos para dar continuidade a programas que são típicos do reformismo fraco, como o Farmácia Popular.

Há no Brasil condições para um reformismo mais intenso?
É a pergunta de US$ 1 milhão. Nem nos primeiros mandatos [de Lula] haveria correlação de forças para ir muito mais longe. Por outro lado, do ponto de vista do que o país precisa, é necessário ir mais longe. Se a gente pensar que o Brasil é um país cuja construção foi interrompida, para usar a formulação do Celso Furtado, parece claro que não atingirá o patamar da integração da metade que nunca foi integrada se não houver um reformismo mais forte. A política age dentro do que é possível, mas ela cria possibilidades à medida que convence as pessoas de determinadas coisas. E, ao fazer isso, muda a correlação de forças.

A nova política industrial é uma dessas brechas que Lula tem buscado?
Sem dúvida é uma tentativa. A minha primeira impressão é que ainda não encontrou os seus pontos de sustentação materiais. Parece um plano um pouco teórico. Há uma situação nova no mundo, em função do que vem acontecendo de 2008 para cá. Aquilo que vem sendo chamado de novo Consenso de Washington colocou a reindustrialização no centro da pauta. E isso é uma transformação importante, porque o velho consenso era muito fortemente contra políticas industriais.

Como o sr. vê hoje a relação hoje do Executivo com o Congresso?
O que está acontecendo no Congresso é difícil de entender. Possivelmente haja uma transformação que vem do [ex-presidente da Câmara] Eduardo Cunha para cá. A Câmara ganhou uma autonomia e uma força que não tinha antes. Parece que estamos diante de um processo que não dá sinal de retroceder. Junto com isso tem outra coisa que é a constituição de uma bancada de extrema direita. Isso não havia. Eu diria que hoje, a extrema direita na Câmara é um bloco importante, mas está isolada. Não é capaz de virar o jogo.

O primeiro ano de governo foi dedicado a desfazer medidas do bolsonarismo. Faltou ousadia para dar um passo além e não apenas zerar o jogo?
Eu não falaria de falta de ousadia, mas o que seria o programa que nós deveríamos desejar? É o que o [Joe] Biden está fazendo nos EUA. As situações são parecidas, o Biden assumiu depois de quatro anos do [Donald] Trump, que de certa forma tentou demolir o Estado norte-americano e, em parte, conseguiu. O governo Biden hoje representa um investimento na reconstrução da infraestrutura, na proteção social, que já vinha da época da Covid. E na reindustrialização limpa do país, com transição energética, da ordem de US$ 3 trilhões. No Brasil há uma imensa pressão daquilo que eu chamo de fração cosmopolita da burguesia, que, no último momento, decidiu apoiar o presidente Lula, e foi decisiva para que ele ganhasse. Há uma enorme pressão desse setor no sentido da austeridade. Não no sentido de não aumentar gastos do Estado, mas de diminuir.

O presidente é refém dessa burguesia cosmopolita?
Ele tem que levar em consideração essa realidade. Em países capitalistas, é muito difícil governar contra o capital. Agora, levar em consideração é uma coisa, outra é tentar pensar como se lida com isso.

O sr. vê a possibilidade de essa pressão por austeridade, representada sobretudo pelo arcabouço, gerar efeitos eleitorais negativos para Lula e a esquerda neste ano?
Vejo risco. Não estou dizendo que vai acontecer. Já existe previsão de que o crescimento este ano será metade do ano passado. Isso não é um bom sinal, porque a queda de 3% de crescimento para 1,5% representa para a população perdas. Tende a diminuir o "feel good factor" [sentimento de bem-estar]: as coisas estão melhorando e dão a esperança de que vão melhorar mais. Quando as coisas estão piorando, a pessoa tem a sensação de que vai piorar mais. Em anos eleitorais, os governos têm que pôr a balança para cima, no sentido de que as coisas estejam melhorando.

Como o sr. vê esse debate dentro do PT?
Hoje me parece que há uma certa unidade expressa pela presidente [Gleisi Hoffmann] na direção de pressionar por mais investimento público, fazer a economia crescer e dar um horizonte de reformismo, que eu chamaria de fraco, mas reformismo. O PT está fazendo o seu papel.

Isolar o ministro Fernando Haddad não é problemático para o governo?
Possivelmente tenha acontecido uma divisão de trabalho entre o presidente e o ministro da Fazenda, em que o ministro ficou encarregado de fazer as concessões que a burguesia estava exigindo e o presidente ficou encarregado de continuar buscando brechas para que mudanças a favor das camadas populares pudessem ser feitas.

Qual seria a consequência política para o ministro Haddad da mudança na meta fiscal?
Aí o problema está em analisar algo que, a meu ver, é um dos tópicos mais interessantes deste momento, o que eu chamo de fração cosmopolita do capital. Esse possível enfraquecimento do ministro da Fazenda, caso a meta seja alterada, decorreria de uma retirada da confiança da burguesia.

A burguesia é a fiadora do Haddad?
Eu não sei se ela é a fiadora do Haddad, mas o arcabouço fiscal foi feito para ela.

Como o sr. projeta o cenário eleitoral para 2026?
inelegibilidade do Bolsonaro é o fator mais relevante dos acontecimentos políticos de 2023. Os EUA não conseguiram fazer isso e estão às voltas com o possível retorno do Trump. Essa decisão desorganizou o campo liderado pela extrema direita, criou uma espécie de vácuo. Procurar alguém no lugar dele não é simples, em parte porque ele construiu um carisma. Para certos setores de classe média ele é repulsivo, mas o Bolsonaro dialoga com as camadas populares, o que é difícil fazer. Acho provável que a oposição ao atual governo tenha condição de competitividade. Mas no regime presidencialista e num sistema político em que os partidos, com exceção do PT, são fracos, a figura do candidato é central. Então quem poderá articular um bloco competitivo?

E no centro, o sr. vê alguma possibilidade?
O caso do PSDB é do maior interesse. Houve um deslocamento da base do partido para a extrema direita. As pessoas queriam uma oposição mais radicalizada. A pergunta que eu faço é se essa base voltou mais para o centro. Não sei.

Há alguma possibilidade de o Lula entrar em parte desse eleitorado que hoje está com a direita?
Vai depender muito da economia. Há um eleitorado em disputa nas grandes regiões metropolitanas, que é o de 2 a 5 salários mínimos de renda familiar mensal. Está dividido, foi majoritariamente para o Bolsonaro na eleição de 2022, mas não era uma diferença enorme. O que esse eleitorado quer? Bons empregos e renda. Uma parte desses trabalhadores está precarizada. Digamos que o Brasil entrasse num período de crescimento forte. Provavelmente o presidente Lula atrairia uma parte desses eleitores, e a própria gravidade eleitoral faria com que determinadas organizações, por exemplo, setores evangélicos, viessem [para ele].

A economia ainda é o que define eleições? Não os valores, como muitos defendem atualmente?
No caso brasileiro, sim. Eu reconheço que muita coisa mudou, não há dúvida que o tipo de aliança que o Bolsonaro fez com os evangélicos a partir de 2018 tem um peso. A questão de valores e a questão identitária são componentes que têm que ser levados em consideração. Mas eu continuo achando que no caso brasileiro a economia é mais central.

O sr. vê possibilidade de mudança de rota pelo governo em 2024?
Não vejo sinais de uma inflexão do presidente Lula com relação a 2023. Não quero me comprometer com uma avaliação pessimista, porque tem muitos elementos em jogo. Mas há um risco, que é dado pela natureza do arcabouço. Eu sinto que o presidente, por ora, prefere correr esse risco e talvez esteja apostando em outros elementos, como possíveis aberturas internacionais. Ele abriu essa janela ao dizer que o déficit não precisa ser zero. Ou seja, está dizendo: "se as apostas que eu estou fazendo não derem certo e houver um enxugamento de tal ordem que vai inviabilizar o meu governo, eu não posso aceitar".


RAIO-X | ANDRÉ SINGER, 65

Professor titular do Departamento de Ciência Política da USP, é graduado em jornalismo e ciências sociais pela USP, tem mestrado, doutorado e livre-docência em ciência política pela mesma universidade. Foi secretário de Redação da Folha, porta-voz da campanha de Lula em 2002, secretário de Imprensa e porta-voz no primeiro governo Lula. É autor de "Esquerda e Direita no Eleitorado Brasileiro" (2002), "Os Sentidos do Lulismo" (2012), "As Contradições do Lulismo" (2015), "O Lulismo em Crise" (2018).

Lula planta pé de oliveira em embaixada e pergunta quando nascem as uvas;

Por Gabriel de Sousa / O ESTADÃO DE SP

 

BRASÍLIA - Enquanto plantava uma oliveira na Embaixada da Palestina em Brasília na última semana, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) perguntou para o embaixador palestino Ibrahim Alzeben quanto tempo demoraria para poder nascer uvas. A árvore, porém, dá azeitonas

 

Durante a cerimônia, o embaixador disse que Lula estava “plantando esperança para o povo palestino”. Após terminar o plantio, Lula perguntou a Alzeben quanto tempo demoraria para dar uma uva, se corrigindo logo depois. “Vou voltar aqui... quanto tempo demora para dar uma uva... azeitona”. Alzeben respondeu que levaria oito anos até que a planta desse frutos.

O encontro na Embaixada da Palestina ocorreu no último dia 9, mas a gafe de Lula viralizou nas redes sociais apenas nesta sexta-feira, 16, através de perfis de oposição ao petista.

 

Além de Lula e o embaixador palestino, o evento também contou com a participação da primeira-dama, Janja da Silva, e o vice-presidente Geraldo Alckmin. Além deles, estavam Celso Amorim, que é o principal conselheiro do presidente em questões internacionais, e os ministros Mauro Vieira (Relações Exteriores), Fernando Haddad (Fazenda), Ricardo Lewandowski (Justiça) e Paulo Pimenta (Secretaria de Comunicação Social).

 

A oliveira é uma árvore com um forte valor simbólico para as três grandes religiões monoteístas. Os islâmicos a consideram a “árvore da vida”. Para os cristãos, ela está relacionada com os sentimentos de esperança e reconciliação. Os judeus, por sua vez, associam a planta com o Monte das Oliveiras, local sagrado frequentado por profetas.

 

Desde que assumiu o seu terceiro mandato no Planalto, Lula cometeu outras gafes durante cerimônias. Em maio do ano passado, ele afirmou que o regime do ditador da VenezuelaNicolás Maduroé alvo de “narrativas” e que o conceito de democracia é “relativo”.

 

Em julho do ano passado, ele agradeceu à África “por tudo o que foi produzido pelos 350 anos de escravidão” ao lado do presidente de Cabo Verde.

Em setembro, quando realizou uma cirurgia o quadril, o presidente foi criticado por ter relacionado beleza a não uso de equipamentos como muleta e andador durante uma transmissão do Conversa com o Presidente, antiga live semanal produzida pela Empresa Brasil de Comunicação (EBC).

 

Lula disse que gesto foi ‘em nome da paz’ na Palestina

De acordo com Lula, o gesto foi “em nome da paz e da esperança para o povo palestino”. A Faixa de Gaza, que faz parte da Palestina, é palco de uma guerra entre Israel e o grupo terrorista Hamas desde outubro do ano passado.

 

Desde o início do conflito, o petista critica Israel pela intensidade dos ataques feitos pelo Exército do país. A guerra foi desencadeada após o grupo extremista realizar um ataque terrorista que deixou 1,2 mil israelenses mortos.

 

Durante uma entrevista cedida para um veículo de comunicação egípcio nesta quinta-feira, 15, Lula disse que Israel mata mulheres e crianças a “pretexto de derrotar o Hamas”. O presidente também disse que a resposta israelense ao ataque terrorista de outubro “não tem nenhuma explicação”.

 

“O Brasil foi um país que condenou de forma veemente a posição do Hamas no ataque de Israel e ao sequestro de centenas de pessoas. Nós condenamos e chamamos o ato de ato terrorista. Mas não tem nenhuma explicação o comportamento de Israel, a pretexto de derrotar o Hamas, estar matando mulheres e crianças, coisa jamais vista em qualquer guerra que eu tenha conhecimento”, disse Lula.

Ceará recebe máximo de água da Transposição do São Francisco a partir desta sexta-feira (16)

Renato Bezerra / DIARIONORDESTE

 

Em razão do prognóstico de chuvas abaixo da média este ano, o Ceará receberáa partir desta sexta-feira (16), o máximo de água disponível pelo Projeto de Integração do Rio São Francisco. O anúncio foi feito pelo governador Elmano de Freitas (PT), pelas redes sociais, após ter a solicitação de liberação da água aceita pelo Ministério da Integração e Desenvolvimento Regional (MIDR). 

Conforme Elmano de Freitas, a água será liberada na vazão de 6,5 metros cúbicos (m³) por segundo, do município de Jati em direção ao açude Castanhão.

Em razão do prognóstico de chuvas abaixo da média este ano, o Ceará receberáa partir desta sexta-feira (16), o máximo de água disponível pelo Projeto de Integração do Rio São Francisco. O anúncio foi feito pelo governador Elmano de Freitas (PT), pelas redes sociais, após ter a solicitação de liberação da água aceita pelo Ministério da Integração e Desenvolvimento Regional (MIDR). 

Conforme Elmano de Freitas, a água será liberada na vazão de 6,5 metros cúbicos (m³) por segundo, do município de Jati em direção ao açude Castanhão.

"A medida neste momento é estratégica diante das chuvas registradas nos últimos dias. Com o solo úmido e a presença de água corrente no percurso até o Castanhão, são reduzidas as infiltrações e, com isso, o desperdício de água", destacou Elmano. 

Ainda segundo o governador, deve ser feita uma avaliação técnica constante para fazer o controle eficiente da liberação de água da Transposição conforme os níveis de chuva, priorizando, assim, o máximo de recarga do Castanhão com o mínimo de desperdício de água no trajeto. 

ESCASSEZ HÍDRICA

O ofício enviado ao MIDR data do último dia 2 de fevereiro, destacando o prognóstico climático da Fundação Cearense de Meteorologia (Funceme) para 2024, que aponta 45% de probabilidade de chuvas abaixo da média histórica nos meses de fevereiro a abril. 

Conforme descrito no documento, diante da iminência de uma possível crise hídrica, "faz-se crucial a implementação de medidas preventivas e emergenciais, visando minimizar os impactos sobre a população e economia local". 

"Agradeço ao ministro Waldez Góes e ao presidente Lula pelo compromisso em atender, prontamente, essa importante medida que visa minimizar os efeitos da escassez hídrica para os cearenses. Continuaremos trabalhando na implementação de ações preventivas e emergenciais para a convivência com a estiagem em nosso estado", escreveu Elmano de Freitas, após ter o pedido atendido. 

BARRAGEM DE JATI

Investimento externo cai, o que preocupa

O Brasil atraiu US$ 62 bilhões em investimentos estrangeiros diretos em 2023, 17% a menos que no ano anterior, segundo dados recém-divulgados. Seria prematuro concluir que o país se tornou menos atrativo, mas o sinal não deixa de ser preocupante diante de um quadro global ainda pouco favorável.

Segundo dados da Unctad, agência das Nações Unidas para comércio e desenvolvimento, os investimentos diretos —fusões, aquisições, novas instalações, reinvestimento de lucros e outras operações voltadas à atividade produtiva— entre países cresceram 3% no ano passado, para US$ 1,37 trilhão.

À primeira vista, o resultado parece positivo diante de tensões geopolíticas em alta e também dos riscos até agora não confirmados de recessão global. A abertura dos números, porém, mostra uma situação menos confortável.

Descontado o aumento em países europeus usados mais como intermediários de transações, como Holanda e Luxemburgo, o resultado é uma queda de 18%.

Todas as principais regiões mostraram menos vigor, porém chama a atenção a piora relativa da União Europeia, com recuo de 23%, e de países em desenvolvimento, que atraíram 9% a menos.

Mas nota-se no mundo maior foco em áreas que são objeto de intervenções governamentais motivadas pela busca de mais segurança nas cadeias de produção. Setores manufatureiros, como automóveis, maquinário, telecomunicações, eletrônica e química, tiveram aumento no número de projetos.

No setor manufatureiro, houve alta de 38% no valor de novas iniciativas anunciadas, ante queda de 45% e 8% nos setores primário e de serviços, respectivamente.

Espera-se que em 2024 haja alguma elevação geral nos fluxos, conforme avance a estabilização da inflação e os principais bancos centrais tenham espaço para redução de juros, o que pode viabilizar a abertura de um novo ciclo global de crescimento.

O redesenho das cadeias globais de produção e valor deve favorecer nações distantes de conflitos geopolíticos e que tenham densidade produtiva suficiente. A China atrai hoje menos aportes, ao passo que os Estados Unidos buscam um renascimento industrial.

É nesse contexto que o Brasil precisa se firmar como destino atraente. Concluir a reforma dos impostos, que aproxima o país do padrão global de tributação de bens e serviços, é só o primeiro passo.

Atrair investimentos não apenas para servir o mercado interno, mas para se encaixar na geografia mundial da produção, é o meio mais eficaz de fazer avançar a produtividade e a renda.

O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.

Prioridade errada

Por Notas & Informações / O ESTADÃO DE SP

 

 

A educação pública brasileira costuma ser um terreno fértil de erros e inversão de prioridades que geram atrasos e desigualdades, impondo um horizonte sombrio para milhões de crianças e jovens. O estudo divulgado recentemente pela Secretaria do Tesouro Nacional (Despesas por Função do Governo Geral) reafirmou em números um desses equívocos. Mapeando dados consolidados até 2022, constata-se que, no ensino superior, o Brasil exibe gasto no padrão de países ricos, enquanto fica aquém em etapas da educação básica como o ensino fundamental 2 e o ensino médio. Não difere muito nas despesas com educação infantil e fundamental 1, mas no conjunto de despesas gerais com a educação (4,49% do Produto Interno Bruto – PIB) o País fica abaixo de vizinhos da América Latina e de economias avançadas.

 

É importante notar, de acordo com o estudo, que o Brasil vinha ampliando sistematicamente o volume de despesas com educação entre 2010 e 2019 – de R$ 397 bilhões para R$ 520 bilhões no período, ainda que proporcionalmente em relação ao PIB tenha sido verificada uma certa estabilidade entre 2011 e 2018. Entre 2019 e 2021, no entanto, iniciou-se um período de redução e, nela, a educação básica foi especialmente atingida, graças à pandemia de covid-19 e à retração que se verificou tanto nos governos estaduais e municipais quanto em nível federal. O ano de 2022 inverteu a trajetória decrescente.

 

Essa curva não inverte o essencial: em matéria educacional, o Brasil tem um sistema de transferência de renda e geração de oportunidade às avessas, distorção que já vem sendo apontada há bastante tempo por especialistas. Enquanto a uma esmagadora maioria pobre se oferta um péssimo ensino básico público, a minoria rica tem a seu dispor boas universidades públicas e gratuitas. Existe padrão internacional nas escolas privadas, não faltam magníficas exceções entre as escolas públicas da educação básica e há trágicos exemplos de má qualidade entre universidades públicas, mas o retrato geral é desabonador, completado e aprofundado pela defasagem do ensino técnico e profissionalizante.

 

Isso significa estar na contramão do que ensinam boas práticas apontadas pela literatura especializada. A lição internacional indica dois pilares essenciais: prioridade para a educação básica e a qualificação de professores. No abecedário dos erros do Brasil, falha-se em ambos.

 

Em setembro do ano passado, o relatório Education at a Glance, da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), mostrou que desde 2010 o Brasil investe menos de um terço do que os países ricos para cada aluno da educação básica pública: US$ 3.583 por aluno/ano, enquanto a média entre as nações desenvolvidas é de US$ 10.949. Em contrapartida, o Brasil investe no ensino superior público quase US$ 14.800 ao ano por aluno, o mesmo valor da média da OCDE, além de ter um dos menores porcentuais de estudantes matriculados na educação profissional, considerando os 45 países analisados. Um ano antes, o Anuário Brasileiro da Educação Básica já apontava tendências similares.

 

Esse pode ser um recado particularmente útil para o presidente Lula da Silva. As primeiras gestões lulopetistas dedicaram especial atenção à ampliação de vagas no ensino superior, tanto pela abertura de novas universidades públicas federais quanto pelos incentivos às universidades particulares por meio de mecanismos como o Prouni. Lula e o PT se mostram garbosos até hoje ao falar dos números exuberantes das gestões anteriores, entre novos campi universitários (181), novas universidades federais (18) e os chamados institutos federais (422). Obras e prioridades que jamais se converterão em mudança efetiva para a vida de crianças e adolescentes diante de uma educação básica que fracassa em quantidade e qualidade, na atração de recursos e na gestão.

 

Enquanto alunos de escolas privadas têm desempenho similar ao dos norte-americanos, a esmagadora maioria que vem da escola pública ingressa na vida profissional só com as frágeis ferramentas do ensino básico. Tal descompasso não é uma imposição do destino, e sim o resultado de más escolhas públicas.

Alta na dívida pública é preocupante

Por Editorial / O GLOBO

 

Um item das finanças públicas deveria interessar a todo cidadão: a dívida bruta do governo geral, que inclui governo federal, INSS, governos estaduais e municipais. Medido como proporção do PIB, esse número indica o peso do endividamento público e traduz seus principais efeitos negativos, em particular o volume de recursos necessários para pagar juros. Para pagar o que deve, o governo tem dois caminhos: gerar resultado fiscal positivo ou tomar mais dinheiro emprestado no mercado, pagando juros mais altos para isso. Com a sucessão de déficits fiscais nos últimos anos, o endividamento tem atingido patamares a cada dia mais preocupantes.

 

O Banco Central divulgou na quarta-feira o número para 2023. Com um aumento de 2,7 pontos percentuais em relação ao ano anterior, a dívida bruta alcançou 74,3% do PIB, ou R$ 8,1 trilhões — quase R$ 40 mil por brasileiro. É um resultado bem acima do considerado razoável para países emergentes com as características do Brasil.

 

É preciso reconhecer que existem vários senões sobre o salto registrado entre 2022 e 2023. De certa forma, o último ano do governo Jair Bolsonaro foi atípico. O BNDES pagou antecipadamente R$ 83,2 bilhões em dívidas que tinha com o Tesouro Nacional, e a inflação mais alta ajudou a elevar o PIB, o denominador no cálculo do endividamento, contribuindo para reduzi-lo. Ainda assim, o resultado é motivo de inquietação e reforça a necessidade, reiterada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, de buscar equilíbrio nas contas públicas.

O déficit do governo foi de R$ 230 bilhões em 2023, ante superávit de R$ 46 bilhões em 2022 — piora fiscal de R$ 276 bilhões, aproximadamente os 2,7% do PIB adicionados à dívida. O governo atribui, com razão, grande parte dessa piora à gestão anterior, que legou as obrigações de compensar estados e municípios pela redução do ICMS e de zerar as dívidas sem possibilidade de recurso na Justiça, os precatórios. Mesmo com ajustes, a piora fiscal foi da ordem de 1,2% do PIB.

 

A situação fiscal permanece inalterada: as contas públicas fecharam o ano no vermelho, e a dívida cresceu. Haddad tem dado repetidas provas de estar atento ao problema. Conseguiu aprovar no Congresso um novo marco de controle fiscal e diversas medidas para aumentar a arrecadação. Dentro do governo, tem resistido e mantido a meta de zerar o déficit em 2024. Isso é fundamental para manter a credibilidade. “Se o governo não conseguir cumprir a meta no primeiro ano, a distância para o ano seguinte vai aumentar”, diz o economista Manoel Pires, coordenador do Observatório de Política Fiscal do Ibre/FGV.

 

Nos próximos meses, é até possível que as receitas adicionais resultantes das medidas tributárias surpreendam e fiquem acima do previsto. Mas isso não deveria servir para escamotear o problema: a resistência do governo a controlar despesas. Cardeais do PT teimam em contradizer todo o conhecimento acumulado no Brasil e no mundo, criticando sistematicamente a austeridade por reduzir o crescimento da economia. Todas as evidências mostram que, sem equilíbrio fiscal, não há confiança. E, sem confiança, não há investimento, condição necessária para o crescimento do PIB (e redução do endividamento). Para avaliar o desempenho da gestão petista na economia, será preciso acompanhar com atenção a trajetória da dívida bruta.

Governo não pode ser hospital de empresas

Está aberta a temporada de pedidos de socorro ao governo federal por parte de setores empresariais diversos. Os demandantes se queixam de dificuldades causadas por fatores em tese externos a sua atividade, de oscilações de custos e receitas ou, em escala menor, de problemas regulatórios.

A agropecuária reclama de perdas de safras devido a eventos climáticos, da baixa do preço de grãos, do custo de produção e, pois, da dificuldade de honrar o pagamento de dívidas, com os bancos estatais em especial.

Reivindica-se a renegociação desses compromissos e instrumentos de garantia de preços mínimos e compra de estoques pelo governo federal, além de mais subsídio para seguros. O Ministério da Agricultura afirma que, até março, haverá um pacote para o setor, que dispõe de uma bancada poderosa instalada no Congresso.

Também na fila, as companhias aéreas apontam custos altos, em particular dos combustíveis, crédito caro e até excesso de judicialização devido a demandas de passageiros —que, no entanto, pesam apenas 1% em suas despesas.

O pedido de recuperação judicial da Gol nos Estados Unidos impulsionou o pleito pela baixa do preço do querosene —até com questionamento de um monopólio da Petrobras— e por financiamento barato do BNDES, o banco oficial de fomento. Especula-se sobre socorro direto do Tesouro Nacional.

O Ministério de Portos e Aeroportos prevê que, até o fim de fevereiro, haverá um plano de ajuda. Fala-se em um fundo de até R$ 6 bilhões para crédito, entre outros benefícios também reivindicados por pilotos, comissários de bordo e outros trabalhadores do setor.

Já a pasta da Fazenda afirma que não haverá recursos do Tesouro e que estuda um programa de "reestruturação", de formatação ainda obscura. O BNDES pode ofertar crédito, mas quer garantias, que dependem de mudança legal.

A velha ideia do governo como hospital de empresas está de volta, como se vê. Trata-se, como sempre, de um risco para o erário e para a economia como um todo.

Em casos extremos, como foi a pandemia de Covid-19, pode-se considerar um auxílio estritamente temporário e sujeito a avaliação de custos e vantagens para a sociedade. No mais, contudo, o pleito é ou iníquo ou inviável.

Não é possível bancar todos os socorros ou, ainda que a ajuda pudesse ser extensa, a providência seria deletéria para o funcionamento do mercado, com efeitos daninhos para a eficiência. Empresas não raro se tornam dependentes do Estado e mobilizam lobbies pela perpetuação do privilégio.

O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.

Lula diz que papel do Estado não é atender megaempresários que 'só servem para pedir bilhões'

Italo NogueiraCamila Zarur / FOLHA DE SP

 

O presidente Lula (PT) disse que o papel do Estado é atender à população pobre do Brasil, e não megaempresários que "só servem para pedir bilhões". Em evento no Rio de Janeiro, o chefe do Planalto fez um paralelo entre pessoas de baixa renda que compram fiado —isto é, pagam depois— e ricos que pedem empréstimos ao BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) .

"O pobre é o seguinte: quando ele compra o pão e o leite fiado e ele não pode pagar, ele para de passar na frente da padaria. Ele tem medo de falarem que está devendo", disse Lula, que completou:

"O rico, não. O rico gosta de dizer que está devendo. Para ele é uma coisa charmosa de dizer: ‘eu peguei R$ 5 bilhões do BNDES, juros de longo prazo, cinco anos de carência e vou pagar em 15 anos’."

As declarações do presidente vão em sentido contrário ao programa anunciado por ele próprio, no início de janeiro, para impulsionar a indústria. Batizado de Nova Indústria Brasil, o plano prevê incentivos e empréstimos, inclusive do BNDES, para o desenvolvimento do setor nacional.

No programa, O BNDES vai gerenciar R$ 250 bilhões em projetos focados em produtividade, inovação, digitalização e descarbornização na indústria nacional. Economistas, porém, apontam que o plano pode inchar o banco de desenvolvimento.

Lula participou, nesta quarta-feira (7), da inauguração da escola municipal que ficará no lugar da antiga Arena 3, no Parque Olímpico, zona oeste do Rio. Em seu discurso, o presidente voltou a defender que a prioridade do governo é a população de baixa renda.

"Tem gente que não precisa do Estado, mas tem muita gente que precisa e é para essa gente que o Estado precisa existir. [...] O Estado tem obrigação de garantir oportunidade para que todas as pessoas possam vencer na vida. Esse é o papel do Estado. Não é para atender megaempresários, que cada vez que vão à presidência só servem para pedir bilhões, bilhões e bilhões", enfatizou Lula.

INVESTIMENTOS DO NOVO PAC

O evento no Rio inaugurou o Ginásio Educacional Olímpico Isabel Salgado, cujo nome é uma homenagem à jogadora e treinadora de vôlei homônima que morreu em 2022 em decorrência de uma síndrome aguda respiratória. A atleta foi homenageada no evento e citada por Lula em seu discurso.

O presidente também lançou a pedra fundamental do que será o campus Parque Olímpico/Cidade de Deus do IFRJ (Instituto Federal do Rio de Janeiro). Ele ficará onde era a Arena 2. Para a construção do espaço, serão investidos R$ 15 milhões.

À tarde, Lula também anunciará o início da construção do campus do IFRJ no Complexo do Alemão, na zona norte do Rio. O investimento também será de R$ 15 milhões, oriundos do Ministério da Educação. Os terrenos para os centros de ensino técnicos foram cedidos pela prefeitura do Rio.

Na terça-feira (6), o presidente também anunciou que vai fazer campus do IFRJ em Belford Roxo, Magé, São Gonçalo e Teresópolis.

Os recursos das obras estão previstos no novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), que prevê uma verba de R$ 3,9 bilhões para a construção de 100 unidades dos institutos federais.

"Eu queria que houvesse a compreensão dos setores mais altos da sociedade de compreender que o que a gente está fazendo é tentar elevar a classe brasileira, a sociedade brasileira, a subir um degrau da escala social. Ninguém gosta de ser pobre", disse Lula nesta quarta.

O presidente está no Rio de Janeiro desde terça-feira. No primeiro dia de sua visita ao Rio, Lula optou por agendas em Magé e Belford Roxo, cidades da Baixada Fluminense que são redutos bolsonaristas com uma grande parcela da população evangélica.

No primeiro evento, Lula trocou afagos com o governador do Rio, Cláudio Castro (PL), aliado do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) —repetindo a estratégia que fez na semana passada, quando também fez acenas a outro governador próximo do ex-mandatário, Tarcísio de Freitas (Republicanos), de São Paulo.

Já na segunda agenda, em Belford Roxo, o petista deixou de lado sua promessa de cessar os ataques ao antecessor e chamou Bolsonaro de maluco, aloprado e ignorante

Governo vai à AGU para atacar precatórios na origem e evitar ‘chuva de meteoros’; metade vem do INSS

Por Bianca Lima e Anna Carolina Papp / o estadão de sp

 

O governo colocou em curso um plano de ação para tentar deter a “bola de neve” dos precatórios, que representam custos bilionários exponenciais aos cofres públicos. 

Ministério do Planejamento e Orçamento vai enviar à Advocacia-Geral da União (AGU), nos próximos dias, um levantamento sobre as principais causas dessas dívidas judiciais. O objetivo é atuar de forma preventiva, atacar o problema na origem e evitar a formação desse passivo anos à frente, a custos muito mais elevados.

 

“Não é que teve um meteoro; a gente está em uma chuva de meteoros”, disse ao Estadão o secretário-executivo da pasta, Gustavo Guimarães, em referência à expressão usada em 2021 pelo então ministro da Economia de Bolsonaro, Paulo Guedes. À época, ele afirmou que um meteoro de R$ 89 bilhões em precatórios iria colidir com as contas públicas – o que levou à criação da chamada “PEC do Calote”, que “pedalou” o pagamento dessas dívidas.

 

Apesar de o governo Lula ter aberto um crédito extraordinário de R$ 93,1 bilhões para quitar esse estoque, amparado em uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), Guimarães pontua que a medida resolve o passado, mas não o futuro, dada a trajetória exponencial dessas obrigações (veja gráfico abaixo) – o que, para ele, reflete falhas em políticas públicas que precisam de correção de rota.

 

“Precatório deveria ser exceção. Ele nasce de política pública, de alguma atuação ativa equivocada do Estado ou passiva, em que não atuou como deveria atuar. Quanto mais aumenta precatório, maior é o sinal de que as coisas não estão funcionando”, diz o secretário.

 

Na prática, a decisão do STF deu um prazo para Executivo e Legislativo encontrarem uma forma de encaixar os precatórios dentro do Orçamento. Isso porque, a partir de 2027, o governo não poderá mais pagar parte dessas dívidas fora do limite de despesas, como ocorre atualmente.

 

O primeiro passo, segundo Guimarães, é agir de forma preventiva e tentar reduzir esse passivo por meio do mapeamento das causas, de modo a reduzir a formação de novos precatórios. “Temos de transformar o meteoro em meteorito”, afirma.

 

O segundo estágio será discutir as regras que valerão a partir de 2027. “Ou a gente traz os precatórios para dentro do ‘tetinho’, o que já tava previsto, ou teremos de pensar em alguma forma de acomodar esses valores. Por isso que temos de atuar para que os passivos sejam os menores possíveis, para que não seja necessário excepcionalizar da regra fiscal”, diz.

 

No ano passado, o Ministério da Fazenda chegou a pedir ao STF autorização para classificar os juros dos precatórios como despesa financeira, ou seja, sem contabilizar no resultado primário (saldo entre receitas e despesas, sem contar os juros da dívida) – o qual é levado em conta para o cálculo da meta fiscal.

 

A proposta, criticada por especialistas em contas públicas, não foi chancelada na decisão do STF – e, por ora, está descartada pela equipe econômica, segundo apurou o Estadão com interlocutores do governo.

 

Previdência gera maior parte dos precatórios

Num primeiro levantamento, o Planejamento detectou que quase metade das dívidas judiciais da União tem origem previdenciária. Em 2022, último dado fechado com recorte setorial, dos R$ 58,7 bilhões pagos pelo Tesouro em precatórios e Requisições de Pequeno Valor (as chamadas RPVs, que englobam sentenças de até 60 salários mínimos), R$ 28 bilhões foram referentes à Previdência, sendo R$ 22 bilhões de urbana e R$ 6 bilhões de rural.

 

Na sequência, aparecem as dívidas referentes a custeio e capital, com R$ 17 bilhões, seguidas de pessoal e encargos (R$ 11 bilhões) e Benefício de Prestação Continuada (R$ 2 bilhões).

Os dados serão encaminhados ao Conselho de Acompanhamento e Monitoramento de Riscos Fiscais Judiciais, presidido pelo ministro da AGU, Jorge Messias, e integrado pela ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, e da Fazenda, Fernando Haddad.

 

A ação também contará com órgãos vinculados, como a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) e a Procuradoria-Geral da União (PGU). “A gente está querendo fundir a inteligência jurídica judicial com a inteligência econômica”, diz o secretário.

 

O próximo passo será esmiuçar os benefícios que concentram o maior nível de judicialização dentro desses grandes grupos identificados pelo Planejamento – tarefa para a qual a AGU poderá usar a inteligência artificial.

 

Com isso mapeado, o conselho vai avaliar se é o caso de alterar algum normativo que tem gerado derrotas seguidas ao governo, ou então propor ao Congresso a alteração de legislações que têm dividido o Judiciário e gerado prejuízo aos cofres públicos. Para 2024, a dotação prevista no Orçamento para pagamento de sentenças judiciais (precatórios e RPVs) é de R$ 54,5 bilhões.

 

Brasil tem ‘pior dos mundos’

Guimarães classifica o cenário atual como “o pior dos mundos”. De um lado, diz ele, o contribuinte deixa de receber o benefício no momento certo; de outro, após a sentença judicial, o governo tem um gasto muito maior, pois tem de pagar o valor corrigido proveniente de decisões que muitas vezes se arrastam por anos.

 

Dados do Planejamento, referentes a 2022, apontam, para fins comparativos, que os pagamentos de precatórios já são equivalentes a 3,3% da despesa primária total da União e a 38,6% da despesa discricionária, aquela que não é obrigatória e engloba investimentos e custeio da máquina pública. Em 2014, esses porcentuais eram, respectivamente, de 1,9% e 13,3% – o que evidencia o forte crescimento.

 

Já pela ótica dos beneficiários, os números mostram que 99,8% dos precatórios têm valor de até R$ 10 milhões. Em valores, essa faixa representa 54,75% do total de precatórios (veja gráfico abaixo). “Isso ratifica a ideia de que estamos beneficiando a maior parte da população, que deveria ter recebido o pagamento. Ainda mais se atuarmos para que isso não vire precatório e a pessoa receba no âmbito da política pública”, diz Guimarães.

 

Chefe da Abin de Lula manteve em cargos-chaves servidores suspeitos de ligação com programa de monitoramento de celulares

Por  e Sarah Teófilo— Brasília / o globo

 

O diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Luiz Fernando Corrêa, manteve em cargos-chaves três servidores suspeitos de terem ligação com o programa espião FirstMile, usado para monitorar desafetos políticos do governo de Jair Bolsonaro entre 2019 e 2021. Esses integrantes do órgão só foram afastados por determinação do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), sob risco de atrapalharem as investigações em andamento.

 

Reportagem do GLOBO revelou em março do ano passado que a Abin usava uma ferramenta secreta israelense para vigiar a localização de alvos pré-determinados por meio da conexão dos aparelhos celulares. Após o caso vir à tona, a Polícia Federal (PF) abriu um inquérito e identificou que o sistema espião foi utilizado para monitorar políticos, jornalistas, advogados e adversários de Bolsonaro.

 

Mesmo com as suspeitas e colaborando com as investigações, Corrêa manteve na agência servidores que tiveram relação com o programa FirstMile. Um deles era Paulo Maurício Fortunato Pinto, que foi nomeado como número 3 da agência em abril do ano passado e esteve à frente do setor de operações da Abin no governo Bolsonaro. A área era responsável por utilizar o programa secreto para realizar vigilâncias.

 

Embora mantenha a confiança do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Corrêa sai desgastado da crise envolvendo a agência. Causou incômodo entre integrantes do Planalto a postura do diretor-geral, que teria minimizado o impacto dos desdobramentos da crise. Nesta ala, existe a avaliação de que houve uma tentativa de blindar a Abin — manobra que se mostrou malsucedida. A interlocutores, Corrêa chegou a afirmar que “a montanha iria parir um rato”.

 

Paulo Maurício, homem de confiança de Corrêa, só deixou o posto de número 3 da Abin no governo Lula depois de ter sido afastado em outubro do ano passado por determinação do ministro Alexandre de Moraes, do STF. Na ocasião, o magistrado também determinou o afastamento de Paulo Magno de Melo Rodrigues Alves, diretor do Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Segurança das Comunicações (Cepesc) da atual gestão da Abin.

 

Investigação da PF aponta que Paulo Magno e Paulo Maurício “tinham todo o domínio da aplicação e sabiam da existência de ‘alvos sensíveis’ nos logs do sistema FirstMile”. Segundo a apuração, Paulo Maurício, apontado como o principal responsável pelo uso do programa. também tinha a posse dos logs de acesso, mas “teria se livrado antes de sair”, conforme declarado por Paulo Magno.

 

Além disso, Paulo Maurício participou de uma reunião que Alessandro Moretti, exonerado nesta terça-feira do posto de número 2 da Abin, promoveu com os investigados, no dia 28 de março do ano passado. Na ocasião, Moretti afirmou, segundo a PF, que a apuração teria “fundo político e iria passar”. Corrêa também estava na reunião, que ocorreu duas semanas após o GLOBO revelar a existência do FirstMile, mas ainda não tinha assumido o comando da Abin.

 

Neste encontro, segundo a PF, Paulo Maurício apresentou uma “estratégia” da direção-geral para “tentar acalmar a turma”. Meses depois, a Polícia Federal realizou uma operação e apreendeu US$ 171,8 mil na casa dele, então número 3 da agência. Na época, ele alegou que o valor era fruto de uma “poupança" que faz para quando se aposentar e que o dinheiro não estava escondido, mas guardado em um cofre.

 

PF aponta contradição

Outro servidor da Abin afastado por determinação do de Moraes foi Marcelo Furtado, que ocupava o cargo de diretor do Departamento de Operações de Inteligência da Abin no ano passado. Ele foi nomeado no governo Lula por indicação de Paulo Maurício. O servidor estava fora do país para fazer um mestrado na maior parte do período em que o FirstMile foi operado pela Abin, mas constava como um dos fiscais do contrato de compra do programa espião.

 

Na investigação, a PF aponta que ao tratar da natureza das informações obtidas pelo FirstMile, em um procedimento interno da Abin, as declarações de Marcelo Furtado foram “contraditórias em relação aos elementos probatórios” colhidos pela apuração da Polícia Federal. O relatório apresentado pela PF ao STF afirma que Furtado teve conhecimento do “caráter intrusivo” do programa espião a partir de um próprio e-mail que recebeu da empresa responsável pelo desenvolvimento.

 

O inquérito da Polícia Federal aponta que houve mais de 60 mil acessos ao programa espião entre 2019 e 2021 — em 21,3 mil casos, foram geradas informações de geolocalização. O programa era usado sem a supervisão da Justiça e, de acordo com a investigação, monitorou ilegalmente adversários de Bolsonaro.

Procurada, a Abin não se manifestou. A Secretaria de Comunicação da Presidência também foi procurada, mas não respondeu à pergunta enviada e afirmou que a demanda deveria ser encaminhada à Casa Civil. O GLOBO tentou contato por telefone com os citados, mas obteve retorno apenas de Paulo Maurício, que disse que não vai dar declarações no momento.

 

Na semana passada, em nota, a agência disse que “é a maior interessada” na apuração dos fatos e que continuará a colaborar com as investigações. "Há 10 meses a atual gestão da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) vem colaborando com inquéritos da Polícia Federal e do Supremo Tribunal Federal sobre eventuais irregularidades cometidas no período de uso de ferramenta de geolocalização, de 2019 a 2021. A Abin é a maior interessada na apuração rigorosa dos fatos e continuará colaborando com as investigações", afirmou o órgão.

 

 

Compartilhar Conteúdo

444