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Lula e ministro dos Transportes apostam em Ferrogrão mesmo se houver revés no STF

André Borges / FOLHA DE SP

 

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) recebeu, da cúpula dos Transportes, um panorama geral sobre o projeto da Ferrogrão e como a decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) sobre os limites do Parque Nacional do Jamanxim, localizado no Pará, pode mexer com o futuro da ferrovia.

O projeto foi tema de um encontro entre Lula e o ministro dos Transportes, Renan Filho, nesta terça-feira (7), no Palácio do Planalto. A ordem é aguardar a decisão do ministro do STF Edson Fachin, que é relator do processo. Independentemente do desfecho, porém, já se avaliam alternativas para manter o projeto nos planos do governo.

O STF retoma nesta quarta-feira (8) o julgamento da ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) que trata de uma lei aprovada pelo Congresso Nacional em 2017, que alterou os limites do Parque Nacional do Jamanxim. Essa lei reduziu os limites da unidade de conservação, retirando dela uma área de 862 km², com o objetivo de permitir a passagem do traçado da ferrovia.

Na semana passada, quando o julgamento foi iniciado, a própria AGU (Advocacia-Geral da União), que representa o governo, chegou a dizer que a lei seria inconstitucional, porque mudanças feitas no texto pelo Congresso enfraqueceram a proteção ao meio ambiente que estava prevista, fazendo o recorte de áreas, sem compensá-las em outros locais.

Ainda assim, a AGU afirmou que o projeto seria viável, por ter seu traçado redefinido e calibrado para passar ao lado de uma rodovia que já existe no local, a BR-163.

Conforme informações obtidas pela Folha, o posicionamento da AGU causou desconforto em parte do governo, por reforçar um viés visto como obstáculo à construção da ferrovia. Por outro lado, a ideia é demonstrar que os temas estariam, hoje, contaminados, e que o projeto ferroviário já não dependeria da lei ou da redução do Jamanxim.

Todos esses argumentos são refutados pela ala ambiental do próprio governo, que vê no projeto um vetor de aumento de desmatamento e de pressão sobre a região amazônica. Mesmo assim, o projeto sempre foi abraçado por Lula.

Defendida por entidades do agronegócio e grandes empresas de comercialização e logística, como Cargill, Bunge e Amaggi, a Ferrogrão foi lançada no governo de Michel Temer (MDB), mas não conseguiu deslanchar. Novas tentativas ocorreram na gestão de Jair Bolsonaro (PL), com promessas não cumpridas pelo então ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas.

Hoje é encampada pelo governo Lula, que tratou de incluir o projeto no Novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).

Por lei, uma obra de infraestrutura, como rodovias, ferrovias, linhas de transmissão e gasodutos, não pode ter impacto direto em uma unidade de conservação de preservação integral, categoria em que se encaixa o Parque Nacional do Jamanxim.

Quando Temer decidiu reduzir o Jamanxim, fez um texto que compensava suas reduções com acréscimo em outras unidades, medida que também foi criticada, já que não se repõe um bioma amazônico com um pedaço de terra do cerrado.

O Congresso, porém, tratou de complicar ainda mais a situação, mantendo no texto apenas a redução do Jamanxim, sem nenhuma compensação.

Com 933 quilômetros de extensão, a ferrovia foi planejada para ligar Sinop (MT) ao porto de Miritituba (PA), para criar um corredor logístico de exportação de grãos e insumos agrícolas, conectando o agronegócio do Centro-Oeste aos portos do Arco Norte.

Nos cálculos do governo, a Ferrogrão poderia reduzir em até 3,4 milhões de toneladas por ano as emissões de dióxido de carbono (CO₂), substituindo parte do transporte de cargas feito por caminhões que cortam a BR-163. Até 1,2 milhão de viagens de caminhões por ano deixariam de ocorrer na rodovia.

 

Sem metas de emissões, COP30 será frustrante

Por  Editorial / O GLOBO

 

Acabou na semana passada o prazo oficial para entrega das novas metas de emissões voluntárias de gases de efeito estufa estipuladas pelo Acordo de Paris, conhecidas pela sigla NDC (National Determined Contribution). Dos 195 signatários, apenas 56 cumpriram o prazo, necessário para a apresentação do relatório-síntese da COP30, a conferência do Clima da ONU em Belém daqui a cerca de um mês. É esse relatório que dirá quão distante está o planeta de atingir o objetivo de manter o aquecimento global até o fim deste século a apenas 2oC, ou desejavelmente 1,5oC, acima do nível pré-industrial. Sem as metas, os cenários traçados ficarão imprecisos.

 

Embora o total de países que prometeram entregar suas NDCs até a COP30 seja estimado em uma centena, oficialmente o relatório deverá ser elaborado com aqueles que cumpriram o prazo. Há quatro anos, quando foi elaborado o último relatório-síntese, foram apresentadas 113 NDCs, permitindo uma visão mais fidedigna da evolução do combate ao aquecimento global. Um relatório-síntese deficiente embaralha os sinais econômicos emitidos a setores que dependem de previsibilidade para investir na descarbonização da economia. Investidores e reguladores olham para as NDCs como indicadores de risco: onde há meta clara, há preço de carbono, infraestrutura e inovação; onde há silêncio, há incerteza e capital em fuga.

 

As ausências não são periféricas. Entre as mais marcantes não estão apenas os Estados Unidos, que anunciaram novamente sua saída do Acordo de Paris depois da posse de Donald Trump, mas também Índia e União Europeia, dois dos maiores emissores globais (ambos prometeram enviar NDCs até a conferência). A China, a maior de todos os emissores, apenas ventilou suas metas, mas ainda não entregou oficialmente sua NDC. Xi Jinping anunciou que o país reduzirá até 2035 entre 7% e 10% das emissões em relação ao pico histórico. Apesar do inegável engajamento chinês na transição energética, o número decepcionou. De acordo com as avaliações mais recentes, o mundo está muito distante da meta traçada em Paris, provavelmente já apontando aquecimento ao redor de 3oC. Sem compromissos precisos, fica difícil até avaliar o que é viável.

 

A recalcitrância dos países omissos pode ser explicada pela crise enfrentada pelo multilateralismo na geopolítica global. Mas há também fatos novos. Em parecer consultivo recente, a Corte Internacional de Justiça afirmou que os Estados têm obrigações jurídicas relativas às metas com que se comprometem, ainda que anunciadas voluntariamente. Quem adia a entrega pode se proteger de sanções futuras, mas acaba por esvaziar o relatório-síntese.

O clima não espera. Belém precisa transmitir uma mensagem inequívoca, com metas na mesa e execução mensurável. Cabe ao Brasil, como anfitrião, lançar mão da diplomacia para obter o compromisso dos países em dívida. Ainda dá tempo de evitar a frustração. Para isso, as prioridades devem ser: fortalecer o multilateralismo; tentar usar em benefício do clima o arcabouço internacional já existente — como Banco Mundial, organizações privadas etc. —; e, por fim, traduzir ao público a importância prática das COPs no desenvolvimento de tecnologias e instrumentos de combate ao aquecimento global. Todos devem entender que, sem ação conjunta e determinada, o planeta corre risco seriíssimo.

 

Ceará tem energia em quase todas as escolas, mas 65% da rede pública não têm acesso a esgoto

Escrito por Gabriela Custódio/ DIARIONORDESTE
 
 
Ter acesso à energia elétrica, esgoto e coleta de lixo são direitos básicos, mas isso ainda não é realidade para todos os cearenses no ambiente escolar. Se, atualmente, quase todas as instituições contam com luz e banheiros, pouco mais da metade das escolas públicas e particulares — cerca de 55% — não estão ligadas à rede pública de esgoto. Além disso, 10,7% delas não contam com coleta de lixo.
 

Esse problema é ainda mais presente na rede pública de ensino: 65% das 5.932 escolas públicas cearenses não estão ligadas à rede pública de esgoto. Por outro lado, 81,3% das 1.690 instituições particulares contam com esse serviço.

Já a coleta de lixo chega a quase todas as escolas particulares, atingindo 99,8%, mas essa proporção cai para 86,3% na rede pública. Os dados são do Censo Escolar 2024 e foram analisados no Anuário Brasileiro da Educação Básica 2025, produzido pela organização Todos Pela Educação.

O levantamento deixa o Ceará na 16ª posição em relação às escolas com acesso à rede de esgoto em todas as escolas, entre as 27 unidades federativas. Em primeiro lugar, com 95,1% das unidades atendidas, está São Paulo. No outro extremo, o Amapá ocupa a pior situação, com cobertura de apenas 10,6% das escolas.

No acesso à coleta de lixo nas escolas, o Ceará ocupa a 12ª posição. Nesse caso, os destaques vão para o Distrito Federal, onde 98,4% das unidades escolares são atendidas, e para o Amazonas, que conta apenas com 37,9% de cobertura.

Apesar da realidade ainda preocupante, o Ceará tem melhorado esse cenário ao longo dos anos. Em 2014, apenas 23,6% das escolas públicas tinham ligação com a rede de esgoto. Essa proporção passou para 34,2% em 2019 e atingiu 34,9% em 2024. Na rede particular, em 2014 a proporção de escolas cobertas com o serviço já era de 70,3%.

Quanto à coleta de lixo, a cobertura das escolas públicas cearenses passou de 67,5% em 2014 para 86,3% em 2024.

Diferentes realidades na rede pública

As desigualdades ficam ainda mais acentuadas quando se analisa os resultados das diferentes redes que compõem a educação pública e a localidade onde as instituições estão localizadas. O acesso a esgoto, por exemplo, é ainda mais precário nas escolas municipais que estão na zona rural do Ceará.

Esse detalhamento está disponível no painel de Estatísticas do Censo Escolar da Educação Básica, do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep).

Segundo esses dados, a rede estadual do Ceará, em 2024, era composta por 759 instituições de ensino, e 60,3% delas estão ligadas à rede pública de esgoto.

Mas essa proporção sobe para 67,8% entre as 652 escolas estaduais em área urbana e cai para 15% entre as 107 unidades do Estado localizadas na zona rural.

Entre as 5.138 escolas municipais, por outro lado, apenas 31% estão ligadas ao esgotamento sanitário. Na área urbana, onde estão 2.743 delas, pouco mais da metade (54%) tem acesso ao serviço, enquanto essa proporção é de apenas 4,8% das 2.395 escolas municipais na zona rural em todo o Ceará.

A professora Clarice Zientarski, do Departamento de Fundamentos da Educação da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Ceará (UFC), trabalha com escolas do campo, indígenas e quilombolas, além das outras unidades da rede pública, e percebe o impacto dessa realidade no cotidiano das comunidades.

Apesar de destacar positivamente o acesso à energia elétrica, tanto nas escolas urbanas quanto nas unidades do campo, a professora avalia que a situação é “muito ruim no que diz respeito às condições mínimas para se ter uma vida digna, pois, como se observa, o acesso à rede de esgoto é quase inexistente”.

“Essas deficiências impactam diretamente no desenvolvimento do processo educativo, resultam na precarização do próprio ensino, do trabalho dos professores e da vida das crianças e jovens que frequentam essas escolas, levando ao adoecimento, à fragilização em relação ao conhecimento, às expectativas de vida e projeção para o futuro”, afirma.

Pedro Rodrigues, coordenador de Políticas Educacionais do Todos Pela Educação, destaca a importância de que todas as escolas garantam que itens de infraestrutura básica — como esgoto, água potável e coleta de lixo — estejam disponíveis.

Apesar de a competência para realizar a ligação com a rede pública de esgoto, por exemplo, não seja das secretarias de educação, Rodrigues aponta que a falta dela reflete a desigualdade existente no Brasil.

Em julho, o Diário do Nordeste mostrou que a garantia do direito ao saneamento básico ainda é um desafio para as três maiores cidades do Ceará. O Ranking do Saneamento 2025, do Instituto Trata Brasil, mostrou que Fortaleza, Caucaia e Juazeiro do Norte estão entre as 40 menores notas do levantamento. 

Em nota, a Secretaria da Educação do Ceará (Seduc) informa que oferta o Ensino Médio e que trabalha para garantir espaços escolares adequados em termos de estrutura e aprendizagem. 

“Com relação ao saneamento, mais de 60% das escolas estaduais estão conectadas com a rede pública de esgoto. As que não possuem, são atendidas com fossas sépticas e sumidouros, que seguem padrões de segurança”, afirma. 

Sobre a coleta de lixo, segundo a pasta, as escolas estão inseridas no serviço prestado pelos municípios, já que a limpeza é de competência municipal. Leia nota completa no fim desta matéria. 

Melhorias na educação do Ceará

Para Rodrigues, apesar de as desigualdades persistirem, os avanços “são inúmeros”, inclusive na infraestrutura básica das unidades escolares. “Por mais que os dados ainda nos choquem — e têm que chocar, porque têm que ser um alarme para que os gestores públicos garantam que as escolas contem com infraestrutura básica —, sabemos que o País tem avançado bastante”, destaca.

Mas são muitos os outros indicadores em que o coordenador destaca melhorias na educação pública. Um deles é a taxa de distorção idade-série nos anos iniciais do Ensino Fundamental do Ceará. Esse aspecto diz respeito aos estudantes que reprovaram mais de duas vezes e, com isso, estão com mais de dois anos de diferença do que deveriam estar na idade escolar.

Em 2014, cerca de 13% dos estudantes do 5º ano estavam com pelo menos dois anos de atraso na trajetória escolar — proporção que reduziu para 3% em 2024. “Aqui temos um avanço muito relevante, que mostra que os alunos não estão mais ficando para trás, eles estão conseguindo acompanhar a trajetória escolar como deveriam”, afirma.

Outro ponto que ele cita é o aumento da proporção de alunos da rede pública com aprendizagem adequada em Língua Portuguesa e Matemática ao final do 5º ano, de 23% em 2013 para 48% em 2023. “Entendemos que é algo muito importante, que são impactos da política pública do Ceará, que é um sucesso e vem sendo reproduzida Brasil afora”, finaliza.

Leia nota completa da Seduc

"A Secretaria da Educação do Ceará (Seduc) oferta o Ensino Médio e vem trabalhando para garantir espaços escolares adequados em termos de estrutura e aprendizagem. Com relação ao saneamento, mais de 60% das escolas estaduais estão conectadas com a rede pública de esgoto. As que não possuem, são atendidas com fossas sépticas e sumidouros, que seguem padrões de segurança.

Sobre a coleta de lixo, as escolas estão inseridas no serviço prestado pelos municípios, já que a limpeza é de competência municipal. O núcleo gestor da escola organiza como os resíduos são acondicionados até a retirada.

Não há incentivo à queima de lixo nas escolas. Inclusive o tema norteador para as atividades pedagógicas em 2025 é Educação Ambiental, Sustentabilidade e Emergência Climática. Assim, os programas, projetos e práticas de ensino da rede estadual são orientados por esse tema, contribuindo para a formação de cidadãos conscientes, capazes de compreender os desafios globais, agir de forma responsável em suas comunidades e promover transformações sociais alinhadas aos compromissos ambientais, construindo um futuro mais justo e equilibrado para todos."

“Para além da aprendizagem, esses itens são importantes para a vida, são condições essenciais para que as crianças vivam dignamente no tempo que estão na escola”, diz.
 

Mais um teto para ser furado

Por Notas & Informações / O ESTADÃO DE SP

 

O avanço de propostas inviáveis no Congresso quase sempre se deve a uma certa ingenuidade, puro desconhecimento ou mera hipocrisia por parte dos parlamentares. Alguns senadores, portanto, deveriam explicar qual dessas alternativas está por trás do Projeto de Resolução do Senado 8/2025, por meio do qual pretendem estabelecer um teto para a dívida bruta da União. Trata-se de ideia tão simples quanto equivocada, não só no conteúdo como na forma, e que certamente não resolverá os problemas fiscais que se acumulam há anos.

 

Em princípio, quem defende a responsabilidade fiscal enquanto princípio não teria motivos para se colocar contra a proposta, haja vista que o arcabouço fiscal proposto pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, não foi capaz de estabilizar a trajetória da dívida pública, situação que retroalimenta juros elevados.

 

Juros elevados, por sua vez, encarecem o crédito para o setor privado, diminuem a atratividade de investimentos em infraestrutura e reduzem a expectativa para o crescimento da economia. É provável que tenha sido nesse contexto que surgiu a ideia do teto para a dívida.

 

De qualquer forma, na justificativa da proposta, o senador Renan Calheiros (MDB-AL) argumenta que foi a Constituição que deu ao Senado a competência de fixar limites globais para a dívida consolidada da União, Estados e municípios, mas que eles têm sido aplicados somente para os entes subnacionais.

 

Originalmente, Renan sugeriu que a dívida pública se limitasse a quatro vezes a Receita Corrente Líquida (RCL) da União, mas o relator, Oriovisto Guimarães (PSDB-PR), propôs que ela não ultrapasse 6,5 vezes a RCL e que não supere o nível de 80% do Produto Interno Bruto (PIB).

 

Que bom seria se todos os desafios nacionais fossem resolvidos com base no que está escrito em lei. Mas, como lembrou ex-presidente do Banco Central (BC) e ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles em sua coluna no Estadão, o País já conta com um arsenal de leis suficiente para orientar a política fiscal. O diabo está nas exceções que se criam ao longo do tempo para fugir do cumprimento delas. “O que pode ser aprimorado é a execução da política fiscal, sem novas exceções ao sabor do momento”, disse Meirelles.

Também em sua coluna neste jornal, o economista e ex-diretor do BC Alexandre Schwartsman lembrou que o projeto em discussão no Senado padece dos mesmos erros do antigo teto de gastos e do atual arcabouço fiscal: não atacar os gastos obrigatórios, que se expandem em um ritmo acima do crescimento sustentável do PIB. “Fracassam porque tentam conter o sintoma, não sua causa”, definiu.

 

Exatamente por não resolver a dinâmica do gasto público, o projeto estabeleceria mais um teto para ser furado em tempo recorde. Isso porque a dívida bruta do governo geral já estava em 77,5% do PIB em agosto e deve ultrapassar o nível de 80% do PIB em breve.

 

O governo fez chegar aos senadores que a proposta poderia paralisar a máquina pública, gerar um choque recessivo e até mesmo levar a um calote, enquanto o BC sinalizou que o projeto imporia dificuldades adicionais à condução da política monetária e à estabilidade financeira.

 

O mais grave é que, por ser um projeto de resolução do Senado, o texto, uma vez aprovado, entraria em vigor de maneira imediata, sem jamais ter passado pela Câmara e sem estar sujeito a vetos presidenciais. Ora, seria um disparate se um tema de tamanha importância e impacto para as contas públicas fosse decidido apenas pelo Senado.

 

Após apresentar seu parecer, Oriovisto disse que está disposto a discutir o projeto com o governo e o BC antes que ele seja deliberado e, felizmente, a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) decidiu adiar sua votação para debater seus impactos em uma audiência pública com integrantes do Ministério da Fazenda e da Casa Civil.

 

O melhor mesmo é que o Senado desista de uma vez desse projeto. Afinal, criar uma regra que só serviria para bagunçar ainda mais um conjunto de normas fiscais já bastante confuso e que já nasceria com um prazo de validade curto é tudo de que o País não precisa neste momento.

A um ano da eleição, Lula intensifica agenda, adota discurso eleitoral e mira adversários

Por Hugo Henud e Adriana Victorino /  O ESTADÃO DE SP
 
 

A um ano da eleição, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva intensificou a agenda pelo País e já visitou mais capitais e cidades em 2025 do que na totalidade de cada um dos dois primeiros anos do terceiro mandato. O petista tem usado viagens e atos oficiais para acelerar a guinada eleitoral, defendendo bandeiras que ajudaram a recuperar a popularidade do governo, como a soberania nacional, e apresentando programas sociais em tom de pré-campanha de olho em 2026.

 

Neste ano, em nove meses, Lula já esteve em 65 cidades de 19 Estados, número que supera o total do ano de 2024 (60) e o de 2023 (36), quando priorizou viagens internacionais. A intensificação da agenda marca a contagem regressiva para as eleições de 4 de outubro de 2026 e tem se concentrado em Minas GeraisSão Paulo e Rio de Janeiro, que juntos reúnem cerca de 40% do eleitorado.

 

Em agosto, em Belo Horizonte, Lula lançou o programa Gás do Povo, o novo vale-gás do governo federal. No mesmo mês, no Rio de Janeiro, participou da divulgação de R$ 33 bilhões em investimentos da Petrobras. Já no fim de julho, em São Paulo, anunciou um pacote de R$ 4 bilhões para urbanização de favelas e, em Sorocaba, transformou a inauguração de consultórios odontológicos em discurso de campanha: “Três mandatos incomodaram muito, muito mais. Imagina se tiver o quarto mandato”, disse.

 

Depois de SP, MG e RJ, o Nordeste foi o terceiro destino mais visitado por Lula em 2025, região onde historicamente concentra sua base de votos. Durante as viagens, aproveitou para criticar a gestão do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), apontado como um dos principais nomes da direita para 2026, e alfinetar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL): “Podem ter certeza que eu serei candidato para ganhar as eleições, porque eu não vou entregar este País de volta para aquele bando de malucos”, disse no Ceará, em junho.

 

Para o presidente do PT, Edinho Silva, as viagens são parte do estilo de governar de Lula e servem também para fortalecer os palanques regionais em 2026. “Ele é candidato à reeleição”, resume. Já o ministro da Previdência, Wolney Queiroz, atribui o aumento das agendas às entregas do governo. “Chegou a hora de cumpri-las pelo Brasil, e é isso que ele tem feito.”

 

O movimento de intensificar as viagens acompanhou a virada no cenário político, quando Lula registrou a pior avaliação de suas três gestões, em fevereiro. Para aliados, o petista recuperou parte da popularidade ao adotar uma ofensiva digital com o mote “ricos versus pobres”, mirando Congresso, Centrão e oposição, tachados como defensores de privilégios em detrimento do povo. O líder do governo na Câmara, Lindbergh Farias (PT-RJ), afirma que Lula chegará “fortalecido” a 2026, depois de “sair das cordas nos últimos meses”.

 

A disputa em torno do IOF reforçou essa guinada: em julho, a Câmara derrubou o decreto do governo que elevava as alíquotas do imposto, cobrado em operações de crédito como empréstimos, financiamentos e cartão. O revés foi parcialmente revertido por decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes, o que permitiu ao Planalto ressignificar a disputa e apresentá-la como símbolo de sua defesa da “justiça tributária” e da taxação dos mais ricos.

 

A melhora apareceu nas pesquisas seguintes. A aprovação de Lula subiu três pontos entre julho e agosto, de 43% para 46%, e se manteve estável em setembro. Para o cientista político Antonio Lavareda, a recuperação também foi alimentada pelo tarifaço de Donald Trump, articulado pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL) e endossado por líderes da direita. As sanções abriram espaço para o governo resgatar a defesa da soberania nacional e das cores verde e amarelo, símbolos que haviam se tornado quase exclusivos do bolsonarismo.

 

Esse discurso foi logo incorporado às agendas. Em agosto, em Juazeiro (BA), Lula voltou a ligar Jair e Eduardo Bolsonaro ao tarifaço de Trump e os chamou de “traidores da pátria”. A ofensiva teve cálculo político: pesquisa Quaest do mesmo mês aponta que 71% dos eleitores avaliam que Trump errou ao impor a tarifa. “Bolsonaro se abraça na bandeira americana. É um patriota falso”, disparou o petista.

 

Entre aliados, a avaliação é que a narrativa pegou. Eles acreditam que o mote da soberania nacional e o discurso de que os ricos devem pagar mais impostos deu certo e trouxe de volta bandeiras históricas do PT, como a redução das desigualdades e a luta contra o inimigo externo. “Acho que essa foi a grande sacada que fez essa mudança”, afirma o deputado Jilmar Tatto (PT-SP). Na mesma linha, o deputado Rogério Correia (PT-MG) avalia que essas bandeiras “viraram um marco do governo”, dando clareza ao projeto que o partido pretende defender em 2026.

 

A percepção é semelhante à do marqueteiro político Pedro Simões. Para ele, o governo conseguiu consolidar uma marca que até pouco tempo era vista como ausente. “Antes falavam que faltava marca do governo. Agora está difícil dizer que não tem”, afirma. Ele destaca também os “últimos erros da direita”, como a aprovação da PEC da Blindagem na Câmara, capitaneada pelo Centrão, e a defesa da anistia para os condenados nos atos golpistas. “Quando seu ‘inimigo’ estiver errando, não o interrompa”, diz.

 

Simões acrescenta que a profissionalização da equipe de comunicação, liderada pelo ministro Sidônio Palmeira na Secretaria de Comunicação Social, ajudou a intensificar a exposição de Lula, com mais viagens, entrevistas e atos oficiais.

 

Oposição critica ‘palco eleitoral’ no governo

 

Na oposição, o tom é o oposto. O líder do PL na Câmara, deputado Zucco (RS), sustenta que Lula nunca deixou o palanque desde que voltou ao Planalto e transformou a Presidência em palco eleitoral.

 

Para o parlamentar, o petista instiga a divisão entre esquerda e direita e, após a queda nas pesquisas, intensificou esse movimento ao abrir “os cofres de forma desordenada” e criar novos impostos para turbinar a arrecadação. “O governo dá com uma mão, ao prometer isenção no Imposto de Renda, mas tira com duas ao criar novas taxações”, afirma, em referência às medidas de compensação enviadas ao Congresso para bancar a ampliação da faixa de isenção.

 

Zucco também acusa Lula de usar a máquina pública em benefício eleitoral e de atacar Jair Bolsonaro, que, na visão dele, estaria “injustamente preso, retirado do jogo político por uma farsa jurídica”.

 

Até o final do ano, Lula deve manter o ritmo de viagens e inaugurações, apostando na estratégia de transformar entregas em vitrine eleitoral. A expectativa no Planalto é encerrar 2025 com a base mobilizada nos principais colégios eleitorais e um discurso afinado para entrar em 2026 já em clima de campanha.

Aprovação de reforma administrativa será conquista histórica

Por  Editorial / O GLOBO

 

Convivem no funcionalismo salários baixos, categorias cercadas de privilégios e falta de avaliação objetiva, resultando na péssima qualidade dos serviços prestados à população. Corrigir tais distorções é o objetivo da proposta apresentada pelo relator da reforma administrativa, deputado Pedro Paulo (PSD-RJ). Aprová-la deve ser prioridade. O Congresso tem, afinal, a oportunidade de corrigir as regras anacrônicas e ineficazes que regem os 11 milhões de servidores públicos. Na União, a folha de pagamentos de R$ 400 bilhões anuais é a segunda maior despesa do Orçamento, abaixo apenas da Previdência. Enquanto esta já passou por mais de uma reforma, as carreiras do funcionalismo jamais foram atualizadas de forma abrangente.

 

Com a alteração de 40 artigos da Constituição, a proposta estabelece que o funcionalismo seja submetido a avaliações periódicas de desempenho, cujo resultado servirá de base a promoções ou bonificação. O tempo de serviço deixa de ser critério para progressão na carreira. Bônus passam, também, a ter limite: até dois ou, para servidores em cargos de confiança, quatro salários anuais, sobre os quais não incidirá o teto constitucional de R$ 46,3 mil.

 

O texto estipula um limite de 10% do salário às verbas indenizatórias, os proverbiais “penduricalhos” com que a elite do funcionalismo turbina seus salários. Ficarão dentro desse limite auxílios de alimentação, saúde e transporte, comuns em carreiras no Judiciário e no Ministério Público. A intenção é acabar com o uso de auxílios para aumentar salários e, ao mesmo tempo, resgatar a credibilidade do teto constitucional. Para isso, os gastos com os “penduricalhos” não poderão crescer acima da inflação. A PEC proíbe ainda o pagamento em dinheiro de férias e licenças não usufruídas. Se aprovada, também não haverá pagamentos retroativos sem decisão judicial. Por fim, impõe disciplina ao trabalho remoto, limitando o recurso ao home office.

 

No cerco para eliminar brechas, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) ficam proibidos de criar benefícios e gratificações. Outra medida moralizadora é o fim da aposentadoria compulsória como pena judicial. Juízes e procuradores passarão a estar sujeitos à perda do cargo se condenados em casos graves. A aposentadoria forçada equivale a um prêmio.

 

Para que haja ordem no pagamento ao funcionalismo, será estabelecido o prazo de dez anos para que União, estados e municípios criem uma tabela de remuneração. A partir de 2027, os entes federativos já deverão respeitar um teto em suas despesas com pessoal. Mesmo que haja aumento de receita, ele será incorporado ao gasto à razão de no máximo 2,5% por ano. Com isso, reforça-se a disciplina fiscal e impede-se o crescimento automático da folha de pagamentos. A proposta também fixa limites à estrutura administrativa de governos municipais. Prefeituras com déficit sofrerão restrições no número de secretarias. Os salários de prefeitos, vices e secretários ficarão entre 30% e 80% da remuneração do governador, dependendo da população. Além disso, o Executivo federal terá de fazer revisões anuais de gastos, com diagnósticos sobre a alocação dos recursos.

 

Ao preencher o vazio regulatório sobre as carreiras do Estado, a reforma administrativa promete uma revolução no serviço público. Se o Congresso conseguir aprová-la sem desidratá-la, será um feito histórico.

 

A Esplanada dos Ministérios, em BrasíliaA Esplanada dos Ministérios, em Brasília — Foto: Brenno Carvalho / Agência O Globo

Atas do conselho da Previdência já registravam irregularidades no consignado há 20 anos

Adriana Fernandes / Marcelo Rocha / FOLHA DE SP

 

 

Atas de reuniões do CNPS (Conselho Nacional da Previdência Social) obtidas pela Folha já registravam irregularidades nos descontos de empréstimos consignados de aposentadorias e pensões pagas pelo INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) há 20 anos.

Na 115ª reunião ordinária, de outubro de 2005, os integrantes do colegiado, responsável por estabelecer diretrizes e acompanhar a gestão do RGPS (Regime Geral de Previdência Social), trataram do problema.

Eram os primeiros anos do empréstimo consignado e o conteúdo das atas sugere que o desconto indevido está na gênese dessa modalidade de crédito, de acordo com técnicos do INSS ouvidos pela reportagem sob a condição de anonimato. O consignado tem como garantia de pagamento das parcelas do empréstimo as aposentadorias e pensões.

Um desses técnicos trata o atual escândalo, que envolve os descontos associativos dos benefícios do INSS e motivou a instalação de uma CPI no Congresso Nacional, como assunto "correlato" às irregularidades identificadas duas décadas atrás.

Naquela reunião, representantes da Ouvidoria do Ministério da Previdência alertaram o conselho para o aumento dos casos de descontos do benefício de aposentados e pensionistas que não tinham autorizado a contratação de empréstimos.

Um desses representantes citou no CNPS que a reclamação sobre os casos em que o segurado não autorizava a contratação de empréstimos, mas sofria o desconto era crescente e o percentual dessa reclamação em relação a todas as outras recebidas pelo setor desde julho de 2004 até o mês de setembro de 2005 atingiria 15,7%.

O alerta da Ouvidoria tinha como preocupação a necessidade de informar os segurados do INSS para o uso consciente e comedido do consignado, já que a população beneficiária da Previdência era formada em geral por idosos e pessoas portadoras de alguma deficiência.

 

Representante do INSS na reunião do CNPS de outubro de 2005, Benedito Brunca foi o responsável pela atualização das informações sobre o consignado e os normativos que regulamentaram a Lei 10.820, de 2003, que autorizou os empréstimos consignados com desconto em folha.

Brunca é o atual secretário do RGPS do Ministério da Previdência, nomeado após a crise dos descontos associativos. Ele substituiu Adroaldo Portal, que foi nomeado secretário-executivo pelo novo ministro Wolney Queiroz (PDT-PE). Queiroz substituiu Carlos Lupi no comando da pasta.

Entre os normativos citados por Brunca estavam o prazo de 36 meses e a proibição de contratação de empréstimo por telefone. No início, somente as instituições pagadoras de benefícios podiam celebrar convênios para o fim de consignação em folha, mas depois foi admitida a possibilidade de qualquer instituição financeira realizar tal operação. Na época, o BMG era o maior operador, instituição financeira envolvida no caso do Mensalão.

Procurado diretamente pela reportagem, Brunca não respondeu o pedido para falar sobre a reunião.

Ministro da Previdência Social em 2005 e participante da reunião do CNPS, Nelson Machado disse à Folha que o desconto de associação é um fenômeno completamente diferente do crédito consignado. Ele ressaltou que na época da reunião era o início da implantação do crédito consignado. "Todo o início de processo, claro, tem problema. E a maneira como o INSS lidou com o problema do crédito consignado foi trazer para debate o sistema bancário", disse. "A ata mostra isso."

Segundo ele, a Febraban (Federação Brasileira de Bancos) atuou com os Procons para enfrentar os problemas no início dessa modalidade de crédito. "O fenômeno que aconteceu foi que os bancos começaram a contratar terceirizados para fazer a originação do crédito. E aí era complicado o controle", afirmou. "O sistema bancário criou até um sistema de autorregulação. E eles continuam até hoje atuando e fiscalizando."

Em junho de 2010, numa reunião do CNPS, o representante da Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura), Evandro José Morello, mostrou-se preocupado com a possibilidade de fraude no processo, lembrando os casos de falsificação de 145 documentos para concessão de empréstimos consignados.

Na época, ele pediu uma conversa com os bancos para garantir uma melhor segurança, de acordo com a ata do colegiado.

Agora, a Contag está entre as investigadas pelos descontos associativos e afirma que sempre pautou sua atuação pela legalidade e transparência.

O novo presidente do INSS, Gilberto Waller Junior, logo que assumiu tomou uma série de medidas regulatórias para barrar as fraudes.

À Folha o INSS disse que intensificou as ações para proteger aposentados e pensionistas de fraudes no crédito consignado, implementando um conjunto de medidas rigorosas e de efeito imediato. A principal delas é a exigência de biometria facial como etapa obrigatória para o desbloqueio de benefícios para empréstimos.

"No mesmo sentido, o Instituto suspendeu a contratação de empréstimos por representantes legais (tutores e curadores) sem autorização judicial prévia, conforme a Instrução Normativa 190/2025. O INSS também descredenciou instituições financeiras que não cumpriram as normas de conformidade exigidas para a prestação desse serviço", diz o INSS em nota enviada à reportagem.

Segundo o órgão, além disso, para fortalecer a proteção ao consumidor, foi firmado um Acordo de Cooperação Técnica com a Senacon (Secretaria Nacional do Consumidor), do Ministério da Justiça, para monitorar e tratar as reclamações registradas na plataforma Consumidor.gov.br.

A Febraban disse que desconhece registros de problemas em atas do CNPS nos últimos 20 anos, mas reiterou que as instituições financeiras não compactuam com fraudes e ilícitos. Para combater irregularidades no setor, desde janeiro de 2020 está em vigor a Autorregulação do Consignado, que visa eliminar do sistema as más práticas relacionadas à oferta e contratação dessa modalidade de crédito.

Pela autorregulação, é considerada falta grave qualquer forma de captação ou tratamento inadequado ou ilícito dos dados pessoais dos consumidores sem sua autorização e todos os bancos que participam da autorregulação assumem o compromisso de adotar as melhores práticas relativas à proteção e ao tratamento de dados pessoais dos clientes e o combate a fraudes.

Desde o início das regras, em 2020, até setembro de 2025, 1.962 medidas administrativas foram aplicadas a correspondentes bancários, dos quais 113 perderam o direito de exercer a atividade em definitivo e estão impedidos de prestar serviços aos bancos e sete agentes de crédito foram bloqueados.

Os bancos que não aplicarem as sanções a correspondentes podem ser multados pelo Sistema de Autorregulação por conduta omissiva, cujos valores variam de R$ 45 mil até R$ 1 milhão.

Embora a operação Sem Desconto, ação da Polícia Federal e da Controladoria-Geral da União, que desmontou o esquema ilegal dos descontos, tenha focado nos descontos associativos, as irregularidades na concessão dos empréstimos consignados também entraram na mira das investigações.

Uma frente de investigação mira fraudes e irregularidades envolvendo empréstimo consignado para aposentados e pensionistas e possíveis elos com os descontos associativos de sindicatos e entidades de classe.

CPMI REUNIÃO

Cota para nordestinos em universidade estadual de SC provoca reação de governador: 'Não vamos aceitar'

Por Luis Felipe Azevedo — Rio de Janeiro / O GLOBO

 

 

O governador de Santa Catarina, Jorginho Mello (PL), foi às redes sociais cobrar a reitoria da Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc) por conta de um edital de pós-graduação com cotas que prevê a reserva de vagas a alunos das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Ele afirma ser “só o que falta, dinheiro do catarinense ter cota para quem é de fora”. Após a repercussão do vídeo, a Udesc publicou uma nota na qual afirma que a prática “não corresponde a uma política institucional e não deverá constar em futuros processos seletivos”.

 

Lançado em fevereiro deste ano, o edital nº 50/2024 regula a seleção de alunos de pós-graduação em Música, do Centro de Artes, Design e Moda (Ceart) da Udesc. O documento prevê a reserva de quatro vagas para ampla concorrência, três para pretos e pardos, e dois para indígenas, quilombola, transsexuais e pessoas com deficiência. Também há a previsão de uma vaga para graduados no Nordeste, Norte e do Centro-Oeste.

 

— Já não basta a gente mandar nosso dinheiro para Brasília e voltar uma migalha? Já vou avisando que não concordo. Não vamos aceitar esse absurdo com o dinheiro do catarinense — disse Mello no vídeo publicado nas redes sociais, no qual enfatiza que a universidade é mantida com recursos estaduais.

 

O governador oficiou à administração da Udesc , da qual cobra informações sobre os critérios adotados para a concessão de vagas na instituição. A Udesc disse assegurar que “todas as suas políticas de inclusão seguirão a legislação vigente sobre o assunto, bem como os parâmetros constitucionais de igualdade de oportunidades”.

 

“É importante reforçar que a Udesc é, essencialmente, uma universidade catarinense: dos mais de 12 mil alunos matriculados, cerca de 67% nasceram em Santa Catarina e, quando considerados também os residentes no estado, esse percentual se aproxima de 80%. Portanto, quatro em cada cinco estudantes da universidade são catarinenses, valorizando também a cooperação acadêmica nacional e internacional”, diz a instituição.

 

A universidade alegou também que “continuará avançando em políticas inclusivas, sempre orientada pela transparência, pelo diálogo com a comunidade acadêmica e pelo compromisso inegociável com o interesse público”.

O silêncio do Brasil

Por Notas & Informações / O ESTADÃO DE SP

 

Na ONU, o presidente Lula da Silva foi ovacionado ao discursar de maneira contundente, entre outros temas, contra a ação de Israel em Gaza. Mas, quando se abriu a primeira janela de paz real para Gaza, o petista calou-se. Grande na tribuna, pequeno na ação.

 

Na segunda-feira, o presidente americano, Donald Trump, apresentou a proposta mais abrangente até agora para solucionar o conflito. Aceita por Israel, ela responde consistentemente a duas questões cruciais: como encerrar o combate, com a devolução imediata dos reféns israelenses, e como organizar a reconstrução e a governança de Gaza com vistas à criação de um Estado palestino. Seria de esperar que Lula abraçasse efusivamente a oportunidade. Mas, pelo jeito, ele prefere perorar sobre o “genocídio” a encerrá-lo.

 

Na quarta-feira, numa comunicação em audiência na Câmara, o chanceler Mauro Vieira fez longas recriminações a Israel, mas não citou o plano. Segundo apuração de O Globo, a diretriz era esperar a posição do Hamas, o que seria condicionar a reação oficial do Brasil ao veredicto de um grupo terrorista. Questionado pelos deputados, Vieira se resignou a dizer que estava “acompanhando” o plano e pretendia “aplaudi-lo”. Quando este editorial foi ao prelo, a única nota recente do Itamaraty sobre o conflito era uma condenação a Israel por impedir uma flotilha de ativistas pró-palestinos de chegar a Gaza a pretexto de entregar ajuda humanitária.

 

Quando o governo se dignou a tomar conhecimento da proposta – segundo Vieira, na tarde de 30/9, mais de 24 horas após ser lançada –, ela já fora endossada, com ofertas de apoio, pela Autoridade Palestina, por grandes nações islâmicas e ocidentais, por potências como China, Rússia e Índia, por organismos multilaterais como a ONU e por lideranças religiosas, como o papa. Enquanto o Hamas sofre pressão máxima do mundo – incluindo patronos como Catar e Turquia –, o governo que se gaba de ser voz “ativa e altiva” no “Sul Global” silencia.

 

Assim como Lula nunca desce do palanque no Brasil, nunca desce do púlpito fora dele. Eis a diplomacia reduzida a espetáculo de autopromoção: verborrágica ao posar de tribuno anti-imperialista, mas titubeante quando os fatos exigem pragmatismo; indignada contra Israel, mas condescendente com Hamas, Irã ou Hezbollah; furiosa ao cobrar protagonismo, mas tímida quando pode ser protagonista. O multilateralismo é exaltado na teoria e descartado na prática, justamente quando uma articulação internacional se materializa.

Para Lula, o desfecho do drama importa menos que o figurino dos atores. Se os “fascistas” Trump e o premiê de Israel, Binyamin Netanyahu, rubricam a embalagem do remédio, para Lula ele vira veneno.

 

Enquanto o mundo desperta e pressiona o Hamas a escolher entre a rendição que pode alicerçar um futuro digno para Gaza ou a imolação que pode soterrá-lo, Lula hesita. Quem mais perde não é Trump nem Netanyahu: são os palestinos, mantidos como peças num tabuleiro em que Brasília só joga para consumo interno.

 

De nada servem proclamações “históricas” se, quando a História bate à porta, o Brasil emudece. Esta é a hora em que estadistas trocam aplausos por ações. Mas a diplomacia lulista não se guia por avanços no terreno, só por flashes no palco. O resto é silêncio.

‘Ritmo de Brasília’: quando a esquerda desistiu da eficiência no serviço público?

Por Redação / O ESTADÃO DE SP

 

 

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, gerou ruído ao falar, numa entrevista recente a um podcast, sobre a estabilidade do servidor público. Ele falou sobre regras claras de desempenho, padrão de qualidade e padrão de eficiência e sugeriu que servidores que não cumprem esses atributos deveriam ter a estabilidade questionada (leia conteúdo integral no vídeo acima).

 

O discurso de Haddad provocou uma enxurrada de comentários, memes e até um certo sentimento de traição, destaca o colunista do EstadãoPedro Fernando Nery, no programa Chama o Nery. Num dos memes, Haddad foi comparado ao ex-ministro da Economia Paulo Guedes, que durante o governo Bolsonaro usou a expressão de “colocar a granada no bolso do servidor”.

 

Apesar disso, Haddad se limitou a enfatizar que “é preciso produzir” no setor público, sinalizando preocupação com a entrega de serviços de qualidade à população.

 

O episódio expõe um dilema político para o governo: de um lado, a base de apoio entre servidores públicos, que teme perdas de direitos ou abertura para a precarização; de outro, a demanda da sociedade por serviços públicos mais eficientes, especialmente em áreas como saúde e educação. Essa tensão ganha relevância diante da proposta de reforma administrativa em discussão no Congresso, relatada pelo deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), que também aborda critérios de avaliação de desempenho no funcionalismo.

 

Vale lembrar que a Constituição já prevê a possibilidade de demissão de servidores por insuficiência de desempenho, mas a lei que regulamentaria esse mecanismo está parada há quase 30 anos. A fala de Haddad, ainda que não tenha sido uma proposta formal, trouxe o tema de volta ao debate público.

 

A questão agora é saber se, em algum momento, será possível associar eficiência no serviço público a uma visão progressista — ou se o conceito seguirá visto como uma pauta de viés neoliberal.

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