‘O que interessa é tirar da Papuda e colocar na rua’, diz Bolsonaro sobre anistia do 8/1
Por Malu Gaspar / O GLOBO
Mesmo determinado a transformar o Congresso em palco para uma barulhenta cópia da Comissão da Verdade, exibindo familiares de golpistas do dia 8 de janeiro e pressionando os parlamentares a aprovar a anistia, Jair Bolsonaro reconhece que as chances de aprovação do projeto são pequenas. Por isso, ele admite mexer no texto, desde que consiga soltar os presos.
“Tudo bem se a gente tiver que chegar no meio termo. O que interessa é tirar esse povo da Papuda e colocar na rua”, me disse Bolsonaro por telefone.
Segundo o presidente, o grande obstáculo para a aprovação do projeto no Congresso hoje “é o PT”. O partido do presidente Lula não quer a discussão sobre a anistia ao 8 de janeiro, o que poderia atrapalhar a candidatura do deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), preferido de Arthur Lira (PP-AL) para sucedê-lo (a eleição ocorre em fevereiro de 2025).
Bolsonaro entende isso e compartilha da avaliação de interlocutores de seu partido de que é melhor aceitar o recuo e tentar reverter o clima ruim ainda na gestão Lira do que esperar para tentar de novo depois que o próximo presidente da Câmara for eleito.
“Eu entendo que individualmente os candidatos à presidência da Câmara querem anistia porque é uma questão humanitária, mas o PT está fechando questão e isso faz pensar duas vezes”, diz o ex-presidente. “Não adianta eu falar, ‘olha vai aprovar’, porque depois mela tudo”.
Como informamos na última terça-feira, Bolsonaro aceitou o recuo de Lira, mas não desistiu de brigar pela anistia. Seu plano é aproveitar as dez sessões da comissão já combinadas com o presidente da Câmara para levar familiares dos presos para prestar depoimento e contar suas histórias, à semelhança do que foi feito na Comissão Nacional da Verdade criada pelo governo Dilma Rousseff.
O ex-presidente tenta traçar um paralelo com o colegiado criado pela então presidente, que se debruçou sobre violações de direitos humanos no Brasil entre 1946 e 1988, com destaque para perseguições políticas no período da ditadura militar entre 1964 e 1985. Durante a investigação, além de agentes do regime de exceção, a comissão ouviu vítimas e familiares de desaparecidos.
A ideia é criar fato político e promover cenas de impacto no Congresso para tentar mobilizar os apoiadores de direita nas redes sociais e pressionar os parlamentares a aprovar o projeto, ainda que modificado. Hoje o texto prevê anistia completa aos presos do 8 de janeiro, com a anulação de todas as medidas restritivas.
“A comissão não deixa de votar para o zero, mas vem com passo mais firme. Com as famílias contando suas histórias, eu sou capaz de apostar que em mais 30 ou 40 dias tem clima”, disse o ex-presidente.