Suprema reação - ISTOÉ
Ao romper a fronteira do foro privilegiado, autorizando a prisão de um parlamentar no exercício do cargo, ministros do STF dão passo importante para o fim da impunidade
Débora Bergamasco
Apromessa do senador Delcídio do Amaral (PT-MS) de influir nas decisões dos ministros do Supremo Tribunal Federal para beneficiar o ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró chocou não apenas a sociedade, como estarreceu os integrantes da mais alta corte jurídica do País. A reação dos magistrados foi unânime, imediata e arrasadora. Pela primeira vez na história do Brasil, o Supremo autorizou a prisão de um senador da República em pleno exercício do cargo. Um congressista só pode ser detido quando seu caso já tiver sido julgado e não couberem mais recursos. Entretanto, o episódio envolvendo Delcídio enquadrou-se na excepcionalidade da lei, prevista quando o parlamentar pode ir para trás das grades ao ser constatado flagrante delito por tentar atrapalhar as investigações. Num País acostumado à máxima de que poderosos não são punidos, a decisão do STF é um alento a todos que propugnam pelo fim da impunidade. Significa que os políticos que se sentiam amparados pelo foro especial e pela imunidade parlamentar – tantas vezes chamada de impunidade parlamentar – agora experimentam o mesmo rigor enfrentado pelos cidadãos comuns, desprovidos de regalias e privilégios.
Por que o PT tem tanto medo de Cerveró
Além de colocar Dilma, Lula, Palocci e Gabrielli no Petrolão, ex-diretor Internacional da Petrobras pode levar a Lava Jato para dentro do BNDES
Mário Simas Filho
Desde 14 de janeiro, quando os agentes da Lava Jato levaram o ex-diretor de Assuntos Internacionais da Petrobras, Nestor Cerveró, para a carceragem de Polícia Federal em Curitiba (PR), petistas de alto escalão vinham demonstrando uma enorme preocupação com uma possível delação premiada. Ao longo dos últimos dois meses, em conversas reservadas, amigos de Lula que têm o hábito de frequentar o instituto que carrega o nome do ex-presidente, mais de uma vez disseram que uma delação de Cerveró teria maior teor explosivo do que as colaborações policiais que pudessem ser feitas por empresários e lideranças políticas. No Palácio do Planalto, entre os mais próximos da presidente Dilma, a conversa não era diferente. Na semana passada, quando ficou praticamente sacramentada a delação de Cerveró, o que era preocupação se transformou em medo explícito. Petistas e aliados têm a certeza de que as revelações do ex-diretor da Petrobras podem levar tanto Dilma como Lula para o olho do furacão, além de comprometer outros líderes ilustres como José Dirceu, Antônio Palocci, Graça Foster e José Sérgio Gabrieli. Na noite da quinta-feira 26, era voz corrente tanto no Planalto como no Instituto Lula que Cerveró detém informações que vão além das falcatruas perpetradas na compra da refinaria de Pasadena, nos EUA – um negócio que trouxe à estatal um prejuízo avaliado em cerca de US$ 800 milhões – e que pode efetivamente vincular a presidente Dilma ao escândalo do Petrolão (leia reportagem na pág. 48). “Como conhece muito bem os negócios feitos pela Petrobras fora do País, o Cerveró poderá colocar a Lava Jato dentro do BNDES”, avalia um cacique petista que conversa frequentemente com o ex-presidente Lula.
As diárias de Stédile
Enquanto o MST promovia invasões pelo País provocando danos ao patrimônio público, o governo bancava estadias do líder do movimento com dinheiro do contribuinte
Marcelo Rocha
Ao longo deste ano, o MST intensificou sua agenda de protestos por todo o País. O principal alvo de críticas foi a política de ajuste fiscal do ministro da Fazenda, Joaquim Levy. Em Brasília, foram ao menos cinco manifestações. Os integrantes do movimento invadiram prédios públicos como as sedes da pasta comandada por Levy, do Ministério da Agricultura e da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Em alguns casos, houve danos ao patrimônio público. Mesmo assim, de forma inacreditável, o governo federal bancou este ano diárias para que o principal líder do movimento, João Pedro Stédile, participasse de cursos, palestras e ministrasse aulas inaugurais em instituições de ensino federais sobre temas ligadas à terra.
SEM TERRA, COM DIÁRIA Na era petista, João Pedro Stédile recebeu ao menos 30 diárias do governo
Delcídio do Amaral: ‘A’ testemunha
Saída de Delcídio é o mais duro golpe para a articulação política do governo Dilma(Ueslei Marcelino/Reuters)
Para entender a magnitude da prisão, na semana passada, de Delcídio do Amaral, senador petista e líder do governo, é preciso até um pouco de imaginação. Pois imaginemos que nenhum empresário preso na Operação Lava-Jato tivesse até hoje quebrado o silêncio nas delações premiadas - ou que nenhum político estivesse na lista que a Procuradoria-Geral da República mandou para o Supremo Tribunal Federal (STF). Mesmo no cenário irreal acima, a prisão de Delcídio e a possibilidade de ele recorrer à delação premiada - uma vez que foi abandonado pelo PT, ignorado por Dilma e ofendido por Lula - terão consequências devastadoras para a estabilidade do já cambaleante regime lulopetista. Delcídio do Amaral testemunhou os momentos mais dramáticos dos escândalos do governo do ex-presidente. Viveu e participou desses mesmos momentos no governo Dilma. Delcídio não é uma testemunha. Ele é "a" testemunha - e a melhor oportunidade oferecida à Justiça até agora de elucidar cada ação da entidade criminosa que, nas palavras do ministro Celso de Mello, decano do STF, "se instalou no coração da administração pública".
Delcídio guarda relatório-bomba da CPI dos Correios
Um episódio nunca revelado da CPI dos Correios, presidida por Delcídio do Amaral (PT-MS) e que comprovou o mensalão, pode vir à tona com a prisão do senador.
Já na reta final dos trabalhos, com a negociação para a aprovação do relatório final em curso, ficou pronto o cruzamento de dados feito pelo software israelense Analyst’s Notebook, adquirido para ajudar na investigação.
Era uma bomba: mostrava transações financeiras suspeitas de dezenas de deputados e senadores de vários partidos. O potencial de estrago era geral e poderia melar a votação do parecer final.
A cúpula da CPI decidiu engavetar o dossiê, mas ex-integrantes sabem que Delcídio guardou uma cópia. POR VERA GAMALHÃES / VEJA
Gilmar Mendes: políticas públicas podem ser usadas como compra de voto moderna
Após palestra na Associação dos Advogados de São Paulo, o ministro Gilmar Mendes, do STF, disse hoje que fala “com todo mundo” em Brasília e que são comuns as conversas sobre pedidos de liberdade provisória. Gilmar foi citado pelo senador Delcídio do Amaral na gravação que levou o petista à cadeia. No áudio, o senador afirma que procuraria Gilmar Mendes, Dias Toffoli e Teori Zavascki para conseguir um habeas corpus para o ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró.
No evento de advogados, o ministro afirmou que a adoção de determinadas políticas públicas com finalidade exclusivamente eleitoral é uma compra de votos moderna e lembrou frase da presidente Dilma Rousseff — “Nós fazemos o diabo para ganhar a eleição” — e do ex-presidente Lula — “Eles não sabem o que nós somos capazes de fazer para ganhar a eleição”. REINALDO AZEVEDO