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A indústria dos processos trabalhistas

Por Notas & Informações / O ESTADÃO DE SP

 

Aprovada em 2017, a reforma trabalhista mudou as relações no mercado de trabalho e representou uma economia de R$ 15 bilhões entre 2022 e 2024, principalmente pela redução dos litígios judiciais. Mas tão impressionante quanto o volume economizado em três anos têm sido a rapidez e a intensidade com que os ganhos se esvaem a partir da flexibilização das novas regras, em ações promovidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST).

 

O cálculo da economia de custos faz parte de um estudo da Confederação Nacional da Indústria (CNI), do Movimento Brasil Competitivo (MBC) e da Fundação Getulio Vargas (FGV), como divulgou o Estadão. Observado separadamente em cada ano, é flagrante a perda de fôlego do resultado: foram economizados R$ 8 bilhões em 2022, R$ 6 bilhões em 2023 e apenas R$ 699 milhões em 2024.

 

O fato de um dos principais pontos da reforma, o princípio da sucumbência, ter sido modificado em 2021 pelo STF está longe de ser uma simples coincidência. Esse princípio estabelece que a parte perdedora da ação, seja empregador ou empregado, deve pagar os honorários ao advogado da parte vencedora em um porcentual calculado entre 5% e 15% do valor da condenação (ou da causa, caso o autor da ação seja perdedor).

 

Assim, o pagamento de honorários periciais e advocatícios pela parte perdedora inibiu as ações judiciais meramente oportunistas, que mal se sustentavam, mas que eram movidas mesmo assim, já que nada custavam para o trabalhador.

 

Antes, quando de forma nenhuma o trabalhador tinha de arcar com os custos, as ações na Justiça iniciaram uma escalada que chegou a 2,76 milhões de processos em 2016, um ano antes da reforma. Com a adoção das novas regras a queda foi imediata e, em 2020, o total havia sido reduzido quase à metade, para 1,48 milhão. A partir de 2021, com a flexibilização aprovada pela Corte, voltou a subir, até chegar a 2,1 milhões no ano passado, com previsão de atingir 2,3 milhões neste ano.

 

Pelo andar da carruagem, não demora a chegar ao nível alarmante que contribuiu para acelerar as discussões sobre a reforma. A partir da flexibilização, em 2021, a gratuidade é determinada a partir da autodeclaração de hipossuficiência, sem necessidade de comprovar patrimônio e renda. E ainda que o juiz trabalhista tenha o poder de investigar a situação financeira da parte autora e indeferir o pedido, é difícil imaginar que esse seja o comportamento de praxe.

Na maioria dos casos, cabe às empresas o ônus de comprovar o patrimônio de empregados litigantes. Os dados agora divulgados apenas quantificam uma realidade que já estava sendo percebida após os abrandamentos da reforma do governo Michel Temer. Casos sem qualquer lógica de beneficiários de gratuidade judicial em ações trabalhistas não são raridade. A reportagem do Estadão destacou exemplos, extraídos de um estudo do sociólogo José Pastore, colunista deste jornal, de proprietários de veículos de luxo ou salários acima de R$ 30 mil que se autodeclararam hipossuficientes e se livraram do risco do pagamento de custas.

 

A instituição do princípio da sucumbência foi adotada para moralizar uma prática de banalização de recursos judiciais que visava pura e simplesmente ao aumento do valor de indenizações trabalhistas. Até 2021, era mais frequente na indústria; no primeiro semestre de 2025, houve uma nova arrancada de ações trabalhistas, movida, principalmente, pelo setor de serviços, que respondeu por 26,6% dos processos protocolados no ano passado.

 

Os organizadores do estudo CNI-MBC-FGV calcularam o volume dos processos do ano passado com a média dos países que formam a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que serve como espécie de referência para boas práticas. O resultado mostrou a média do Brasil (9.961 processos por milhão de habitantes) mais de duas vezes e meia acima da média da OCDE (3.486 por milhão de habitantes). Ou seja, no Brasil, essa indústria, a dos processos trabalhistas, raramente entra em crise.

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