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Governo paga pensão até a beneficiária morta

BRASÍLIA - O Tribunal de Contas da União (TCU) detectou indícios de que 19.520 filhas solteiras de servidores públicos federais, maiores de 21 anos, estão recebendo pensões por morte bancadas pela União de forma irregular. A lista inclui mulheres que acumulam o benefício com a renda de outras pensões e aposentadorias; de empregos na iniciativa privada e no setor público. Há até casos em que os valores continuaram sendo pagos pelo governo em nome de beneficiárias que, oficialmente, já morreram.

A corte de contas decidiria providências sobre os pagamentos indevidos nesta quarta-feira, 26, mas o julgamento foi adiado. A discussão sobre as pensões se dá num momento em que o governo propõe uma reforma da Previdência que revê direitos. 

Foto: André Dusek|Estadão
TCU

Sede do Tribunal de Contas da União (TCU) em Brasília

Há divergências entre os ministros do TCU. O relator, Raimundo Carreiro, defende que, mesmo que provada irregularidade, só seja cortada a pensão da mulher que tenha renda remanescente superior a R$ 4.663,75, teto do Regime Geral de Previdência Social em 2015. No entendimento dele, esse seria o valor mínimo capaz de proporcionar a "sobrevivência condigna" da beneficiária. As que ganham até esse valor estariam em situação de dependência econômica, fazendo jus ao auxílio do Estado.

No Brasil, o salário mínimo vigente é de R$ 880. Dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea)  mostram que só 5% da população do País ganha mais de R$ 4 mil mensais.

Levando-se em conta o teto do INSS como um dos critérios da "sobrevivência condigna", o universo de pensionistas em situação irregular poderia cair para cerca de 7,7 mil. Mesmo assim, a economia do País com a supressão desses benefícios seria considerável: R$ 2,2 bilhões nos próximos quatro anos. 

O ministro Walton Alencar elaborou voto divergindo de Carreiro. No texto, obtido pelo Estado, ele observa que a questão da subsistência digna e do referencial de R$ 4.663 é "inteiramente subjetiva, aleatória e desnecessária". Alega também que não há base legal para fixar o valor como parâmetro.

"Por que razão estabelecer o valor pago pelo RGPS? Não bastaria estabelecer o salário mínimo? Isto significaria que se a pensionista ganhar, além da pensão, valor inferior a esse referencial, ela não precisaria cumprir a legislação? Poderia casar?", questiona Alencar.

A pensão a filhas solteiras de servidores públicos, maiores de 21 anos, foi instituída por uma lei de 1958, quando a maioria das mulheres não trabalhava fora de casa e os homens, em geral, eram provedores de recursos para as famílias. O princípio da legislação era o de amparar as filhas de servidores que morressem.

O benefício foi extinto em 1990, mas mulheres que tiveram benefício antes disso continuam recebendo. O TCU, em seus julgamentos, se debruça sobre as situações em que essas pensões devem ser canceladas ou não.

A jurisprudência da corte é de que não só o casamento ou a união estável implicam cancelamento dos pagamentos. A mulher não pode acumular o benefício com renda própria de outras atividades que lhe garantam autossuficiência econômica, como empregos públicos e privados.

Alencar propõe que os órgãos públicos deem 15 dias para que as beneficiárias em situação irregular apresentem defesa. Caso as falhas sejam confirmadas, sugere o cancelamento da pensão. "Pensão não é herança e ela deve estrita atenção ao princípio da legalidade ao da moralidade. Não é mecanismo de enriquecimento", diz o ministro. 

A decisão a ser tomada precisará do aval da maioria do plenário da TCU. O ESTADO DE SP

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