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Governo vai à AGU para atacar precatórios na origem e evitar ‘chuva de meteoros’; metade vem do INSS

Por Bianca Lima e Anna Carolina Papp / o estadão de sp

 

O governo colocou em curso um plano de ação para tentar deter a “bola de neve” dos precatórios, que representam custos bilionários exponenciais aos cofres públicos. 

Ministério do Planejamento e Orçamento vai enviar à Advocacia-Geral da União (AGU), nos próximos dias, um levantamento sobre as principais causas dessas dívidas judiciais. O objetivo é atuar de forma preventiva, atacar o problema na origem e evitar a formação desse passivo anos à frente, a custos muito mais elevados.

 

“Não é que teve um meteoro; a gente está em uma chuva de meteoros”, disse ao Estadão o secretário-executivo da pasta, Gustavo Guimarães, em referência à expressão usada em 2021 pelo então ministro da Economia de Bolsonaro, Paulo Guedes. À época, ele afirmou que um meteoro de R$ 89 bilhões em precatórios iria colidir com as contas públicas – o que levou à criação da chamada “PEC do Calote”, que “pedalou” o pagamento dessas dívidas.

 

Apesar de o governo Lula ter aberto um crédito extraordinário de R$ 93,1 bilhões para quitar esse estoque, amparado em uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), Guimarães pontua que a medida resolve o passado, mas não o futuro, dada a trajetória exponencial dessas obrigações (veja gráfico abaixo) – o que, para ele, reflete falhas em políticas públicas que precisam de correção de rota.

 

“Precatório deveria ser exceção. Ele nasce de política pública, de alguma atuação ativa equivocada do Estado ou passiva, em que não atuou como deveria atuar. Quanto mais aumenta precatório, maior é o sinal de que as coisas não estão funcionando”, diz o secretário.

 

Na prática, a decisão do STF deu um prazo para Executivo e Legislativo encontrarem uma forma de encaixar os precatórios dentro do Orçamento. Isso porque, a partir de 2027, o governo não poderá mais pagar parte dessas dívidas fora do limite de despesas, como ocorre atualmente.

 

O primeiro passo, segundo Guimarães, é agir de forma preventiva e tentar reduzir esse passivo por meio do mapeamento das causas, de modo a reduzir a formação de novos precatórios. “Temos de transformar o meteoro em meteorito”, afirma.

 

O segundo estágio será discutir as regras que valerão a partir de 2027. “Ou a gente traz os precatórios para dentro do ‘tetinho’, o que já tava previsto, ou teremos de pensar em alguma forma de acomodar esses valores. Por isso que temos de atuar para que os passivos sejam os menores possíveis, para que não seja necessário excepcionalizar da regra fiscal”, diz.

 

No ano passado, o Ministério da Fazenda chegou a pedir ao STF autorização para classificar os juros dos precatórios como despesa financeira, ou seja, sem contabilizar no resultado primário (saldo entre receitas e despesas, sem contar os juros da dívida) – o qual é levado em conta para o cálculo da meta fiscal.

 

A proposta, criticada por especialistas em contas públicas, não foi chancelada na decisão do STF – e, por ora, está descartada pela equipe econômica, segundo apurou o Estadão com interlocutores do governo.

 

Previdência gera maior parte dos precatórios

Num primeiro levantamento, o Planejamento detectou que quase metade das dívidas judiciais da União tem origem previdenciária. Em 2022, último dado fechado com recorte setorial, dos R$ 58,7 bilhões pagos pelo Tesouro em precatórios e Requisições de Pequeno Valor (as chamadas RPVs, que englobam sentenças de até 60 salários mínimos), R$ 28 bilhões foram referentes à Previdência, sendo R$ 22 bilhões de urbana e R$ 6 bilhões de rural.

 

Na sequência, aparecem as dívidas referentes a custeio e capital, com R$ 17 bilhões, seguidas de pessoal e encargos (R$ 11 bilhões) e Benefício de Prestação Continuada (R$ 2 bilhões).

Os dados serão encaminhados ao Conselho de Acompanhamento e Monitoramento de Riscos Fiscais Judiciais, presidido pelo ministro da AGU, Jorge Messias, e integrado pela ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, e da Fazenda, Fernando Haddad.

 

A ação também contará com órgãos vinculados, como a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) e a Procuradoria-Geral da União (PGU). “A gente está querendo fundir a inteligência jurídica judicial com a inteligência econômica”, diz o secretário.

 

O próximo passo será esmiuçar os benefícios que concentram o maior nível de judicialização dentro desses grandes grupos identificados pelo Planejamento – tarefa para a qual a AGU poderá usar a inteligência artificial.

 

Com isso mapeado, o conselho vai avaliar se é o caso de alterar algum normativo que tem gerado derrotas seguidas ao governo, ou então propor ao Congresso a alteração de legislações que têm dividido o Judiciário e gerado prejuízo aos cofres públicos. Para 2024, a dotação prevista no Orçamento para pagamento de sentenças judiciais (precatórios e RPVs) é de R$ 54,5 bilhões.

 

Brasil tem ‘pior dos mundos’

Guimarães classifica o cenário atual como “o pior dos mundos”. De um lado, diz ele, o contribuinte deixa de receber o benefício no momento certo; de outro, após a sentença judicial, o governo tem um gasto muito maior, pois tem de pagar o valor corrigido proveniente de decisões que muitas vezes se arrastam por anos.

 

Dados do Planejamento, referentes a 2022, apontam, para fins comparativos, que os pagamentos de precatórios já são equivalentes a 3,3% da despesa primária total da União e a 38,6% da despesa discricionária, aquela que não é obrigatória e engloba investimentos e custeio da máquina pública. Em 2014, esses porcentuais eram, respectivamente, de 1,9% e 13,3% – o que evidencia o forte crescimento.

 

Já pela ótica dos beneficiários, os números mostram que 99,8% dos precatórios têm valor de até R$ 10 milhões. Em valores, essa faixa representa 54,75% do total de precatórios (veja gráfico abaixo). “Isso ratifica a ideia de que estamos beneficiando a maior parte da população, que deveria ter recebido o pagamento. Ainda mais se atuarmos para que isso não vire precatório e a pessoa receba no âmbito da política pública”, diz Guimarães.

 

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